Fechamento‌ ‌de‌ ‌Revistas,‌ ‌a‌ ‌face‌ ‌visível‌ ‌do‌ ‌obscurantismo.‌ ‌

Desde que surgiram, há alguns séculos, as revistas acadêmicas têm sido importantes veículos de difusão dos conhecimentos científicos, de intercâmbios culturais e intelectuais e de formação de novos cientistas. Isso sem falar em suas facetas de divulgação científica para um público não especializado. Nesta perspectiva, nunca é demais lembrar que tais periódicos são, por assim dizer, a face pública de nossas instituições científicas e parte constitutiva de nossas culturas acadêmicas.

Hoje, no Brasil, temos milhares de revistas que, em sua maioria, cumprem importante papel de dar continuidade e/ou renovar as culturas acadêmicas e científicas das áreas em que se inserem e, ao mesmo tempo, buscam divulgar os resultados dos projetos de pesquisa, ensino e extensão desenvolvidos pelos(as) pesquisadores(as) das mais diversas áreas do conhecimento. No entanto, boa parte destas revistas subsistem graças ao esforço das instituições que as abrigam e, sobretudo, das equipes editoriais que lhes dão suporte.

Se, por um lado, são antigas e amplamente conhecidas, no Brasil, as dificuldades para se manter um periódico científico, não se pode negar que estas aumentaram desmesuradamente nos últimos anos. A luta do bolsonarismo para a destruição de nossas agências de fomento à pesquisa e de apoio à publicação das revistas tem logrado êxito a olhos vistos. O CNPq, a CAPES, a FINEP e muitas das Fundações Estaduais de Apoio à Pesquisa têm sofrido com os sucessivos cortes de recursos para a educação e a pesquisa. Vivemos tempos sombrios e de obscurantismo jamais vistos na história do país nos últimos dois séculos.

No entanto, se é visível as dificuldades que se abatem sobre todas as áreas de conhecimento, no que diz respeito às revistas, chama a atenção o número de periódicos das áreas de ciências humanas, sociais, letras, linguística e artes que, nos últimos meses, anunciaram o término de suas atividades por falta de recursos financeiros. Aparentemente, estas áreas vivem as atuais adversidades de um modo mais intenso e mais dramático.

Há que se chamar mais a atenção para as implicações do fechamento de periódicos das humanidades para a comunidade científica brasileira e, certamente, para o conjunto do país. Assim como não se pode ignorar que o bolsonarismo tem, nas ciências humanas e sociais e em suas capacidades de explicitação de nossos problemas, um de seus principais inimigos. Não se pode esquecer também que as diferentes áreas lutam, dentro dos sistemas de pós graduação e de ciência e tecnologia, em posições muito desiguais de poder. Desse modo, muitas vezes, as humanidades têm que lidar, simultaneamente, com o obscurantismo bolsonarista e com os preconceitos de que são objeto no interior do próprio campo acadêmico.

Há que se atentar para o fenômeno do fechamento das revistas pois ele, além de fazer cessar a divulgação de conhecimentos em áreas importantes, pode também refletir não apenas os cortes de recursos das agências de fomento, mas também posições agressivas de determinadas áreas no interior do sistema na definição de critérios e formas de financiamento que incidem desigualmente no conjunto das áreas. 

Não entender que o destino das ciências humanas e sociais antecipa o destino do conjunto das áreas do sistema não é menos obscurantista do que o obscurantismo bolsonarista, ainda que possa ser embalado por palavras e justificativas mais rebuscadas.

 

Acesse a carta escrita pela Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Academia Brasileira de Letras (ABL), a Academia Naciona de Medicina (ANM) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) sobre a situação dos periódicos científicos no Brasil. 


Imagem de destaque: Anpocs

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