A atratividade da carreira do professor

Prof. Dr. Roque Lucio

A partir de um estudo feito pelo Instituto Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior), o qual projeta que, se for mantido o ritmo atual de formandos em cursos de licenciatura, a educação básica do país pode enfrentar um déficit  de 235 mil professores em 2040. Fiquei incomodado com esta previsão, por isso achei que é meu dever refletir sobre o assunto de forma propositiva. Chamo a atenção, pois 2040 está logo aí. Informo que o artigo, por questões jornalísticas, será desmembrado em Atratividade da Carreira do Professor I  e  Atratividade da Carreira do Professor II.

Discutir os fatores ligados à atratividade das carreiras profissionais em geral exige considerar as mudanças em processo no mundo do trabalho, nas tecnologias e nos contextos político, econômico, cultural e social. Desde a década de 1980, a sociedade vem passando por transformações que alteraram as formas e as relações de trabalho nos diversos campos profissionais. Vive-se uma conjuntura histórica permeada por um cenário de relações sociais e de trabalho complexo e contraditório, que tem introduzido uma nova compreensão de carreira e de desenvolvimento profissional.

A palavra carreira tem origem no latim medieval derivada da palavra carraria, que significava “estrada rústica para carros”. Com base nesse sentido inicial de “estrada”, simbolicamente passou, a partir do século XIX, a ser utilizada tal qual a conhecemos hoje: como trajetória da vida profissional, um ofício, uma profissão que apresenta etapas, uma progressão.

A profissão que o indivíduo escolhe é “[…] limitada por objetivos que vão desde as expectativas familiares até o que existe de mais viável dentro da sua realidade, sendo, muitas vezes, até contraditório com seus desejos e possibilidades pessoais” (LISBOA,2002,p. 44). A escolha profissional leva em conta as perspectivas de empregabilidade, renda, taxa de retorno, status associado à carreira ou vocação, bem como identificação, autoconceito, interesses, habilidades, maturidade, valores, traços de personalidade e expectativas em relação ao futuro.

A literatura disponível na área da formação de professores tem analisado questões que, direta ou indiretamente, mantêm relação com a discussão sobre a atratividade da carreira do professor, como a massificação do ensino, a feminização no magistério, as transformações sociais, as condições de trabalho, o baixo salário, a formação docente, as políticas de formação, a precarização e a flexibilização do trabalho docente, a violência nas escolas, a emergência de outros tipos de trabalho com horários parciais.

No cotidiano da escola, o professor, para desenvolver sua atividade de ensinar, precisa lidar com problemas de disciplina e violência, com a falta de interesse dos alunos, com a necessidade de trabalhar com um número maior de alunos e desenvolver sua tarefa educativa para a diversidade. Há ainda a introdução das tecnologias de ensino no trabalho docente, que produzem mudanças na relação com o conhecimento, gerando a sensação de obsolescência em muitos profissionais da educação. A atividade docente tem se tornado cada vez mais complexa, porém o prestígio social da profissão docente tende a diminuir, gerando a sensação de impotência, frustração e desânimo.

Além disso, do lado dos jovens, como a experiência que vivem na escola parece estar muito distante da sua realidade cotidiana – a escola muitas vezes é “chata”, desestimulante –, pode-se levantar aqui a hipótese de que tal vivência não produza o desejo de construir uma carreira dentro desse espaço. Sem mencionar o fato de que hoje há uma série de profissões ou atividades mais motivadoras no momento da escolha profissional. Em outras palavras, a docência pode não ser atraente não apenas em função de fatores próprios a essa carreira, mas também pela possibilidade aberta por inúmeras outras ocupações.

Jesus (2004) considera que a imagem social do professor em declínio pode estar ligada à alteração do papel tradicional dos professores no meio local, ou seja, a escola está deixando de ser o principal espaço de acesso ao conhecimento e um meio de ascensão econômica e social para certas camadas sociais. Ele também chama a atenção para o fato de a profissão docente ter se tornado pouco seletiva. Muitas pessoas exercem a docência sem formação específica e preparo profissional ou com preparo precário. Essa situação contribuiu para a base do estereótipo de que “qualquer um” pode ser professor. Essa ideia de “qualquer um” traz implícito o significado de desqualificação. Ainda muitos ingressam na docência de forma transitória. Dito de outra forma, a escolha não se deu como forma de realizar um projeto previamente estabelecido, e sim como uma alternativa profissional provisória, ou a única viável em determinado momento, o que pode redundar em descompromisso, contribuindo para uma imagem social de profissão secundária. O próximo artigo vai tratar das propostas para melhorar a atratividade da carreira de professor.


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