Memórias da Entrememórias

Nesta semana, nossa Coluna traz um texto que diz diretamente de si mesma. Trata-se do escrito de Carlos Henrique de Carvalho e Luciano Mendes de Faria Filho ao proporem as vivências individuais como fios condutores na construção de uma memória da educação em nosso país. Assim nasceu a coluna Entrememórias. Trazemos novamente o texto ao público, agradecendo a eles e aos demais editores e editoras que passaram por aqui. O agradecimento se estende aos nossos autores e autoras, leitores e leitoras, companheiras e companheiros na aventura de rememorar e interpretar o vivido.

“ENTRE-MEMÓRIAS”

Carlos Henrique de Carvalho 

Luciano Mendes de Faria Filho

Sob a Coordenação dos professores Luciano Mendes de Faria Filho e Tarcísio Mauro Vago, o projeto Pensar a Educação, Pensar o Brasil, vem promovendo várias ações no campo educacional brasileiro, tendo em vista a proposição de (re)pensar: a educação pública no país. 

É com este horizonte que a partir de agosto lançamos a sessão “Entre-Memórias”, cuja a finalidade é discutir, sob diferentes ângulos, as relações entre educação e memória, pois nelas há uma atração que envolve e nos “seduz”, mas embora já saibamos que jamais teremos condições de conhecer plenamente as complexidades do “subterrâneo” das memórias. 

É nesse “caleidoscópio” que temos a intenção de avançar na compreensão da realidade histórica-educacional, por meio das narrativas e interpretações que “esvaem” as muitas “memórias anônimas” esquecidas ou silenciadas no curso do tempo histórico-educacional brasileiro, mas que podem (re) aparecerem pelas “lentes do tempo presente”. Desta forma, essa sessão, que agora entra em cena, procura encetar abordagens que apreendam o processo educativo nas suas múltiplas formas – pela ação dos (as) professores(as); dos intelectuais, de âmbito local ou de projeção nacional; periódicos, especializados ou não; instituições escolares, das escolas isoladas às universidades; museus; livros; ou tudo que possa trazer à tona qualquer fragmento do passado educacional brasileiro, “esculpido” pela complexidade das determinações políticas, econômicas e sociais, ou seja, por uma mediação construída historicamente no seio das relações do binômio educação e memória. 

Além disso, pretende-se chamar a atenção para a relevância do papel da escola, do professor, dos periódicos, dos livros, etc. Enfim, toda ação que possibilitou a disseminação de propostas educacionais (formal ou não), isto é, a valorização do conhecimento e as formas para sua universalização na sociedade. Nessa perspectiva, o projeto Pensar a Educação, Pensar o Brasil reitera seu compromisso social com a memória da educação brasileira e, ao mesmo tempo, a sessão “Entre-Memórias” é mais uma importante ação na luta pela superação dos “esquecimentos” que ainda imperam entre os agentes responsáveis pelas políticas educacionais. 

Apenas para “distinguir” as fronteiras entre o ofício do historiador com o trabalho  dos memorialista,  o primeiro, para ser fiel ao seu ofício, deve se resguardar de qualquer conclusão ou julgamento a priori; que seus questionamentos ao passado são determinados e condicionados pela sua inserção no presente; que suas abordagens sempre estarão sujeitas a revisões, e por isso, não se alcança a suposta objetividade a partir de estudos concebidos como definitivos, mas sim quando tem a convicção da necessidade de rever seus procedimentos e suas concepções. Somente assim, ancorado nestes princípios, terá condições de compreender e explicar as situações e os problemas investigados, mesmo que estejam localizados em espaços e temporalidades distantes de onde o historiador desenvolve seu ofício. No entanto, também não se pode desconsiderar ou menosprezar o importante trabalho dos “historiadores”, os quais não são de ofício, pois é, na maioria das vezes, pelas iniciativas deles que a memória é preservada. 

Complementarmente, “Entre-Memórias” busca a estender olhares e apresentar  outras dimensões para investigações, direcionadas a outros cenários, épocas e temáticas até então pouco privilegiadas. Assim, esta sessão pode promover aproximações da realidade educacional do país, pois a partir dela pode emergir nossos estudos, os  quais podem desvelar as outras faces da constituição do sistema de instrução pública no Brasil, para além das análises macroestruturais (postura normalmente assumida pela chamada “historiografia tradicional”). 

Portanto, o ofício do historiador, em suas várias perspectivas, possibilita trabalhar numa espécie de “movimento pendular”, no qual se promove as muitas tessituras do passado, à semelhança da arte tecelã de enredar os fios da urdidura e da trama, suscitando a análise pela pluralidade de argumentos produzidos pela nossa palavra, pela palavra do outro, pelo diálogo constituído de memória. Desta forma, nota-se um movimento de aproximação, ou melhor, de verdadeira “simbiose” entre os “fios recuperados das memórias” com a tarefa de reescrever “as histórias” – muitas vezes pessoas anônimas – ; ou seja, nos envolvemos no movimento de tessitura da narrativa histórica pelas pesquisas que desenvolvemos e as que ainda estão sendo gestadas. Importa-nos, portanto, auscultar as diversas maneiras de pensar e agir em relação à história da educação, ao ensino e formação de professores, sobre o presente/passado vivido no momento da rememoração, pois esse movimento de afloramento do conteúdo advindo da reminiscência é possível pela análise e reflexão.

Portanto, convidamos todos: pesquisadores, professores, estudantes de pós-graduação e de graduação, a contribuírem com “Entre-Memórias”, encaminhando os seus textos sobre professores(as), intelectuais, periódicos, instituições escolares, museus, livros, etc., […] com o objetivo de apresentar as muitas memórias ainda imersas nos “submundos” da história da educação brasileira. Assim, almejamos que os textos sobre as “memórias” da educação possam oferecer subsídios à compreensão do processo educativo brasileiro, bem como para a atuação dos educadores, tendo em vista, especialmente, o momento histórico atual, marcado por práticas sociais e educacionais que individualizam os sujeitos e secundarizam nossos passados histórico-educacionais, que compuseram a formação da sociedade brasileira. 

 

1 – Professor da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

2 – Professor da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 


Imagem de Destaque: Annie Spratt/Unsplash

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