Educação e política: a falsidade de uma pretensa educação neutra

Aline Choucair Vaz

Daniel Ribeiro de Almeida Chacon1

Ana Carolina de Souza2

Isabelle Rachi Vartuli3

Seria na verdade uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica.

Recentemente, foi amplamente noticiada pelos principais veículos midiáticos do país uma crise no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) referente ao conteúdo da prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que provocou a saída de técnicos gestores do órgão. O referido episódio, que narra uma intervenção de caráter ideológico por parte do Governo Federal, é um exemplo inequívoco da natureza política do fenômeno educativo, isto é, de que historicamente a educação é alvo de intensa disputa entre grupos de poder. A efetivação de uma educação politicamente neutra seria possível apenas em um mundo que não fosse humano. Ainda na Grécia antiga, Aristóteles já havia destacado a dimensão política do ser humano. O existir historicamente no mundo, o relacionar-se com outrem, o desenvolver-se numa comunidade sociocultural são dimensões da politicidade intrínseca à humanidade. A educação, então, como processo de formação humana, implica, necessariamente, o caráter histórico, social, cultural e político deste complexo fenômeno e da nossa própria constituição no mundo. Consequentemente, a questão fundamental que nos desafia não diz da possibilidade ou não da neutralidade política da educação, mas do seu caráter inclusivo ou excludente, isto é, interessa-nos, pois, compreender se os modelos políticos e ideológicos educacionais contribuem diretamente para a libertação ou para a exploração, para a conscientização das formas de opressão ou para a alienação da classe marginalizada.

A educação formal objetiva o desenvolvimento da cidadania, da atuação humana na vida social. Os conteúdos estudados estão, assim, diretamente vinculados aos modelos de cidadania que se pretende instituir. Há, portanto, muitos modos de ser na vida social, e não apenas um único padrão de cidadania. O debate sobre a dimensão política da educação aponta, desse modo, para a natureza da formação cidadã e seus fins. No currículo, o peso que se efetiva em determinados conteúdos e disciplinas traduz um objetivo maior que pode estar a serviço da conscientização ou da subserviência. Neste sentido, os conteúdos curriculares não são neutros, a própria seleção deles na matriz curricular revela qual ou quais ideologias estão presentes e que tipo de cidadã/cidadão se pretende formar.

Remetemos, aqui, pois, nossa argumentação à proposta filosófico-pedagógica de Paulo Freire. Segundo ele, o conhecimento deve contribuir para a transformação social, para o processo de libertação da classe oprimida. Freire denuncia, assim, a ideia da educação como mera descrição da realidade, numa inegável opção político-ideológica que se faz alheia à existência dos(as) educandos(as). A dimensão política inclusiva e revolucionária a que ele se dedica consiste, ao contrário, em: “[…] propor ao povo, através de certas contradições básicas, sua situação existencial, concreta, presente, como problema que, por sua vez, o desafia e, assim, lhe exige resposta, não só no nível intelectual, mas no nível da ação”. 

Desse modo uma educação marcada por uma dimensão política inclusiva e libertadora implica, a priori, a luta pela dignidade humana, isto é, o salvaguardar dos direitos humanos como um compromisso atual na formação da práxis cidadã.

 

1 – Professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/CBH/UEMG. E-mail: prof.danielchacon@gmail.com 

2 – Graduanda em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/CBH/UEMG. E-mail: carolinasouza305@gmail.com 

3 – Graduada em Serviço Social pelo Centro Universitário UNA. Graduanda em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/CBH/UEMG. E-mail: vartuliisabelle@gmail.com


Imagem de destaque: Pxhere

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