O 15 de Outubro, as Professoras e a Pandemia

Editorial da edição nº 295 do Jornal Pensar a Educação em Pauta

No próximo dia 15 comemoraremos o Dia da Professora, ainda que a língua e política nos traiam e o dia apareça, nos calendários,  como sendo do Professor ou dos Professores, mesmo que numa profissão majoritariamente feminina. E, não custa lembrar, é o Dia da Professora da Educação Básica já que, engolidos por uma tradição elitista e de menosprezo pela docência, os professores do ensino superior não consideram o dia como sendo, também, seu.

O Dia da Professora sempre foi, historicamente, momento de congratulação societária, sobretudo das elites políticas, para com a classe. Abundam os elogios, os reconhecimentos e as amáveis palavras, ainda que, sub-repticiamente ou não, na calada da noite ou em plena luz do dia, os mesmos sujeitos atuem para retirar direitos da categoria e para dizer que, no Brasil, quem escolhe a docência é quem não deu para outra coisa melhor, como disse recentemente o nosso Ministro da Educação, numa infinita atualização dos discursos da elite escravista do século XIX.

Agora mesmo, no momento em que nos preparamos para comemorar mais um Dia das Professoras, coisas paradoxais acontecem: por um lado, não são poucas as vozes que se levantam para dizer o quanto o professorado brasileiro tem contribuído para diminuir o impacto da crise entre as crianças e adolescentes brasileiros por meio da mais diversificada e capilar rede de proteção a estes sujeitos – por meio do acompanhamento diário, da escuta, da oferta do conforto e do cuidado –. Enquanto isso, muitos governadores se mobilizam, e mobilizam seus aliados no campo político e empresarial, para retirar direitos historicamente reconhecidos e consagrados á categoria.

Mas não é apenas isso. Enquanto no campo da saúde há uma multidão a clamar que o Ministério da Saúde, as políticas e ações da área, devem ser conduzidos pelos profissionais da saúde, no campo da educação o investimento tem sido justamente o contrário: a defesa de que as professoras da educação básica não têm conhecimento e nem autonomia para decidirem ou, ao menos, participarem das discussões sobre os desafios, perigos, medos e soluções envolvidos no retorno às aulas presenciais.

O que se observa, ainda, é que, mesmo com o Brasil ultrapassando as 150 mil mortes causadas pela COVID-19, há gente que encontra fatos positivos em tamanha tristeza. E uma dessas coisas boas, dizem alguns, é como as professoras estão se virando para aprender a lidar com as novas tecnologias. Polianamente, ou conscientemente, esquecem os arautos dessas boas novas que em tamanha tragédia, em boa parte causada pelos partidários das políticas de morte, não há como achar fatos positivos.

É mesmo difícil de acreditar que há gente séria que considere o “aprendizado” para lidar com as tecnologias, ocorrido em meio á crise econômica, ao medo, à apreensão, à perda de direitos e ao aumento das desigualdades escolares, sociais e econômicas, seja algo positivo. A falta de empatia grassa e tem enormes consequências políticas.

Ao invés de falarmos dos processos de formação e entoar loas a importância da profissão, poderíamos seguir a sugestão do Presidente da Província de Minas Gerais,Carlos Carneiro de Campos que, lá nos idos de 1858, dizia:

“Adestremos os candidatos ao professorado nas materias que deverão ensinar um dia, por meio de ensaios theoricos e praticos onde exhibão provas de instrucção moral, e religiosa, onde se preparem com as dispensaveis luzes da leitura, calligraphia, dos diversos systhemas de orthographia, princípios da grammaticaportugueza, e nos da Pedagogia.Acompanhada da elevação dos vencimentos de maneira a convidar e a reter na carreira um pessoal intelligente e digno da honrosa profissão do magisterio, accredito que esta medida produzirá entre nós os sasonadosfructos, que outros paizes, ondeforãoaquellas instituições bem comprehendidas e sinceramente realisadas, vão logrando.”

Uma receita simples assim! E com mais de 160 anos!  Depois disso, podem até nos comparar com a Dinamarca, com a Finlândia e alhures e, é claro, entoar hinos e canções às professoras brasileiras que, mais do que ninguém, merecem as nossas maiores e melhores homenagens.

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O 15 de Outubro, as Professoras e a Pandemia

No próximo dia 15 comemoraremos o Dia da Professora, ainda que a língua e política nos traiam e o dia apareça, nos calendários,  como sendo do Professor ou dos Professores, mesmo que numa profissão majoritariamente feminina. E, não custa lembrar, é o Dia da Professora da Educação Básica já que, engolidos por uma tradição elitista e de menosprezo pela docência, os professores do ensino superior não consideram o dia como sendo, também, seu.

O Dia da Professora sempre foi, historicamente, momento de congratulação societária, sobretudo das elites políticas, para com a classe. Abundam os elogios, os reconhecimentos e as amáveis palavras, ainda que, sub-repticiamente ou não, na calada da noite ou em plena luz do dia, os mesmos sujeitos atuem para retirar direitos da categoria e para dizer que, no Brasil, quem escolhe a docência é quem não deu para outra coisa melhor, como disse recentemente o nosso Ministro da Educação, numa infinita atualização dos discursos da elite escravista do século XIX.

Agora mesmo, no momento em que nos preparamos para comemorar mais um Dia das Professoras, coisas paradoxais acontecem: por um lado, não são poucas as vozes que se levantam para dizer o quanto o professorado brasileiro tem contribuído para diminuir o impacto da crise entre as crianças e adolescentes brasileiros por meio da mais diversificada e capilar rede de proteção a estes sujeitos – por meio do acompanhamento diário, da escuta, da oferta do conforto e do cuidado –. Enquanto isso, muitos governadores se mobilizam, e mobilizam seus aliados no campo político e empresarial, para retirar direitos historicamente reconhecidos e consagrados á categoria.

Mas não é apenas isso. Enquanto no campo da saúde há uma multidão a clamar que o Ministério da Saúde, as políticas e ações da área, devem ser conduzidos pelos profissionais da saúde, no campo da educação o investimento tem sido justamente o contrário: a defesa de que as professoras da educação básica não têm conhecimento e nem autonomia para decidirem ou, ao menos, participarem das discussões sobre os desafios, perigos, medos e soluções envolvidos no retorno às aulas presenciais.

O que se observa, ainda, é que, mesmo com o Brasil ultrapassando as 150 mil mortes causadas pela COVID-19, há gente que encontra fatos positivos em tamanha tristeza. E uma dessas coisas boas, dizem alguns, é como as professoras estão se virando para aprender a lidar com as novas tecnologias. Polianamente, ou conscientemente, esquecem os arautos dessas boas novas que em tamanha tragédia, em boa parte causada pelos partidários das políticas de morte, não há como achar fatos positivos.

É mesmo difícil de acreditar que há gente séria que considere o “aprendizado” para lidar com as tecnologias, ocorrido em meio á crise econômica, ao medo, à apreensão, à perda de direitos e ao aumento das desigualdades escolares, sociais e econômicas, seja algo positivo. A falta de empatia grassa e tem enormes consequências políticas.

Ao invés de falarmos dos processos de formação e entoar loas a importância da profissão, poderíamos seguir a sugestão do Presidente da Província de Minas Gerais,Carlos Carneiro de Campos que, lá nos idos de 1858, dizia:

“Adestremos os candidatos ao professorado nas materias que deverão ensinar um dia, por meio de ensaios theoricos e praticos onde exhibão provas de instrucção moral, e religiosa, onde se preparem com as dispensaveis luzes da leitura, calligraphia, dos diversos systhemas de orthographia, princípios da grammaticaportugueza, e nos da Pedagogia.Acompanhada da elevação dos vencimentos de maneira a convidar e a reter na carreira um pessoal intelligente e digno da honrosa profissão do magisterio, accredito que esta medida produzirá entre nós os sasonadosfructos, que outros paizes, ondeforãoaquellas instituições bem comprehendidas e sinceramente realisadas, vão logrando.”

Uma receita simples assim! E com mais de 160 anos!  Depois disso, podem até nos comparar com a Dinamarca, com a Finlândia e alhures e, é claro, entoar hinos e canções às professoras brasileiras que, mais do que ninguém, merecem as nossas maiores e melhores homenagens.

 

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