Educação Infantil, práticas educativas-avaliativas e contextos de vida de crianças em condição de pobreza e extrema pobreza

Shellen de Lima Matiazzi*
Renata Duarte Simões

 

A pobreza está atrelada, no imaginário social, à carência de bens materiais, à ausência de bons costumes e à falta de valores morais. Contudo, é imprescindível romper com essa visão estereotipada e compreender a pobreza como um fenômeno multidimensional, produzido histórica e socialmente a partir das relações desiguais de distribuição de renda, de acesso a direitos básicos, de participação política e social e de ausência de condições dignas de vida.

As vivências da pobreza são evidenciadas nos diferentes espaços das cidades, nas ruas, nas periferias e nas escolas públicas, em que chegam diariamente crianças em condições de vida precarizadas. São essas trajetórias, marcadas pela pobreza e pela falta de condições dignas de um justo viver, que atravessam o cotidiano das escolas e convocam os profissionais que atuam nesses espaços a assumirem um posicionamento político diante das realidades vividas pelas crianças que não tem acesso a uma educação que garanta seus direitos, suas necessidades e interesses.

Com o intuito de pensar essas crianças, junto aos profissionais que atuam na Educação Infantil do município de Vitória-ES, iniciamos, em 13 de março, o curso de extensão “Infâncias, avaliação e os contextos de vida de crianças em situação de pobreza e extrema pobreza”. Direcionamos olhares às crianças atendidas na etapa da Educação Infantil, na tratativa da garantia de direitos sociais também destinados aos pequenos, que muitas vezes são negligenciados pelas formas degradantes de viver a infância, atravessada pela miséria, fome, violência, insegurança e desproteção.

O curso tem como objetivo refletir sobre os processos educativos nos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) e sobre o modo como as práticas avaliativas são pensadas pelos profissionais que atuam em contextos empobrecidos.

A realização desse curso de extensão constituiu-se a partir da elaboração do trabalho de dissertação realizado no Programa de Pós-graduação de Mestrado Profissional em Educação (Ppgmpe) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), que tem possibilitado a aproximação da Universidade com as unidades de Educação Infantil, na discussão e construção de novos conhecimentos que contribuam com os educadores que estão atuando diretamente com crianças de 0 a 5 anos em condição de pobreza e extrema pobreza, enfatizando a relação do cuidar-educar, especificidade dessa etapa da educação básica.

Pensamos a infância como uma categoria social que tem suas especificidades e as crianças como sujeitos que, apesar de guardarem semelhanças entre si, são caracterizados pela diversidade. Assim, afirma-se o uso do termo Infâncias, uma vez que considera as diferentes formas de viver essa etapa da vida em decorrência dos contextos sociais das crianças, como as crianças do campo, do movimento sem-terrinha, das comunidades indígenas, das comunidades quilombolas, dos contextos empobrecidos, elencando as especificidades que essas vivências trazem para os modos de compreensão de mundo das crianças.

Nesse sentido, evidencia-se a importância de reconhecer a criança como sujeito de direitos, cuja ação, a palavra, a cultura e a história – atravessadas pela condição de classe, de etnia, de gênero, etc. – precisam ser ouvidas e respeitadas. A partir da pertença a um determinado contexto em que estão inseridas, das relações que estabelecem com outros sujeitos, das interações entre seus pares, dinâmicas e heterogêneas, que as crianças constituem culturas das infâncias, nesse caso mais específico de análise, infâncias empobrecidas.

Esses milhões de crianças e adolescentes que chegam às escolas, que vivem em condições de pobreza, precisam ser reconhecidos e visões morais precisam ser superadas, para dar espaço às trajetórias de vida, às condições sociais de ser e viver. Para enfrentamento dessa condição, é imprescindível admitir a existência das desigualdades sociais que adentram o espaço escolar e que nele são reproduzidas, inclusive nas práticas avaliativas classificatórias e seletivas.

Em contrapartida, a avaliação na Educação Infantil, como proposta de acompanhamento e registro do desenvolvimento e de vivências da criança, não pode desconsiderar as individualidades e os contextos socioculturais desses sujeitos, exigindo um olhar teórico-reflexivo que auxilie no trabalho do professor e que favoreça o crescimento da criança, e não a sua exclusão.

Partindo dessas reflexões, o curso de extensão realizou, até o momento, dois encontros, dentre os sete propostos, fomentando o diálogo e debates sobre a temática da educação, pobreza e desigualdade social enquanto resultado de processos históricos e sociais e os impactos na vida das crianças, rompendo com visões naturalizantes e estereotipadas que culpabilizam os sujeitos empobrecidos por sua condição. A busca é por possibilitar um olhar crítico-social sobre a pobreza, rompendo com processos excludentes na infância e reafirmando o papel social da escola.


*Aluna no Programa de Pós Graduação de Mestrado Profissional em Educação (Ppgmpe/Ufes)

Imagem de destaque: Dmitry Ratushny /Unsplash

http://www.otc-certified-store.com/obesity-medicine-europe.html https://zp-pdl.com/emergency-payday-loans.php https://www.zp-pdl.com

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *