Me gustan los estudiantes
Porque son la levadura
Del pan que saldrá del horno
Con toda su sabrosura
Para la boca del pobre
Que come con amargura
(Violeta Parra, 1917-1967)
45 dias de usurpação de um governo eleito pelo povo.
Pretendo fazer aqui, neste espaço, um exercício para apontar as razões da Medida Provisória 746 de 22 de setembro de 2016, a MP do Ensino Médio. Neste primeiro artigo buscaremos as razões políticas para tal medida provisória e de urgência.
Comecemos pelo óbvio: uma medida provisória, mesmo usada num regime democrático, é uma medida de exceção. Não é um recurso legislativo a ser usado indiscriminadamente pelo governante, seja qual for o motivo que requer a medida. Uma medida, qualquer que seja, é uma tomada de decisão que demonstra urgência na solução de um problema. Não era – e nem é – o caso do Ensino Médio. E a provisoriedade de qualquer medida se restringe aos seus trinta dias de tramitação no Congresso. Portanto, é um meio de fazer o Congresso se mover diante de um assunto espinhoso que vem sendo negligenciado. E após os debates, transformam a medida em lei, deixando a mesma de ser provisória. Ou a medida deixa de ser provisória por decurso de prazo. Isto é, quando o Congresso continua negligenciando o assunto.
Politicamente, qualquer medida provisória é um atraso para a Democracia, pois mostra a incapacidade de negociação de um dos lados. E neste caso, onde vejo incapacidade de negociação? Ora, desde que o mundo é mundo que a humanidade caminha com a conservação dos velhos e a rebeldia dos jovens. É essa saudável tensão que faz com que a humanidade avance lentamente no caminho da Liberdade. Por vezes, o conservadorismo vence e a marcha para. Em geral, na bala. Noutras vezes, a teimosia rebelde da juventude mostra para os velhos que o novo sempre vem. Em geral, no grito. Cada sociedade em seu tempo tem seu ritmo.
O que vimos presenciando desde as Jornadas de Junho de 2013 é um duplo movimento da juventude desse país. De um lado, movimentos como Passe Livre e Black Block colocaram a juventude na rua mais uma vez. Até então, a interlocução vinha acontecendo – com muitos problemas, é claro – com os governos populares eleitos nos três níveis de governo. Porém, as Jornadas começam por demonstrar que o modelo de diálogo vinha se desgastando com o afastamento daqueles mesmos governos do movimento social como um todo, incluindo aí os movimentos juvenis. De outro lado, percebendo esse avanço da juventude, movimentos como o Escola Sem Partido encontraram a sua motivação para barrar essa juventude transviada, que anda pensando e apoiando atos não apenas contra o establishment governamental, mas contra um modelo de sociedade defendida pela bancada BBB – Boi, Bíblia e Bala. A sua primeira ação foi minar qualquer tentativa de incluir a discussão sobre gênero nos planos municipais, estaduais e federal de educação. A sua motivação é que essa meninada andou recebendo muita doutrinação marxista na escola, por meio das aulas de História, Sociologia e Filosofia.
Três ações, legalizadas pela Medida Provisória, começam a fazer efeito imediato. Primeira: o Artigo 36 que fala de itinerários formativos específicos e lá no inciso IV aparecem as Ciências Humanas como uma opção. Isso mesmo, uma opção. Escolas de ensino médio que já não possuem professores de História, Geografia, Sociologia e Filosofia oferecerão este itinerário formativo? Em quais condições? Segunda: Aqui entra a adequabilidade uma vez que o §17 insere o notório saber, de forma e maneira indiscriminada, facultando a qualquer um conduzir esse debate junto à juventude, do padre ao juiz, do pastor ao advogado cuja “demonstração prática” e “experiência de trabalho (…) adquirida fora do ambiente escolar” superará qualquer formação profissional na área. E com a vantagem de serem mais baratos, uma vez que muitos o fariam por amor à causa (de uma escola sem partido). Terceira: a priorização dos tempos e espaços para um ensino exclusivamente técnico e profissional atendendo aquilo que considero a educação bovina do projeto Ponte para o Futuro, do PMDB.
Esta foi a maneira encontrada para conter essa juventude. Primeiro, na bala. Depois, na escola. A urgência da Medida Provisória está aí. Na contenção e no enquadramento do corpo ao prédio escolar. Nada de rua. Enquadrar na cela de aula, voltar à grade (curricular) anterior (com Religião, OSPB e Moral e Cívica, de preferência com pastores) ou modifica-la a ponto de parecer estranha a qualquer ser humano inteligente.