Aline Choucair Vaz*
Liberdade de expressão com proposições de ideias diferentes e também de contestação são princípios básicos de toda democracia. No entanto, o que vivemos atualmente no contexto brasileiro? Desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em 2016, o Brasil tem apresentado um contexto político de ataque às pessoas e grupos que pensam diferente, que nega o princípio básico de cidadania e da democracia. As próprias eleições presidenciais do ano de 2014 com Dilma Rousseff e Aécio Neves, já estampavam uma polarização intensa com uma grande quantidade de Fake News, divulgadas principalmente na Internet pelas redes sociais. O impeachment da ex-presidente, encabeçado por grupos extremados que não aceitavam o resultado das urnas de 2014 e a derrota do então candidato do PSDB, viralizavam os discursos nas mídias e nas ruas, juntamente com uma crise econômica instalada, acentuada por opositores oriundos do Congresso Nacional e suas “pautas-bomba”. Neste sentido, ganha notoriedade a seguinte questão: Como exercer a liberdade de expressão sem usar o discurso de opinião para atacar ou aniquilar grupos que pensam contrariamente? Como divergir de forma a pluralizar e não condenar? Como contrastar sem atacar a vida e a sobrevivência de outros grupos que se organizam diferentemente?
Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, em seu artigo XIX “Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras” (ONU), já existe a legitimação da importância da pluralidade de opiniões para a formação de um indivíduo e de seu grupo. No entanto, essa liberdade de opinião, não pode se converter em discurso de ódio. Neste caso, o que penso não pode acirrar contra a vida e a existência do outro, tem limites a minha manifestação, respeitada as relações de civilidade e convivência. A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos já postula em seu primeiro artigo esse quesito: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (ONU). Posteriormente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos vai assegurar os vários princípios éticos dos cidadãos, sobretudo, àqueles que vivem e pensam diferentemente, mas que têm direito ao diálogo de forma respeitosa.
Esse clima hostil que já vem desde as eleições presidenciais de 2014, se acentuou com a entrada do candidato de extrema-direita no Poder, Jair Bolsonaro. Em 2018, com uma campanha encabeçada por Fake News, inclusive em relação à Escola, o candidato chega ao Poder, desqualificando todo aquele que pensa diferente e intitulando-o como “inimigo”. Esse discurso de ódio move o universo político brasileiro e todo àquele que diverge do Presidente é também qualificado por ele e seus admiradores por “petistas” e/ou “comunistas” (sem o conhecimento sobre o que seja cada um). Qual o papel da escola neste cenário? E da educação? A escola deve como instância social de socialização e sistematização de conhecimentos, que tem relação com a Ciência, ensinar que conhecimento se faz e produz de forma autônoma, com crítica, com opiniões diferentes e com teses a se discutir e aprender. Diferenciar informação de conhecimento. Problematizar o uso das mídias e da própria Internet para difamar os indivíduos e instituições, que muitas das vezes, produzem inverdades, que podem destruir vidas e sonhos dos envolvidos. E também cabe a escola e à educação em geral produzir uma cultura de paz, para ensinar o indivíduo a ter autonomia e se responsabilizar pelo que fala, escreve e publica. A nossa escrita tem marca e digital, em qualquer lugar que seja. Ter autonomia não é uma posição fácil, mas reveladora das atribuições do educador. Paulo Freire já aponta em seu livro, Pedagogia da Autonomia: “Ninguém é autônomo primeiro para depois decidir. A autonomia vai se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas […]. A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade”. (p. 107). Cabe ao educador e ao educando, uma tomada de decisões e exemplos, de crítica sobre a realidade, tomando como baliza, a fraternidade e uma sociedade mais ética, como bem diz e enfatiza esse documento tão fundante, que foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos e que tem uma enorme contribuição para os debates educacionais.
*Professora da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – FaE/CBH/UEMG. E-mail: alinechoucair@yahoo.com.br
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