A consolidação da independência e uma escolarização multifacetada na capital do Império

Aline Machado dos Santos

Na década que se marcavam os 50 anos de independência do Brasil, muitas foram aàs transformações que ocorreram na capital do país. Debates importantes e mudanças decisivas para o fim do regime monárquico. Tensão cada vez maior em torno das ações abolicionistas, investimentos de capital estrangeiro, implantação de novas fábricas, possibilidade de mobilidade em maior escala através dos bondes e trens, melhoramentos em urbanização nas freguesias centrais e etc. Em meio a estas e outras ações que buscavam criar a imagem de um Brasil independente, progressista e moderno frente às nações (consideradas) civilizadas e as forças republicanas do próprio país, a instrução torna-se o carro-chefe para a visibilidade da nação.

Neste período temos a transição de dois decretos educacionais que no âmbito da Corte Imperial reformulam a educação primária e secundária: a Reforma Couto Ferraz de 1854 é substituída pela Reforma Leôncio de Carvalho em 1879. Além da edificação dos primeiros prédios nacionais construídos especificamente para o ensino e à ampliação do número das matrículas escolares. 

Mas muitas foram as escolarizações que ocorreram na capital do Brasil. Contrastes sentidos até mesmo entre aquelas localidades que estavam no eixo central da urbe e abrigavam as atividades típicas de centro administrativo. A Freguesia da Candelária estava desenhada no que hoje consideramos o centro da cidade do Rio de Janeiro. Foi a segunda a ser instituída, ainda em 1634, sendo baliza constitutiva na criação e funcionamento da capital do país. A região carregava o nome da (ainda hoje) Igreja de Nossa Senhora da Candelária e além da religiosidade tinha o comércio como principal característica.

A expansão da escolarização da década de 1870 na Freguesia da Candelária ocorreu de forma diminuta em termos estatísticos, tendo poucas escolas públicas, apenas uma para cada sexo e após 1880 apenas a escola feminina. Enquanto a freguesia vizinha Santana tinha um total de 1.838 matrículas no ensino primário. Além disso, a Freguesia de Santana junto às outras freguesias da redondeza, Santa Rita e São José, abrigavam os primeiros prédios construídos para a finalidade do ensino. 

Algumas são as considerações a partir das pesquisas históricas para pensar a diferenciação da expansão educacional nas freguesias centrais da capital do Brasil. Como a dimensão geográfica, densidade populacional, a quantidade do público que (se enquadrava nos termos dos decretos educacionais e) poderia frequentar um estabelecimento de ensino e a transformação paulatina que a região central da cidade sofreu, estando cada vez mais caracterizada como um local comercial.

Considerando também que as informações são contraditórias no período apresentando, pois para a mesma região dados diferentes são encontrados em registros diversos, quando se afirma o caráter diminuto dos números da expansão escolar da Freguesia da Candelária não se está afirmando sua incompetência na gestão do ensino, pois toda equação empreendida precisa ser contextualizada, balizada, estranhada, comparada e relativizada.

Entretanto, pensar nos contrastes da expansão da educação brasileira dentro de marcos geográficos considerados, ao longo da história, importantes para o país é refletir também sobre as múltiplas escolarizações que temos no hoje. Encontramos na atual cidade do Rio de Janeiro inúmeras dissemelhanças na expansão da escolarização. Uma escolarização multifacetada pelas condições estruturais dos prédios, pelas condições de trabalho, pela mobilidade que os transportes públicos oferecem, pela violência, pela falta de tecnologia, pela evasão escolar, pela pobreza, pelo subemprego, pela necessidade de sobreviver…

 Nos tempos do imperador os homens de governo consideravam que educar a nação através da expansão da escolarização, minimamente no âmbito da então capital do país, reafirmaria e ou consolidaria a independência do Brasil frente às outras nações. Hoje temos um processo de escolarização plurifacetado ou ainda escolarizações atravessadas por realidades diversas que convivem dentro de uma mesma cidade. Escolarização que nem mesmo chega a muitos! Sem tocar no que acontece “nos outros tantos Brasis” dentro desta imensa geografia territorial. E também das outras necessidades básicas que junto à educação são negadas a grande parte da população… Ainda hoje a educação é vista como um dos fatores primordiais nas análises internacionais entre os países e para nós uma pergunta faz refletir, qual a imagem está sendo construída para o Brasil decorridos quase 200 anos da sua independência? 

 

1 – Mestre em Educação, Pesquisadora do Núcleo de Ensino e Pesquisa em História da Educação (NEPHE/UERJ) e professora da Educação Básica no Colégio Pedro II. 


Imagem destaque: Igreja Nossa Senhora da Candelária, 1856, por Bertichen Fonte: Brasiliana Iconográfica. 

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