A CNCT&I e o NOVO PLANO NACIONAL DE CT&I: qual o lugar do “social”?

(Conversações com a Ministra Luciana Santos)

Luciano Mendes de Faria Filho

Outro dia eu publiquei um suposto diálogo que eu teria com a Ministra da CT&I, Luciana Santos, caso eu a conhecesse. Gostaria de retomar esse (suposto) diálogo, adiantando mais umas coisinhas que me parecem pertinentes.

Como se sabe, da 4ª Conferência Nacional de CT@I, realizada em 2010, não resultou, como eu supunha, um Plano Nacional de CT&I. Em seu lugar, foram elaboradas, pela própria Equipe do MCTI, duas Estratégias Nacionais de CT&I (2012-2015). Qual a razão disso acontecer, eu pouco sei.

O certo (!) é que, Senhora Ministra, desconhecidas pela comunidade acadêmica e esquecidas pelos governos, tais estratégias pouca efetividade tiveram. Mas tiveram algumas, dentre as quais uma maior atenção, no âmbito Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação às CHSSALLA sobretudo devido à intervenção do Fórum das Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas e à sensibilidade da equipe do Ministério e do CNPq

O fato de não termos um Plano Nacional de CT&I não impediu, obviamente, que a carroça caminhasse e as abóboras fossem se ajeitando. Houve, por exemplo, a reforma do próprio MCTI e do CNPq, só para dar dois exemplos estruturais, e a continuidade, claro, do fomento, ainda que, neste quesito, as vacas tenham ido para o brejo e quase não tenha ficado pedra sobre pedra nos últimos anos de descalabro governamental.

Mas não apenas isso: tivemos, também, os Planos Nacionais de Educação e de Pós Graduação que, pelo menos em parte, se relacionam diretamente com a CT&I. Este último, por exemplo, ainda que não tenha sido discutido com a área de educação, traz todo um capítulo sobre a relação entre a Pós Graduação e a Educação Básica que, entre outras coisas, justificou uma aguerrida disputa de muitas áreas “científicas” pelos recursos da CAPES alocados para a educação básica. Mas, como sabemos, ambos os Planos, que já não vinham sendo operacionalizados em sua totalidade até 2016, depois do Golpe foram totalmente esquecidos (quando não combatidos) pelo governo federal.

Chegamos, pois, ao cerne de nossa charla: resultará da Conferência Nacional de CT&I de que se fala nos bastidores da comunidade científica um Plano Nacional de CT&I? Se sim, quem vai elaborá-lo, monitorá-lo, avaliá-lo? É aí que a porca torce o rabo, se ela não for cotó!

Esse assunto se relaciona, obviamente, com a própria organização e realização da V CNCTI. Se, esta for coisa só para a comunidade científica e para “convidades” de alto nível, já sabemos como será. Mas se queremos, mesmo, um Plano Nacional de CT&I que inclua e reflita todos os Brasis, a própria conferência, e a elaboração, monitoramento e avaliação do PN CT&I, deverá espelhar isso.

Nesse particular, Senhora Ministra, como a senhora bem sabe, o “social” da Conferência e do Plano não pode estar nas beiras ou ser o “fim último” de toda ciência. É preciso estar no coração da coisa. Não pode estar descolada do combate à fome, aos impactos do aquecimento global sobre as populações mais pobres e vulneráveis ou a questão das barragens, por exemplo. Para que isso de fato aconteça, não basta reunir cientistas e estudiosos sobre o tema; é preciso que os movimentos sociais que lidam cotidianamente como assunto estejam presentes, e não apenas na Conferência, mas também no desenho, no monitoramento e na avaliação do Plano.

O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, em boa parte graças às ciências, e temos mais de 30 milhões de pessoas passando fome! O que têm a dizer sobre isso aqueles e aquelas que, de fato, alimentam a população brasileira? Continuaremos fazendo interlocução apenas com a “agro nada pop”, com a CNI e seus lobistas (inclusive na comunidade acadêmica), ou traremos de fato o movimento sindical e social para discutir os sentidos das coisas no mundo (e do mundo), entre elas as ciências, as tecnologias e inovação?

Sei que este é um grande desafio; mas, Senhora Ministra, pelo que tenho ouvido a seu respeito (e da sua própria boca), acredito que, como muites brasileires, também considera que, nos tempos em que vivemos, “matar um leão por dia tem sido fácil; o difícil tem sido fugir das antas!” (óbvio que “matar um leão” por dia está no sentido figurado!). Sigamos, pois!

Sobre o autor
Pesquisador IA do CNPq e ex-Membro do Conselho Deliberativo do CNPq.

Nota
O texto originalmente foi publicado aqui.


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