Desce o morro estropiado
com andar de dama rica
sacode o vestido surrado
das ancas muito convicta.
Balança o seio,
conserta o decote,
esquece a vida
suja e pobre do barracão.
Não é Maria
de Antônios e Joãos,
apenas a moça
vestida de ilusão.
Bendita ilusão que encoraja
esquecidos,
marcados,
sofridos,
assustados
pares
… da dominação.
Ah!
Maria sem dono nem trono
princesa em trapos,
farrapos,
amiga de homens e ratos
monstros e gatos
cavaleiros em seu colchão.
Maria sem memória
sem luxo nem glória
carrega a história
do um povo abortado,
encolhido, acuado
sem direito nem peito
de sobreviver.
Maria benzida
em dores da vida
pecado mortal.
Pariu no silêncio
seu filho,
seu moço,
não cria Maria!
É pó!
Agonia!
É medo!
É dor!
Flagelo sem elo
Maria via,
pouco sorria!
a pia… outras Marias
talhadas em dor.
Caídas,
feridas,
anjos tombados
na via de horror.
Para Maria!
não veja morrer.
Um tiro na testa
sem medo da festa
foi-se
morrer e perder.
Pagou o bilhete
sem troca,
sem volta,
na porta,
no morro,
na escola,
Lá fora…
na rua é o povo
acuado de novo…
Não cria,
Maria!
mais um e mais outro
estendido
arrastado
parado
queimado,
medo,
terror.
É isso Maria,
Você não queria!
menino,
menina,
a calçada fria,
a cama vazia,
Você não queria
perder seu amor!
Maria não saia!
Corra e não caia
no morro, no bairro
Maria não saia
viva,
não caia
não veja o temor.
Volta Maria
prepara o barraco
que a noite chegou!
Perdidos,
assustados,
feridos,
acuados,
retornam cansados,
esperam amor!
Chora Maria,
o sino tocou!
Longos repiques
gemidos cansados,
o povo gritou.
Mais alto,
Mais forte
A morte
A sorte,
A bala parou.
Volta Maria…
outra vez mais.
Lava a história!
Limpa a memória!
Com honra e glória
de quem suplantou
o medo
a morte
o filho
a sorte…
A guerra cessou.
Na lápide branca
busca
Maria!
A flor,
a criança
O sol acordou!
Olhem…
Marias!
Filhas e crias,
mães na agonia
O sol retornou!
Imagem de destaque: Galeria de Imagens