Como melhorar as apresentações científicas: uma interface entre as técnicas de artes cênicas e a ciência

Rodrigo Soares1

Muitas vezes nos deparamos na academia com desafios diários. Por exemplo, como fazermos os resultados de nossas pesquisas atingirem a um maior número de pessoas e, mais importante, que este público entenda terminologias às vezes técnicas e específicas. Ao pensar sobre este assunto vejo também que este desafio não atinge só o público geral, mas também outros grupos dentro da própria academia que lidam com diferentes matérias e especialidades.

Em congressos científicos nos quais os pesquisadores se reúnem tendo em comum determinado assunto, a situação não é diferente, após três dias de congresso já estamos fatigados com tantas informações a que somos expostos e tendo que processá-las. A academia é naturalmente convencional e formal, a ciência precisa desta formalidade inclusive para ser respeitada como uma entidade da qual dependemos para as grandes descobertas responsáveis pela evolução do homem e do planeta. Estas condições vêm desafiando a todos nós, a cada dia, de tornarmos nossas descobertas científicas, tanto na pesquisa básica quanto aplicada, mais tangíveis para o espectador especialista ou não. 

Hoje, nos deparamos com a mudança da linguagem nas comunicações onde tudo está ao poder de um clique, de uma mensagem, em que vídeos, memes e informações são rapidamente compartilhadas e descartadas. É nessa velocidade que hoje devemos lidar principalmente com o público mais jovem. Porém, como encaixar a ciência nesta linguagem? Este é um dilema que tem aparecido em nosso dia a dia como professores e formadores de opinião.

Como utilizarmos novas plataformas e como chamar a atenção para as apresentações científicas se tornarem mais interessantes? A resposta como educador não vem tão fácil porque cada disciplina tem suas particularidades e cabe a cada professor ver como cada conteúdo pode dialogar com este público cada dia mais bem-informado e que pode rapidamente se desinteressar de um assunto. A resposta não é como fazer, mas como criar relação. O que seria criar relação? 

Criar relação é você ter o poder ou a habilidade de fazer qualquer pessoa se interessar pelo que você está falando. É o mesmo mecanismo de uma venda, se a pessoa não sentir que determinado produto será importante para a sua vida ela não o consumirá. No mundo das ideias não é diferente, nenhuma ideia será aceita se não soubermos “vender o peixe”. Aí está o desafio atual de não como apresentarmos uma aula, seminário, workshop e sim, de como torná-los interessantes. Parece simples, mas a ideia se torna mais complexa se nos deparamos com um público muito heterogêneo. Aí o desafio se expande: como tornar minha aula interessante em um público não só heterogêneo, mas também englobando diversas faixas etárias e experiências.

Este dilema começou a se desenvolver e a ser trabalhado, após anos de contato com a área das artes cênicas, onde o ator ao dialogar com o público se utiliza das ferramentas presença, relação e dramaturgia. Como pesquisador vejo que na academia não é muito diferente, pois nós utilizamos também a presença, a relação, porém aqui inserimos no lugar da dramaturgia a proficiência. Esta última representa a capacidade de determinado interlocutor/especialista em dominar o seu assunto específico. 

Considerando o caráter convencional, e mesmo ortodoxo da ciência, na prática, deixamos a proficiência dominar e perdemos em presença e relação. Na verdade, todos os três são igualmente importantes e ao se equilibrar os três temos o que chamamos de orgânico. O que seria orgânico? Orgânico é quando saímos de uma apresentação e simplesmente falamos sensacional. E mais importante, conseguimos propagar o conhecimento que foi passado, pois ele foi incorporado. Por exemplo, vamos citar a Diabetes, é uma doença que afeta a todos. Uma palestra sobre Diabetes é capaz de criar relação muito facilmente porque todos nós temos um parente ou até podemos sofrer desta doença, então o assunto por si só já cria uma relação. Então cabe a nós dentro de cada especialidade iniciar um tópico tentando chamar a atenção da audiência seja ela em qualquer âmbito acadêmico, escolar ou social para o impacto do que será falado na vida de cada um. 

Na arte, o ator muitas vezes procura olhar nos olhos dos espectadores na plateia, esta é uma ação que proporciona forte presença. Nas universidades e centros de pesquisa, as aulas e seminários comumente utilizam Datashow e são no escuro e isto atrapalha a relação do apresentador com a audiência, perde-se muita presença. Como resolver isso? Dirigindo-se aos alunos de vez em quando e olhando nos olhos e fazendo uma pergunta simples do tipo: alguém aqui já ouviu falar ou tem um parente que sofre desta doença? Isso traz os alunos para a aula e diminui o distanciamento do Apresentador/Palestrante/Professor. É simples, mas acreditem funciona.

Finalmente, gostaria de chamar atenção para um filme em que estas ideias acima ficam muito claras. O filme O Espelho Tem Duas Faces, estrelado por Barbra Streisand e Jeff Bridges. Streisand interpreta uma professora de literatura cujas aulas são lotadas e os alunos interagem e ela cria relação o tempo todo entre o assunto e a vida dos estudantes. Bridges interpreta um professor de álgebra que fica de costas o tempo todo para os alunos derivando fórmulas e funções e os alunos ficam completamente desinteressados. Para não dar um spoiler do filme em um determinado momento ele pede ajuda a Streisand e assistam ao filme para entender muitas das questões que foram discutidas neste texto.

Em conclusão, cabe a nós professores, cientistas, pesquisadores aprendermos como criar relação nos diferentes meios que circulamos para tornar nossas aulas, seminários e apresentações atraentes ao público leigo, alunos e, até mesmo, para outros especialistas. Criar relação é a chave para desencadearmos aquele brilho no olhar, aquele interesse que pode no futuro resultar numa escolha de vida para as audiências que estão expostas às nossas apresentações. Criar relação é necessário, não só nas apresentações, mas em todos os aspectos da vida.

1Pesquisador da Fiocruz Minas e Ator.

***

Este texto integra uma parceria entre o Pensar a Educação, Pensar o Brasil 1822/2022 e o Instituto René Rachou (Fiocruz) para promover ações e reflexões em torno da Educação para a Saúde.


Imagem de Destaque: Universo produção / Flickr

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *