Isabela Lemos Coelho Ribeiro*
Pensar a educação no Brasil constituiu uma problemática que preocupou muitos intelectuais em diversos períodos de nossa história. As obras elaboradas com esse intento, assim, constituem um interessante veículo para percebermos projetos de educação que estiveram em disputa ao longo do tempo.
Nos deteremos aqui na obra A Educação Nacional, escrita por José Veríssimo em 1890. A trajetória e a produção desse intelectual permeiam distintas preocupações que iam desde a crítica literária, a etnologia, a história e a educação. Nascido no Pará, a atuação de Veríssimo em diversos órgãos ligados ao ensino nos dá uma medida da experiência que norteou seu projeto de educação nacional para a jovem República.
Na Introdução escrita à primeira edição, em 1890, o autor defende o imperativo da educação como o único meio propício para “reformar e restaurar um povo” (VERÍSSIMO, p. 63). Ao longo da obra, a convicção do autor reflete-se em todo um programa de reformas norteadoras de seu projeto de educação para o Brasil, em diálogo com diversos autores e exemplos estrangeiros. O interesse de José Veríssimo pela educação não era somente teórico, mas fundado no trabalho com o ensino tanto na província como na capital. A partir dessas experiências, o autor diagnostica de maneira pessimista o sistema educacional brasileiro como “anárquico e defeituoso” (VERÍSSIMO, p. 106).
Há aqui uma diferenciação entre educação e instrução: a primeira seria concebida por Veríssimo de forma ampla, ligada à formação do caráter nacional, pensado enquanto “conjunto das qualidades morais” (VERÍSSIMO. p. 99). A instrução, portanto, seria apenas uma parte da educação do indivíduo, ligada ao ambiente escolar. Com isso, o autor analisa as “características brasileiras”, ou seja, os elementos de nossa sociedade e da nossa história que cooperaram para a construção do caráter nacional. Este, para Veríssimo, seria marcado pela indiferença, pelo desânimo, pela passividade, pela fraqueza (Ibidem, p. 90). Disso resulta que a principal função da educação nacional deveria ser, para esse intelectual, a promoção de uma mudança do caráter do brasileiro.
Para alcançar esse objetivo, algumas disciplinas ganham destaque na concepção educacional esboçada nesse livro. A educação física, por exemplo, ultrapassaria os exercícios ginásticos, teria como fim “formar um corpo robusto e são” (VERÍSSIMO, p. 112) e abarcaria, inclusiva, a higiene pessoal, a alimentação, o vestuário, a esfera psicológica e uma rotina incorporada desde cedo na vida da criança. José Veríssimo analisa com especial atenção a importância do estudo da “geografia pátria”, pensada, em conjunto com a história, como a base do patriotismo esclarecido. Essa disciplina, no Brasil, seria ensinada de forma equivocada, por instruir os alunos apenas a decorar nomes de acidentes geográficos e cidades. Partindo de experiências europeias, o autor trata dos elementos que julga necessários ao ensino da geografia, muito ligados à aprendizagem pelo aluno dos elementos que formam o meio a seu redor, desde as redondezas da escola, da cidade, até chegar ao país como um todo, com o uso de mapas, ilustrações e bons manuais.
Outra importante disciplina para tal projeto seria a história pátria, segundo Veríssimo, ignorada pelos brasileiros. Somente pelo conhecimento do passado seria possível construir um sentimento cívico de união do povo. Para isso, necessário seria investir em uma literatura histórica, em manuais didáticos atrativos ao aluno e ainda em monumentos, museus e comemorações cívicas. Além disso, o autor dedica um capítulo para pensar a educação feminina, marcada por costumes portugueses tidos como atrasados, heranças portuguesas que dariam às mulheres uma “educação de convento” (Ibidem, p. 152), obrigando-as a viver isoladas do mundo ao seu redor. O autor pensa a mulher como o principal educador de uma sociedade. Destinada à ser mãe e esposa, Veríssimo defende uma maior adequação dos instrumentos educacionais a esse fim, com uma instrução “integral e enciclopédica”, ou seja, que investisse em um conhecimento amplo sobre ciências, história, literatura, geografia, sobre a cultura brasileira, enfim.
Na conclusão da obra, autor recupera a seguinte frase: “o Brasil não tem povo”. Essa frase diz da ausência de um sentimento patriótico que formasse a nação republicana. O principal instrumento para isso seria, portanto, a educação. Por fim, o projeto de José Veríssimo se liga a preocupações que permeiam o contexto do início da República no Brasil, questões distintas em muitos pontos daquelas que hoje nos ocupamos. Por isso, a recuperação desses textos não tem como horizonte torna-los modelos para nossas práticas hoje, mas sim perceber, através deles, as diversas disputas que envolviam uma ideia de educação nacional e, de forma mais ampla, de nação.
*Isabela Lemos Coelho Ribeiro é Graduada em História pela UFMG.
Referências bibliográficas:
VERÍSSIMO, José. A Educação Nacional. Rio de Janeiro: Topbooks; Belo Horizonte: PUC Minas, 2013.
http://www.otc-certified-store.com/hypertension-medicine-europe.html https://zp-pdl.com/fast-and-easy-payday-loans-online.php www.zp-pdl.com