Educação e Economia

Nos últimos dias foram intensos os debates, as manifestações  e a produção de textos sobre a MP do Ensino Médio .Tais manifestações, de um modo geral,  condenam veementemente o retrocesso que a proposta significa, tanto em termos de forma – Medida Provisória e não Projeto de Lei – quanto no que se refere ao conteúdo da mesma.  Não por acaso,  conteúdo e forma nos fazem lembrar as reformas educacionais realizadas em períodos de exceção vividos anteriormente pelo país.

Se considerarmos o conjunto das manifestações da comunidade educacional brasileira, estamos, nesse caso, muito longe do “tropeço da democracia” referido pelo Ministro Lewandowisk ao falar sobre o processo de impeachment da Presidenta Dilma, e em plena atualização do Estado de Exceção sabido e autorizado pela justiça do país. Nesse caso, a Reforma do Ensino Médio por meio de uma MP nada mais é do que uma representação/reapresentação do autoritarismo tão presente em nossa história e cultura políticas.

Não se pode desconsiderar, em primeiro lugar, a própria urgência com que se quer enfrentar um problema secular.  A urgência, na verdade, é uma forma de buscar autorização para intervenções “indiscutivelmente necessárias”, como se estivéssemos num hospital e com o paciente à beira da morte.   De reforma em reforma, vamos corroendo a possibilidade de engajarmos as(os) docentes da escola básica, os(as) estudantes e suas famílias na construção de uma escola e de um projeto educativo de qualidade.

Não é por acaso que a proposta de Reforma do Ensino Médio consagra legalmente, mais uma vez, o dualismo das trajetórias escolares pretendidas para nossas juventudes: àquelas mais pobres, deseja-se uma trajetória menor, mais pobre e diretamente vinculada ao mundo do trabalho. Para as juventudes das camadas médias e altas, para as juventudes bem nascidas, uma trajetória mais longeva que inclui, necessariamente, a universidade, quando não também a pós-graduação.

Mas, não é apenas nisso que a MP significa um retrocesso de décadas. É também por desconsiderar toda a crítica que já se fez ao empobrecimento trazido à educação, à formação humana, quando essa é capturada pelos estreitos marcos da economia, notadamente da teoria do capital humano. Os vieses dessa submissão são patentes quando se observa que a MP investe fortemente na ideologia segundo a qual o ensino médio deve atender às expectativas, aos investimentos, diriam alguns, de cada jovem, individualmente falando.  Cada um deve ser capaz e ser atendido em sua possibilidade, maior ou menor, de se tornar empresário de si mesmo!

Ao se afastar de qualquer projeto político pedagógico de formação rica e integrada das juventudes brasileiras, ao abrir mão de uma educação (formação) básica para todos os brasileiros e brasileiras, a MP significa, também, um obtuso esquecimento de quase tudo que se produziu no Brasil, nas últimas décadas, sobre o assunto. Outro governo, outros gestores do público, mas a mesma mentalidade  a respeito do problema.

O problema mais grave é que essa submissão da educação à economia, com o consequente empobrecimento da formação, não é característica das propostas desse governo apenas.  No governo anterior, de Dilma Rousseff, o ex-Ministro Mercadante anunciou um conjunto de medidas que iam na mesma direção.

Sem considerar os conhecimentos já acumulados pelas experiências e pelas pesquisas, sem considerar os sujeitos envolvidos, sem considerar a necessidade de um projeto educativo diverso mas igualitário, certamente a reforma do Ensino Médio fracassará no intuito de melhorar a qualidade da escola pública brasileira. O grande problema é, no caso presente do Brasil, que não é possível esperar esse tipo de compromisso de um governo que ascendeu ao poder pelas forças conservadoras e sem o  menor compromisso com o Estado de Direito e com as políticas sociais.  Essa é, pois, mais uma razão para desconfiarmos da proposta e continuarmos na luta!

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