Crianças e Famílias em modo online: novos percursos sociais e afetivos

Isaac Luís de Souza Santos*

Juliana Cardoso Daher**

Coletivo Geral Infâncias

Nos últimos meses, em decorrência das medidas de isolamento social por causa da pandemia de COVID-19, as crianças com acesso às tecnologias digitais tiveram suas vidas hiperdigitalizadas de maneira significativa.

Os recursos tecnológicos estão sendo utilizados por muitas escolas particulares em aulas remotas com a estruturação de ambientes virtuais de aprendizagem. Há relatos de crianças que permanecem horas diante das telas em uma exaustiva jornada de atividades escolares. Encontra-se também escolas públicas com perfis nas redes sociais alimentados por conteúdos produzidos pelas professoras, com propostas de brincadeiras, atividades, e registros do cotidiano das crianças enviados pelas famílias.

Novos modos de se relacionar socialmente foram instituídos a partir da impossibilidade do encontro presencial. Salas virtuais tornaram-se os ambientes de encontros possíveis neste momento. Em muitos dos lares onde acontecia um maior controle da exposição de crianças às telas, a realidade se modificou com a necessidade de se comunicar com familiares e amigos.

Os programas e conteúdos de entretenimento também tem sido excessivamente buscados por famílias, e é possível encontrar uma oferta ampla de apresentações de música, teatro, contação de histórias, oficinas de jogos e brincadeiras, construção de brinquedos e muito mais, online e, em muitos casos, gratuito.

Considerando todo o conteúdo disponibilizado, ressalta-se que, no Brasil, as mídias voltadas para o público infantil são pouco fiscalizadas e tornam-se terreno invadido por propagandas, que têm sua regulação por órgãos públicos muito insipientes. Organizações e movimentos sociais, como a Rebrinc (Rede Brasileira Infância e Consumo) e o Instituto Alana mobilizam reflexões e ações de enfrentamento ao consumismo na infância.

Contudo, a responsabilidade maior no cuidado com a qualidade dos conteúdos acessados pela criança, impreterivelmente, ainda recai sobre a família, uma vez que os órgãos governamentais e empresas não assumem a devida responsabilidade. Mas, diante de tanta sobrecarga sobre as famílias neste momento, como fazer com que a responsabilidade no cuidado da relação das crianças com as telas não seja mais um peso?

Uma possibilidade é reconhecer que, assim como são necessários cuidados, presença e mediação na vida offline da criança, isso deve também acontecer na vida online. Na vida offline dos nossos filhos, cuidamos de suas rotinas, alimentação, autocuidado, ambientes pelos quais circulam, brincadeiras que fazem, acompanhamos sua vida escolar. Na vida online não deve ser diferente. Também é necessário organizar uma rotina que contemple a experiência da criança com o ambiente virtual, considerando:

  • O tempo (de exposição às telas e sua distribuição, levando em conta a realização das atividades fora do ambiente virtual).
  • A qualidade dos conteúdos acessados e a forma de interação (se a criança está passiva demais ou distante do processo).
  • A presença e mediação do adulto na descoberta de ferramentas e conteúdos, estimulando novas aprendizagens.

É possível tornar essa experiência significativa para adultos e crianças, considerando, inclusive, as muitas possibilidades que o uso das tecnologias pode propiciar às crianças, especialmente no que se refere à socialização, ampliação e aquisição de conhecimentos.

Outro aspecto importante é discutido pela pesquisadora do programa Criança e Natureza, Maria Isabel Barros. Ela afirma que o uso das tecnologias pelas crianças está posto como forma de contato com o externo durante o isolamento social, e ressalta que é possível que esta experiência seja positiva para a criança, desde que faça sentido para ela. Este é um aspecto interessante para pensar: as necessidades de quem têm sido atendidas quando a criança é exposta às telas? Do adulto, da criança ou de ambos? A partir desta identificação, torna-se fundamental qualificar essa exposição, considerando o tempo, o suporte utilizado, a qualidade do conteúdo, a presença e mediação do adulto, e o sentido que a experiência tem para a criança.

No ambiente virtual, a criança pode ter experiências mais ativas, nas quais cria, se movimenta, constrói objetos, histórias, realiza atividades que a interessam. Porém, uma instância superior deve imperar sobre as dimensões offline e online da vida: a experiência da infância. Sendo assim, deve haver um cuidado para que crianças não façam uso de tecnologias e ambientes virtuais como fazem os adultos, reproduzindo modos de relação marcados muitas vezes pelos excessos. Por exemplo, no que se refere a tempo de uso, exposição de si e consumo e produção de conteúdos banais e esvaziados de sentido.

Para trilhar um caminho possível entre a vida online e offline das crianças, faz-se necessário que, neste percurso, os adultos sigam ao lado, em uma relação de proximidade, cuidado, participação. E, acima de tudo, considerando peculiaridades que marcam a experiência da infância: o brincar, o simbólico, o movimento. Na própria criança podemos encontrar um excelente mapa para nos guiar neste caminho.

* Licenciado em Música pela UFMG, Mestrando em Educação Musical pela mesma instituição, educador musical, idealizador e artista da Cia Pé de Moleque. E-mail: isaac_flauta@yahoo.com

** Graduada em Terapia Ocupacional. Mestre em Estudos de Linguagens pelo CEFET-MG. Idealizadora e artista da Cia Pé de Moleque. Produtora Cultural do Quintalzim. E-mail: oquintalzim@gmail.com


Imagem de destaque: Laís Gouvêa – Tanto Mar Fotografia. https://zp-pdl.com/online-payday-loans-in-america.php https://zp-pdl.com/online-payday-loans-cash-advances.php https://www.zp-pdl.com http://www.otc-certified-store.com/alzheimer-s-and-parkinson-s-medicine-usa.html

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