Aulas presenciais: abraços de morte?

Editorial do Jornal Pensar a Educação em Pauta 306

A escola é um lugar de criação, é um mundo onde se aprende e se realizam encontros e desejos que vão muito além das disciplinas. Por isso, depois de um ano de ensino remoto emergencial, período em que tivemos de reaprender, em sociedade, as variadas formas de conviver intensivamente com as novas gerações no espaço doméstico, as famílias e as próprias crianças sentem a falta da escola e de seus tempos e espaços de encontro.

Também  não podemos esquecer o fato de que, para milhões de crianças e jovens, a escola é uma instituição fundamental de guarda e de assistência. As práticas inclusivas estabelecidas pela escola e sua capilaridade nos territórios fazem com que a instituição esteja em contato cotidiano com todas as nossas desigualdades. A cessação do seu atendimento presencial trouxe grandes desafios e problemas para as famílias.

Tudo isso é verdade e não pode ser ignorado. No entanto, há que se considerar que, sem um plano claro de imunização da população, passando pelas professoras, professores e demais profissionais da educação, estabelecer a volta às aulas presenciais é jogar com a vida de  dezenas de milhões de pessoas que são afetadas pela escola cotidianamente.

Assim, não bastassem as centenas de milhares de mortes que poderiam ser evitadas, as políticas genocidas do governo Bolsonaro e de seus apoiadores em estados e municípios brasileiros ameaçam de morte milhões de professoras e professores e demais participantes da comunidade escolar, instalando o medo em suas mentes e em seus corpos com a volta às aulas presenciais sem que tenham sido vacinadas e vacinados.

Uma das dimensões mais importantes a respeito das decisões sobre a volta às aulas presenciais, e que tem sido sistematicamente negligenciada pela imprensa, é o alijamento das comunidades escolares e, de forma especial, das e dos profissionais da educação dessa discussão que, ao fim e ao cabo, afetam muito diretamente às suas vidas e de suas famílias.

Pelos caminhos mais diversos, construímos no Brasil a ideia de que as comunidades escolares são incapazes de discutir e decidir com seriedade e propriedade os rumos de suas instituições locais. Esse processo, infelizmente, vem se intensificando nos últimos anos com a ocupação das funções públicas por gestores que, vindo da iniciativa privada, querem submeter as instituições públicas aos imperativos da competitividade e do lucro.

Certamente, é muito relevante e necessário discutirmos, o mais rapidamente possível, a volta às aulas presenciais e criar meios para que as crianças, jovens e adultos possam voltar a povoar nossas escolas. Por outro lado, é fundamental que as comunidades escolares sejam integradas nessa discussão. A direção desses processos não pode ser dada unicamente pelas burocracias, sejam elas educacionais ou não. Muitas vezes, o grupo à frente dessas decisões  se mantém protegido da pandemia  e decide expor milhões de pessoas ao vírus e às ameaças de morte.

O jogo que se joga na escola tem que ser o jogo da vida; não pode ser, nunca, o jogo com a vida. Se não se há condições seguras para a volta às aulas presenciais, se não há espaços escolares preparados para isso, se não se organizou e realizou um plano de imunização das e dos profissionais da educação, se não se estabeleceu um plano claro e exequível de identificação e acompanhamento das pessoas – adultos e crianças – acometidas pela doença… enfim, se não se fez nada do que deveria ser feito, por que submeter dezenas de milhões a mais esse risco, o das aulas presenciais?

Valorizar a educação tem como primeira condição a valorização e a proteção da vida. A gente não deveria nunca se esquecer disso!


Imagem de destaque: Elineudo Meira / @fotografia.75

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Aulas presenciais: abraços de morte?

A escola é um lugar de criação, é um mundo onde se aprende e se realizam encontros e desejos que vão muito além das disciplinas. Por isso, depois de um ano de ensino remoto emergencial, período em que tivemos de reaprender, em sociedade, as variadas formas de conviver intensivamente com as novas gerações no espaço doméstico, as famílias e as próprias crianças sentem a falta da escola e de seus tempos e espaços de encontro. 

Também  não podemos esquecer o fato de que, para milhões de crianças e jovens, a escola é uma instituição fundamental de guarda e de assistência. As práticas inclusivas estabelecidas pela escola e sua capilaridade nos territórios fazem com que a instituição esteja em contato cotidiano com todas as nossas desigualdades. A cessação do seu atendimento presencial trouxe grandes desafios e problemas para as famílias.

Tudo isso é verdade e não pode ser ignorado. No entanto, há que se considerar que, sem um plano claro de imunização da população, passando pelas professoras, professores e demais profissionais da educação, estabelecer a volta às aulas presenciais é jogar com a vida de  dezenas de milhões de pessoas que são afetadas pela escola cotidianamente.

Assim, não bastassem as centenas de milhares de mortes que poderiam ser evitadas, as políticas genocidas do governo Bolsonaro e de seus apoiadores em estados e municípios brasileiros ameaçam de morte milhões de professoras e professores e demais participantes da comunidade escolar, instalando o medo em suas mentes e em seus corpos com a volta às aulas presenciais sem que tenham sido vacinadas e vacinados. 

Uma das dimensões mais importantes a respeito das decisões sobre a volta às aulas presenciais, e que tem sido sistematicamente negligenciada pela imprensa, é o alijamento das comunidades escolares e, de forma especial, das e dos profissionais da educação dessa discussão que, ao fim e ao cabo, afetam muito diretamente às suas vidas e de suas famílias. 

Pelos caminhos mais diversos, construímos no Brasil a ideia de que as comunidades escolares são incapazes de discutir e decidir com seriedade e propriedade os rumos de suas instituições locais. Esse processo, infelizmente, vem se intensificando nos últimos anos com a ocupação das funções públicas por gestores que, vindo da iniciativa privada, querem submeter as instituições públicas aos imperativos da competitividade e do lucro.

Certamente, é muito relevante e necessário discutirmos, o mais rapidamente possível, a volta às aulas presenciais e criar meios para que as crianças, jovens e adultos possam voltar a povoar nossas escolas. Por outro lado, é fundamental que as comunidades escolares sejam integradas nessa discussão. A direção desses processos não pode ser dada unicamente pelas burocracias, sejam elas educacionais ou não. Muitas vezes, o grupo à frente dessas decisões  se mantém protegido da pandemia  e decide expor milhões de pessoas ao vírus e às ameaças de morte.

O jogo que se joga na escola tem que ser o jogo da vida; não pode ser, nunca, o jogo com a vida. Se não se há condições seguras para a volta às aulas presenciais, se não há espaços escolares preparados para isso, se não se organizou e realizou um plano de imunização das e dos profissionais da educação, se não se estabeleceu um plano claro e exequível de identificação e acompanhamento das pessoas – adultos e crianças – acometidas pela doença… enfim, se não se fez nada do que deveria ser feito, por que submeter dezenas de milhões a mais esse risco, o das aulas presenciais? 

Valorizar a educação tem como primeira condição a valorização e a proteção da vida. A gente não deveria nunca se esquecer disso!


Imagem de destaque: Elineudo Meira / @fotografia.75

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