Memórias de Germano Laterza: Educação e voluntariado nos anos de 1960 – Betânia Ribeiro e Nicola Neto

Memórias de Germano Laterza: Educação e voluntariado nos anos de 1960

Betânia de Oliveira Laterza Ribeiro

Nicola José Frattari Neto

Germano Laterza (1932-1993) nasceu em Uberaba, Minas Gerais, procedente de uma família de imigrantes italianos, com tradição em construção civil. Seu pai, Pepino Laterza, e seu avô, Miguel Laterza, possuíam o nome ligado à construção civil em Uberaba. Casou-se com a normalista professora Neiva Marilla Leite de Oliveira e tiveram três filhos e 5 netos. Sempre residiram em Ituiutaba.

Desenvolveu trabalho voluntário na cidade, em uma época onde a precariedade do sistema educacional, já que havia somente dois grupos escolares que ofereciam o ensino primário de forma gratuita, o Grupo Escolar João Pinheiro e o Grupo Escolar Ildefonso Mascarenhas, além de algumas escolas que funcionavam ligadas a entidades filantrópicas como igrejas e outras associações que apenas ensinavam as crianças a ler, escrever e contar, sem nenhuma documentação ou registro.

Neste contexto histórico-educacional, a primeira experiência socioeducativa de Germano Laterza foi promover a construção e o funcionamento, embora por pouco tempo, de um Patronato na cidade de Ituiutaba, no início dos anos de 1960. Como não houve envolvimento político para manutenção da obra, o trabalho foi encerrado. Desde muito jovem, Germano Laterza já trazia em sua essência a preocupação com as causas sociais, inspirado nos trabalhos que seu pai, Pepino Laterza, desenvolvia como construtor, auxiliando as pessoas mais carentes. Aos dezesseis anos de idade, era presidente da UMEI, União da Mocidade Espírita de Ituiutaba, e, em pouco tempo, foi convidado a ingressar na Maçonaria. Empresário e bem relacionado socialmente, conseguiu junto a um grupo liderar um imenso trabalho para a cidade de Ituiutaba que obteve o nome de “Pacto Áureo”, nos anos de 1950. Elaboraram um plano de metas para a construção de quatro obras assistenciais que supririam a cidade em auxílio aos carentes, acolhendo a criança órfã, o jovem sem escolaridade, os doentes mentais e os anciãos. Dessa forma, deu-se início a uma série de campanhas, bailes, rifas e pedidos a toda a comunidade, para a construção das obras que se seguiram sucessivamente: o Sanatório Espírita “José Dias Machado” (1956), o Educandário Ituiutabano (1958), a Casa dos Velhos “Bezerra de Menezes” (1963) e o orfanato “Lar da Criança” (1968).

Junto ao Educandário Espírita de Ituiutaba foi organizado por um grupo de jovens que participavam da UMEI, e encabeçados por Germano Laterza, decidiram construir a primeira escola ginasial gratuita da cidade, pois naquele momento só havia escolas particulares que ofereciam esse curso, tais como o Colégio São José, o Colégio Santa Tereza e o Instituto Marden, marcos de excelência no ensino da região, porém, com altas mensalidades o que dificultavam o acesso do aluno pobre. Germano Laterza foi o principal fundador desta escola ginasial gratuita, beneficiando toda a região do Pontal do Triângulo Mineiro. Seus funcionários e corpo docente eram em maioria voluntários. Parte da renda para manutenção provinha de contribuições, muito baixas, de apenas alguns alunos. Contribuições mal davam para as despesas rotineiras da escola, obrigando a comunidade escolar a se empenhar em ininterruptas campanhas para sua manutenção. Assim, o Educandário Ituiutabano pôde ser considerado uma instituição beneficente, pelos princípios espíritas que seus fundadores e diretores abraçaram. O Educandário foi criado com a finalidade de minimizar os efeitos do analfabetismo na cidade e também oferecer uma oportunidade aos jovens carentes de prosseguirem em seus estudos ginasiais.

Após sua inauguração, Germano Laterza, ainda presidente da UMEI, juntamente com o inspetor de ensino federal Edelweiss Teixeira, lideraram um trabalho educacional junto aos alunos, sendo Germano Laterza Orientador Educacional e o diretor da instituição “Ângelo Tibúrcio de D`Ávila”. Este trabalho ocasionou a fundação do Grêmio Literário “Bernardo de Guimarães”. Apenas algumas verbas anuais federais conseguidas pelo então deputado Mário Palmério da cidade de Uberaba, fundador da UNIUBE, chegaramà obra. Mário Palmério inclusive foi homenageado na inauguração da escola, dando seu nome à biblioteca que lá se instalou. “Por sua vez, O Sanatório Espírita “José Dias Machado”, a princípio denominado “Asilo de Dementes” e a Casa dos Velhos “Bezerra de Menezes” ainda funcionam sob direção própria, pois que o trabalho de Germano Laterza foi o da construção dos prédios”.

Da mesma forma, ocorreu com o Orfanato “Lar da Criança”, que em 1990, já com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, em funcionamento, passou a Creche Espírita “Maria José Fratari”, não mais atendendo em regime de internato.

Essas três últimas obras, embora construídas sob a liderança das campanhas promovidas por Germano Laterza funcionam ainda hoje com direção própria.

De acordo com a matéria publicada pela Fundação Cultural de Ituiutaba (2012) Germano Laterza foi eleito em 1963, “com o maior número de votos registrados na história política desta cidade”. Ressalta-se que até os anos oitenta os edis brasileiros não tinham salário. Germano foi presidente da Câmara, mas por ocasião do golpe militar de 1964, foi compelido a renunciar ao seu mandando de vereador. Na pesquisa de Franco e Souza (2011) com o Golpe militar instituído em 1964, o município de Ituiutaba foi submetido ao Comando militar para nova ação política na cidade. O município conviveu com os horrores da ditadura militar. Como ação deste comando militar e de acordo com o Ato Institucional, o presidente da Câmara, então Sr. Germano Laterza, foi obrigado a declarar vagos os cargos ocupados pelos políticos pertencentes ao PTB. Assim, Germano Laterza e os demais políticos do PTB foram perseguidos pelos oficiais militares. A demonstração da força e autoritarismo em Ituiutaba por meio de uma junta militar armada em cooperação com civis do município resultou segundo Silva e Ferreira (2014, p 321) em renúncia do prefeito, do vice, e de alguns vereadores, além da prisão de três desses últimos e de um assessor do prefeito.

Essa junta também fechou um jornal local, a Folha de Ituiutaba, culminando na prisão do dono da folha e de seu redator chefe, que foram levados ao Departamento de Ordem Política (DOPS) em Belo Horizonte e obrigados a prestar depoimento.

A perseguição do Sr. Germano Laterza no período da ditadura militar dos anos 60 coube reparação do governo brasileiro, sendo reconhecido publicamente os atos arbitrários da governança militar para com esse cidadão perante a sociedade e sobretudo perante seus familiares. Tal retratação oficial se deu por meio de indenização à viúva Professora Neiva Laterza em cerimônia pública realizada na Universidade Federal de Uberlândia em Maio de 2009.

Ainda que póstumo, o reconhecimento a esse mineiro é justo, pois, ao longo de sua trajetória de vida Germano Laterza desenvolveu trabalhos voluntários a favor da educação como direito de todos e cuidando principalmente da criação e implantação do Educandário Espírita Ituiutabano.

Em conclusão, como descrito acima, vislumbra-se a significativa trajetória de Germano Laterza na promoção da educação no município de Ituiutaba, sendo que priorizou oferecer à parcela mais carente a formação educacional em um contexto histórico de precariedade da educação e de coerção pela ditadura militar, conseguindo implantar as raízes de instituições ginasiais e gratuitas que muito contribuíram para o Pontal do triângulo Mineiro e ainda hoje atuantes.

Betânia de Oliveira Laterza Ribeiro é professora do curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências Integradas do Pontal (FACIP/UFU) e do Programa Pós-Gaduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU)

 

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