Olimpíadas e educação

Wojciech Andrzej Kulesza

As Olimpíadas de conhecimento são competições realizadas em analogia com as esportivas, nas quais as pessoas, geralmente estudantes, disputam quem tem maior domínio de um determinado conhecimento. Tal como os atletas, os participantes precisam ganhar as competições locais para representar seu país. As primeiras olimpíadas de conhecimento foram as de matemática e foram concebidas no mesmo movimento que deu origem às Olimpíadas da era moderna na última década do século XIX.

Os medalhistas são definidos em função de seu desempenho, em provas especialmente preparadas por especialistas, levando-se em consideração tanto o tempo de resolução quanto a qualidade das respostas. Espelhando-se na matemática, outras disciplinas também organizam competições desse tipo no Brasil, a começar da área de ciências naturais, que tem olimpíadas de astronomia, física, química, biologia e ciências naturais, para atender estudantes do ensino fundamental, médio e superior.

Existem hoje olimpíadas em várias áreas de conhecimento, das ciências agrárias à história do Brasil. Tal como nos esportes, a cada olimpíada são agregadas novas modalidades, no caso, novas disciplinas ou faixas etárias. Devido ao prestígio alcançado pelos medalhistas, a maioria das nações dispõe de centros de treinamento para preparar seus atletas durante os intervalos dos certames. São também promovidas competições pré-olímpicas onde os atletas se esforçam para atingir os índices mínimos estipulados para cada esporte.

Tomando as competições esportivas como modelo, muitas escolas também promovem atividades específicas com seus estudantes para prepará-los para as olimpíadas de conhecimento. A premiação de seus estudantes é celebrada por essas escolas como um atestado da qualidade do ensino por elas ministrado. Além de uma melhora significativa em seu aproveitamento escolar, os alunos premiados são agraciados com bolsas de estudo pelos melhores colégios e faculdades, inclusive no exterior.

Dada a origem militar da educação física e dos esportes em geral (que foi responsável, entre outros aspectos, que apenas competissem homens nas primeiras olimpíadas), nesses centros de treinamento vigora uma disciplina rígida, favorecendo a realização de exercícios repetitivos e exaustivos pelos atletas. Assim, a antiga concepção de que a mente, da mesma forma que o corpo, precisa se exercitar para ficar em forma, foi adotada pelas escolas nas primeiras preparações de estudantes para as olimpíadas de matemática.

Não por acaso, os estudantes dos colégios militares têm se saído muito bem nessas competições, tanto a nível nacional como internacional. Aliás, muitos atletas brasileiros, especialmente nas provas individuais, são militares da ativa com dedicação praticamente exclusiva ao esporte. A intenção original de que os atletas olímpicos fossem amadores, isto é, que não se utilizassem do esporte como meio de subsistência, é hoje praticamente letra morta, subsistindo apenas indiretamente nos regulamentos.

Na busca pelo ouro olímpico, os países investem na procura de jovens promissores nas diversas modalidades. Essa busca não se limita às agremiações desportivas das grandes cidades, mas se intenta identificá-los pelo país afora. Uma vez descobertos, são dadas a esses jovens as mesmas oportunidades de treinamento existentes nos grandes clubes. Essa já é uma prática corrente em esportes como o futebol, que promove a criação de “escolinhas de futebol”, espaços privilegiados para a busca dos “olheiros” dos clubes.

Os governos que se preocupam com investimentos na área de ciência e tecnologia, desde os anos 60 do século passado, têm realizado uma prática similar ao descobrir e reunir jovens excepcionais em “escolas de jovens talentos”. Inicialmente focadas na física e na matemática, acompanhando a evolução dos conhecimentos necessários para um desenvolvimento sustentável, hoje existem escolas desse tipo para inúmeras ciências, inclusive as chamadas ciências humanas, como a economia e a política.

Como se sabe, os raciocínios por analogia ficam reforçados quando se estabelecem semelhanças inéditas entre dois sistemas. O perigo é que esse acúmulo de semelhanças pode nos impedir de reconhecer as diferenças e considerar os sistemas homólogos. Daí a importância de buscar também diferenças entre eles para avaliar o grau de sua verossimilhança. Naturalmente, as diferenças não acarretam necessariamente a negação das semelhanças já encontradas, mas despertam dúvidas sobre o valor da analogia.

Uma diferença evidente é que nas olimpíadas de conhecimento não existem recordes. Pode-se, estatisticamente, comparar o grau de dificuldade de exames ou provas, porém é muito difícil comparar performances em situações diferentes. Não existe uma escala de inteligência absoluta aplicada ao comportamento humano em geral. Pessoas consideradas inteligentes podem se comportar estupidamente em determinadas situações. Por outro lado, apesar da quebra de recordes, é evidente que existem limites físicos insuperáveis.

Como demonstrado pela recente Olimpíada de Tóquio, não existe uma dicotomia entre mente e corpo. Se nas olimpíadas de conhecimento a mente parece prevalecer e nas olimpíadas esportivas é sobretudo o corpo que é exigido, o resultado final depende de ambos. Todavia, a analogia é valiosa e cada espécie de evento pode aprender com o outro a enfrentar seus desafios. Se houver uma paraolimpíada do conhecimento de português, haveria provas para os disléxicos?    


Imagem de destaque: MCTI

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