Educação de Jovens e Adultos, espaços de resistências

Maria Aparecida Oliveira Rodrigues¹

O movimento emancipatório tão necessário na EJA faz emergir os processos de segregação social, hegemonia e discursos de dominação presentes nas políticas educacionais ou na ausência delas. A condição de não alfabetizados subtrai dos sujeitos o direito de conexão com o mundo letrado, fato esse que nos reivindica uma compreensão mais abrangente desse fenômeno de negação e inadequação do direito à educação para todas as pessoas. Entender a existência dessas deformações nas políticas educacionais é o primeiro passo para que se estabeleça a capacidade de insurgência e comprometimento na busca da transformação dessa realidade.

A EJA como fomentadora do direito à educação e às diversidades demanda a confluência permanente de ações afirmativas em forma de práticas que não estejam sujeitas às rupturas provenientes de cada alternância de governo. Aqui, recordamos Cunha (2013) que reflete sobre o conhecimento dos movimentos epistemológicos, culturais e políticos que vão definindo o complexo campo de conhecimento e as múltiplas influências sobre ele. Seja pelas políticas, legislações e culturas, gerando significativas mudanças nas formas de produzir conhecimento na área da educação, onde o fenômeno educativo é compreendido como processo produzido social e culturalmente. No entanto, o reconhecimento do fenômeno educativo como processo   de construção social e cultural não tem sido suficiente para garantir o reconhecimento das diversidades culturais.   

É nessa teia de influências que a Educação Popular se constitui e resiste para atender às especificidades dos educandos pobres. Nesse contexto, o encontro e debate que se fazem imprescindíveis, é entre e com todos os educandos e educadores que vivenciam as práticas, gestores que definem as concepções e membros de órgãos de controle que regulam a legislação da EJA.

Se faz necessário nos encontrarmos e debatermos para conseguir observar de um ponto atípico os processos sistemáticos e organizados de formação geral de pessoas jovens e adultas no Brasil. É possível também, lançarmos mão das metodologias e práticas da educação continuada que se fundamentam nos princípios da Educação Popular e lutar pela superação do analfabetismo e pela democratização da educação. Nesse caminho, surge a necessidade de se debater sobre como conceber um processo de educação permanente, onde o reconhecimento dos saberes extrapole o caráter de exames e contemple as múltiplas experiências e a diversidade de possibilidades, onde os sujeitos possam desenvolver a consciência de si através de experiências coletivas.

Essas experiências coletivas podem promover deslocamentos e trazer outros desafios: como os sujeitos podem desenvolver a consciência de si em um currículo que silencia temáticas como o racismo, o sexismo e a homofobia, além de não atentar para as relações estabelecidas entre os jovens e adultos pobres, trabalhadores e moradores da periferia? Um currículo que invisibiliza os Sujeitos da EJA que em seus percursos foram destituídos de suas culturas, apartados de seus grupos, tratados como categorias e estigmatizados por terem formas e expressões diferentes dos grupos sociais dominantes.  É preciso sempre resistir, compreender por outro prisma e romper com práticas de improvisação e com a lógica de desenvolvimento da educação escolar como um mecanismo de perpetuação e reprodução das desigualdades econômico-sociais.

Opor resistência é também superar as práticas de improvisação na EJA, para tanto se faz necessário investir na formação dos educadores como nos afirma Da Silva (2017), quando aponta que é fundamental que se tenha um corpo docente especializado na EJA e que para isso é necessário que haja investimentos adequados, objetivando percurso metodológico específico e carreira própria. Além disso, destaca que o foco dessa formação deve ser a práxis pedagógica baseada, entre outros, nos princípios da educação popular, na qualidade social da educação, na gestão, no mundo do trabalho, na educação profissional integrada, nas questões da diversidade e geracional, na intersetorialidade, nas Tecnologias da Comunicação e Informação, na sustentabilidade e na educação ao longo da vida, pois assim, se constituiriam redes educativas capazes de atender à especificidade da modalidade.

Assim, será possível intervir positivamente na trajetória escolar dos educandos e contribuir para uma educação de qualidade social para todas as pessoas, onde os discursos sociais e estruturas de segregação não farão marcas tão profundas nos corpos dos educandos e será possível a escuta da subjetivação de suas experiências.  Portanto cabe a cada um(a) de nós estarmos na estrada como nos aponta Castilho (2019), “no caminho da defesa da diversidade, em que cada sujeito será capaz de conviver com aquilo que é estranho nele mesmo”. Ou ainda, em Redes Educativas onde educandos e educadores se encontrem em vivências e ações afirmativas de resistência e luta para eliminar o analfabetismo.

 

1 – Professora na Rede Municipal de Educação de BH. Especialista em Educação de Jovens e Adultos pela FaE/UFMG. Mestranda da Linha de EJA no Promestre. 


Imagem de destaque: Pexels|Stas Knop

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