Há um retorno possível?

Laura Amato

Na minha bolha da internet um dos temas mais pautados desde dezembro foi o possível retorno às aulas presenciais nas escolas públicas e privadas de todo o país. Durante esse mesmo período, um grupo de pediatras e demais apoiadores lançaram a campanha #LugardeCriançaénaEscola, com o intuito de mobilizar a sociedade para um retorno seguro das escolas públicas em 2021. Um mote da campanha é explicar que, a partir de estudos científicos citados pelos proponentes da campanha, “escolas fechadas não diminuem o número de casos e escolas abertas não aumentam este número”. Essa campanha salienta a importância de se adotar e seguir rigorosamente protocolos de segurança. 

Em seu perfil pessoal do instagram, um pediatra integrante da campanha explica que “crianças têm defesas que adultos não têm e raramente contaminam outras crianças ou adultos”. Contudo, quando observamos as realidades dos diversos “brasis” não temos base para afirmar que as escolas são lugares seguros, pois nenhum estudo, tal como foi feito em outros continentes, foi replicado aqui. 

Campanhas lideradas por pediatras são importantes, sim, mas conforme lembrado em uma conversa – via aplicativo – com uma amiga diretora de um centro de educação infantil: “onde estava a preocupação dos pediatras e da sociedade civil (daqueles que podem pagar escola particular, principalmente) com a escola pública? Nunca tivemos essas reais condições, sempre lutamos por isso, sempre falamos sobre isso, sempre apanhamos nas ruas sobre isso e onde os pediatras estavam? Nossa preocupação com as crianças é desde sempre!” 

O relatório da UNESCO, apresentado dia 25 de janeiro de 2021, mostra que a média mundial das escolas totalmente fechadas foi de 14 semanas, subindo para 22 semanas se considerarmos o fechamento localizado. A América Latina e o Caribe foram as regiões que tiveram o maior tempo de fechamento das escolas, com média de 29 semanas, excedendo a média mundial. Durante a Reunião Global de Educação, organizada pela UNESCO, os governos se comprometeram a proteger os orçamentos para educação e focar na reabertura segura e inclusiva das escolas, contudo, não foi possível ter acesso aos países signatários. Durante o evento houve o apelo para que os educadores tenham prioridade na vacinação. Como vimos no plano de vacinação do Ministério da Saúde, os professores são do grupo prioritário, contudo não sabemos quando será possível a vacinação deste grupo. 

Agora, fevereiro de 2021, temos o colapso do sistema de saúde no Amazonas, novas cepas do vírus circulando, o fim do pagamento do auxílio emergencial, o insípido plano de vacinação da população e o retorno às aulas presenciais nos mais diversos “brasis”. Em alguns “brasis” os protocolos de segurança podem ser cumpridos, principalmente na rede privada de ensino. Em outros “brasis” há salas de aula sem ventilação adequada e, apesar de muitas vezes as escolas terem recursos financeiros, a execução do mesmo é dificultada por entraves burocráticos entre recursos de capital e custeio. 

Além disso, algumas reformas são de níveis estruturais, como instalação de pias e torneiras e janelas basculantes. Cabe destacar também que protocolos de segurança podem ser cumpridos em alguns “brasis”, mas a que custo? O que uma professora fará quando uma criança tropeçar e cair, já que estamos sujeitos a lei da gravidade? Será que ela vai se afastar para respeitar o protocolo de segurança ou vai abraçá-la? E nos “brasis” cujos protocolos serão difíceis de serem cumpridos, não por incapacidade ou má vontade do gestor, mas por questões burocráticas que impedem um diretor ou diretora de fazer uma reforma em uma sala de aula para ter uma janela? Como estas crianças ficarão? 

Acredito que todos nós concordamos que as escolas realmente ficaram fechadas tempo demais e não sabemos ainda qual impacto isso terá, mas não podemos esquecer que a educação não é só pautada pelo conhecimento científico e crítico. E esse fechamento tão longo é resultado de uma política que enxerga o curto e médio prazo, pensando exclusivamente no caráter econômico imediatista. 

As crianças estão precisando de afeto e contato com os amigos e demais círculos sociais, e a escola é também esse lugar, o do afeto. Até que ponto campanhas como #LugardeCriançaénaEscola liderado por pediatras e a abertura de escolas em pleno avanço da epidemia é realmente uma escolha pautada no bem estar da criança? Lugar de criança é na escola sim, mas em uma escola segura, em uma sociedade acolhedora e que preze o bem estar social acima do econômico.


Imagem de destaque: Acacio Pinheiro / Agência Brasília

 

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