Marques Rebelo, pseudônimo literário de Edy Dias da Cruz, nasceu em 1907, na cidade do Rio de Janeiro, no tradicionalíssimo bairro de Vila Isabel. Cursou medicina por um curto período, desistindo para se dedicar ao comércio, ao jornalismo e, mais tarde, à educação, exercendo o cargo de inspetor de ensino secundário no Ministério da Educação e Cultura. Romancista, contista e cronista (também explorou o teatro e a biografia), elegeu para a Academia Brasileira de Letras, sucedendo a Carlos Magalhães de Azeredo. Marques Rebelo morreu em 1973, em sua cidade natal.
A Estrela sobe é o romance mais popular de Marques Rebelo, tendo sido adaptado para o cinema, dirigido por Bruno Barreto e com a atriz Betty Faria no papel de Leniza, protagonista da história. Típico autor da vida carioca, Marques Rebelo é considerado um sucessor de autores como Manuel Antônio de Almeida (“Memórias de um Sargento de Milícias”); Machado de Assis (“Memórias Póstumas de Brás Cubas”) e Lima Barreto (“Triste Fim de Policarpo Quaresma”), verdadeiros “cronistas” da cidade maravilhosa.
A Estrela sobe narra a trajetória de uma cantora de rádio. A suburbana Leniza, filha de uma pobre viúva, dona Manuela, é incentivada por um dos moradores, que alugava um dos quartos da casa, seu Alberto (que tocava violão) a se inscrever em um teste de uma emissora de rádio, a “Metrópolis”. Aprovada, mais por sua beleza física do que por sua afinação, Leniza demite-se de seu antigo emprego em um laboratório farmacêutico (ela visitava consultórios médicos, onde, num deles, conheceu o doutor Oliveira, por quem nutria um sentimento verdadeiro) para dedicar-se à carreira artística. Movida por atingir o sucesso a qualquer preço, Leniza envolve-se com vários homens (e também com Dulce), que servem de escada para o seu sucesso. Entretanto, sem conseguir dinheiro suficiente para manter-se a si e à sua mãe, Leniza oferece-se como “prostituta” a seus amantes (Mário Alves, Porto, Amaro). Grávida, não aceita ter o filho, julgando-o ser um empecilho à sua carreira de cantora. Por intermédio de uma antiga conhecida, Judite, é levada à Madame Consuelo para realizar um aborto (já que Oliveira não aceitara fazê-lo). Correndo risco de vida, Leniza é cuidada pelo doutor Vasconcelos, que revela à mãe da moça que ela passara por um aborto malfeito. Durante os seus delírios, Leniza parece ver a sua vida passar como um filme, onde as pessoas, principalmente, os homens que a seduziam, eram os seus algozes. Sem mais o apoio da mãe, que se decepcionara com a filha e fechara-se em sua própria desilusão, a vaidosa Leniza sonha ainda com a vida de estrelato. Sem um desfecho aparente (obra inacabada é uma constante na produção do escritor), o próprio Marques Rebelo explica, num processo metalinguístico:
(…) “tribulação e trevas, desmaio e angústia, e obscuridade”, aqui termino a história de Leniza. Não a abandonei, mas, como romancista, perdi-a. Fico, porém, quantas vezes, pensando nessa pobre alma tão fraca e miserável quanto a minha. Tremo: que será dela, no inevitável balanço da vida, se não descer do céu uma luz que ilumine o outro lado das suas vaidades? (p.169).
Narrado em 3ª pessoa onisciente, portanto, pelo próprio Marques Rebelo, A Estrela Sobe, tem como espaço a cidade do Rio de Janeiro, com os seus bairros periféricos, como o Encantado, Saúde e São Cristóvão; com seus sorvetes-dançantes no bairro do Flamengo; o Pão de Açúcar; com os seus bondes tilintando e os carros fonfonando pelas ruas agitadas da cidade e, claro, com suas estações de rádio, em rixas, disputando as estrelas (e estas disputadas por homens solteiros e casados), que, por sua vez, disputavam os compositores (Quero te pedir perdão / pela minha ingratidão. / Já paguei muito bem pago / a loucura de ter te abandonado). Marques Rebelo adotou uma linguagem coloquial, adequando-a à condição socioeconômica de personagens populares (lavadeiras, costureiras, fofoqueiras, comerciantes, operários, médicos decadentes, cantoras de rádio, produtores, compositores). Entretanto, na fala do narrador o leitor se depara com momentos poéticos, provocados pelos recursos estilísticos, principalmente por símiles (ou comparações), como é possível perceber nos inúmeros trechos abaixo:
O sinal fechou como um olho de sangue (p.85).
Ela sentou-se na cama, os seios caíram como frutas… (p.98).
(…) e uma doce tristeza envolve-lhe os sentidos como um sudário… (p.98).
Oliveira sentiu novamente a pancada, como um boxer que se empregou demais na luta e resiste mal aos últimos golpes (p.122).
(…) A vida dos dois homens passa como uma sombra (p.123).
(…) Vozes de rádio incomodam como moscas importunas (p.155).
Fica, então, aí a dica!
Para saber mais
REBELO, Marques. A estrela sobe, Rio de Janeiro: Livraria José Olympio editora, 8ª ed., 1980.
Imagem de destaque: Galeria de imagens