Currículo de Pedagogia das IES de Manaus: Quem se beneficia com a nova organização curricular?

Karina Martins Lima¹

Neylanne Aracelli de Almeida Pimenta²

Os discursos políticos, observados nos documentos oficiais são constantemente reinterpretados por meio do processo de recontextualização por hibridismo, processo pelo qual as orientações normativas são reinterpretadas pelos atores sociais no contexto das instituições de ensino e recebem novos sentidos, conforme experiências dos sujeitos, práticas, histórias de vida e de profissão e cultura local.  

Deste modo, o currículo oficial, definido nos documentos políticos, não representa o fim das negociações e transformações do discurso político, podendo haver inúmeras traduções dos sentidos apresentados.  

Nesta discussão, trazemos para o beate o processo de recontextualização por hibridismo e a presença de significantes orientadores da produção curricular para a formação do professor em nível nacional e sua recontextualização no contexto da prática, por meio da análise dos pareceres CNE/CP nº 9, de 8 de maio de 2001 e CNE/CP nº 2, de 9 de junho de 2015 e no PPC do curso de Pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas. 

Estes são documentos normativos que marcam a história da política nacional para a formação dos professores para a educação básica e se caracterizam pela afirmação do ideal neoliberal conservador, que orienta as reformas na educação brasileira em todos os níveis. 

Queremos identificar e interpretar indicadores de sentido ou de significação da formação do professor nos textos políticos oficiais. O atendimento a este objetivo exigiu pesquisar a recontextualização curricular no contexto da prática de IES públicas que ofertam o Curso de Pedagogia em Manaus, Amazonas; interpretar os sentidos acessados nos textos políticos oficiais e institucionais sobre a formação do professor, nos aspectos relativos à organização curricular, regionalização e profissionalização docente, que caracterizam ampla reforma nesta formação. 

O ciclo de políticas e as orientações de Stephen Ball, se constituem em concepção teórico-metodológica central nesta discussão, além dos estudos e pesquisas de Lopes (2005), Lopes (2006), Lopes e Macedo (2011), Mainardes (2006), alicerçados em referenciais pós-estruturais.  

Orientada pelos referenciais citados, a análise dos pareceres homologados pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) permitiu identificar os seguintes indicadores de sentido:  qualidade, competência, prática, avaliação, conteúdos, que, por sua vez, se configuram em uma expressão do discurso político que reflete a doutrina de mercado livre e de políticas neoliberais. 

No PPC do curso de pedagogia da IES pública estadual identificamos o processo de recontextualização marcado pelo hibridismo, no qual os discursos se misturam, apresentando sentidos antagônicos em um mesmo documento, como por exemplo, a presença do significante qualificação/desenvolvimento. Quanto a regionalização, o PCC busca atender as demandas locais, mas, no que se refere a organização curricular, mantêm a tradição da produção curricular no Brasil, que prioriza a disciplinarização como padrão de organização e controle de espaços e tempos escolares, ocasionando desigualdades regionais nos resultados alcançados por tal organização.

O PCC também configura a formação do professor como ancorada na profissionalização, para uma práxis pautada no desenvolvimento de conhecimentos pedagógicos, competências e habilidades, que é anunciada numa perspectiva crítica, porém de viés tradicional, recontextualizado.

Tomando por base esta discussão, o resultado da análise revelou definições, nunca fixas, quanto a produção e repercussão dos discursos políticos, particularmente no contexto da prática, cujos resultados em termos de produção curricular e os sentidos aí construídos podem estar atrelados à participação de diferentes vozes, muitas vezes silenciadas no processo de reestruturação curricular, que constituem diferentes discursos e sentidos nos textos políticos e revela a influência dos demais contextos do ciclo de políticas. Resta-nos questionar, quais sujeitos e quais territórios se beneficiam com a Base Nacional Comum de Formação de Professores da Educação Básica? Uma reflexão trazida pelo pensar próximo ao Bicentenário da Independência a partir da organização de uma diretriz educacional feita para alguns.

 

1 – Graduanda de Pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista de iniciação científica. Orientanda da Profa. Ms. Neylanne Aracelli de Almeida Pimenta.

2 – Professora do Curso de Pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Doutoranda em Educação na linha de pesquisa Currículo: sujeitos, conhecimento e cultura, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ.

 

Para saber mais
Base Nacional Comum de Formação de Professores da Educação Básica Archives – CENPEC Acesso 24 agosto 2021.


Imagem de destaque: CENPEC

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