Lições pandêmicas: o que não aprendemos

Laura Janaina Dias Amato

Nos parece que o tema “pandemia” rendeu e vai render muito ainda. Desde que o Sars-Cov 2 chegou oficialmente ao Brasil em março de 2020 estamos debatendo o impacto da suspensão das aulas e o seu retorno, não conseguimos ainda quantificar os efeitos da ausência das atividades presenciais, mas já temos uma noção de quantos estudantes foram prejudicados e tiveram que sair das escolas e como o futuro da nação pode ser impactado com isso.

Enquanto escrevo este texto, o consórcio de veículos de imprensa informa que 54,88% da população brasileira está imunizada, ou seja, com as duas doses. Devido a isso, vários estados do Brasil já voltaram com as aulas presenciais, em algumas localidades com 100% de ocupação e em outras ainda em sistemas de rodízio.

Porém muitas instituições de ensino superior, principalmente as estaduais e federais, ainda não retornaram com as aulas 100% presenciais. Isso causa também em algumas ações de extensão desenvolvidas por estas instituições, sobretudo se as mesmas necessitam do espaço do campus universitário. E aqui as ações de extensão são vistas não como atividades que prestam serviço à comunidade, mas principalmente ações formativas e práticas constitutivas na capacitação profissional do estudante, ou seja, vemos a extensão como indissociável da pesquisa e do ensino, sendo fundamental para a profissionalização do ou da estudante.

Neste sentido, as atividades ora antes programadas para serem interativas e dinâmicas, também são transpassadas para um ambiente considerado estéril e distante: a tela de um computador ou de um celular. Além disso, as relações estabelecidas em um projeto, curso ou programa de extensão são diferentes das de sala de aula. Em uma sala de aula temos, na maior parte das vezes, dois atores que mantêm relações: o professor e o aluno. Já em durante a realização de um trabalho de extensão temos, por exemplo, a comunidade que participa, o coordenador do projeto, o estudante bolsista, o estudante voluntário, o professor orientador, entre outros. Essas múltiplas relações se complexificam quando os desejos e compreensões sobre saber ensinar em ambiente remoto não são coincidentes. 

Reprogramar esse espaço de aprendizagem, que é a extensão, requer dos atores participantes uma dança conjunta e coletiva, em que os passos dados por todos sejam aprendidos e coordenados juntos. Dançar em grupo não é algo fácil, requer de todos o mesmo ritmo e sintonia, todos devem prestar atenção ao tempo e com isso marcar o compasso. Essa comparação é importante, pois muitas ações de extensão foram prejudicadas porque o ritmo dos participantes não era o mesmo, dando entraves para a formação profissional de estudantes. 

Céu (deixaremos no anonimato para preservar sua identidade) é uma dessas estudantes que dançou em outro ritmo e sentiu-se prejudicada. Quero deixar claro aqui que não há culpados entre os participantes, se cada um dança um ritmo e o descompasso está presente, segue o baile, afinal, a comunidade aguarda um resultado. Porém, não aprendemos, ou desaprendemos, nas nossas relações a colocar um ritmo próprio e conjunto. Talvez a falta do olho no olho, o “levar na mão” do orientador foi prejudicado pela interferência da tela e com isso não podemos realizar em sua completude a formação profissional do estudante. 

Sim, ainda não sabemos o impacto da pandemia, mas percebemos que a coletividade pode ter sido prejudicada e com isso a aprendizagem de uma habilidade fundamental: o relacionamento interpessoal.

 

1 – Laura Janaina Dias Amato. Docente da área de Letras e Linguística da UNILA. Contato: laura.amato@unila.edu.br


Imagem de destaque: EBC

 

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