Vacinas contra COVID-19 no Brasil: potencialidades e limites

Rômulo Paes1

Desde de dezembro do ano passado, a disponibilidade de vacinas para imunização da população do planeta colocou a Pandemia do COVID-19 em um novo estágio. A eficácia das inúmeras vacinas disponíveis para a prevenção da doença apresentam a possibilidade real de superação da doença. O monitoramento realizado pelo jornal The New York Times apontava que em, 18 de março de 2021, 13 vacinas estavam em uso em algum lugar do planeta, sendo 7 aprovadas em registro definitivo e 6 em uso emergencial. A caminho, teríamos ainda 22 em fase 3 de testagem e 72 outras vacinas em estágios iniciais. Certamente, a enorme capacidade de produção de vacinas em um período tão curto é possivelmente o legado mais positivo da pandemia.

Esta exuberância em capacidade tecnológica revela também a grande desigualdade existente em todo planeta. Apenas 4 países ou blocos monopolizam o estoque global de vacinas em todo mundo. A União Europeia contratou o número de doses suficientes para vacinar o dobro de sua população. O Canadá possui contratos suficientes para atender 5 vezes a sua população e os EUA contrataram 50% a mais. No reverso da medalha, países como Mali e Sudão esperam vacinar até 60% de suas populações em 2024.

Diante do panorama global, é grande a curiosidade de se entender como está a oferta de vacinas no Brasil. Em 18 de março de 2021, 3 vacinas já possuíam autorização para uso no Brasil, quais sejam: Pfizer/BioNTech e Oxford/Fiocruz (com registro sanitário definitivo) e CoronaVac/Butantan (em uso emergencial). Os representantes desta última ainda não solicitaram o registro sanitário definitivo frente ao citado órgão regulador. A vacina Sputnik V/União Química está sob apreciação da ANVISA para uso emergencial. Representantes das vacinas Johnson&Johnson/Janssen e Covaxin/Precisa Medicamentos estão em contato com a ANVISA para melhor compreender o processo de registro de seus produtos para uso emergencial. Esperam-se que ambas venham em breve solicitar autorização para uso emergencial.

Neste breve exercício comparativo, utilizou-se o modelo proposto por Wouters e cols., adaptado para o contexto municipal brasileiro. As variáveis estão assim dispostas: i) desenvolvimento e produção (autorização frente a ANVISA, eficácia vacinal após a fase 3, produção global estimada para 2021), custo (menor preço observado no mercado internacional em USD), administração da vacina (número de doses e requisitos de temperatura para estocagem durante o transporte). Note-se que a comparação de eficácia vacinal deve ser considerada com reservas devido às diferenças metodológicas empregadas nos ensaios clínicos realizados pelos desenvolvedores das diversas vacinas. 

A Tabela 1 apresenta a descrição das vacinas que estão ou que em breve estarão disponíveis para uso no Brasil. As vacinas Pfizer/BioNTech e Oxford/Fiocruz levam uma grande vantagem por já terem autorizado seu uso definitivo. Esta condição permite que seja aplicada em toda população adulta e em qualquer período. Também, poderão ser ministradas pelo setor privado, caso este venha a dispor destas vacinas. As de uso emergencial possuem diversas limitações quanto ao seu uso. As vacinas observadas possuem um volume de produção global prevista, cuja escala permite a oferta que seus representantes têm feito no Brasil. Todas as vacinas observadas, com exceção da Covaxin/Precisa apresentam eficácia vacinal com níveis preconizados pela Organização Mundial de Saúde, que é de 50%. Contudo, há grande variabilidade entre elas, sendo a Pfizer/BioNTech apresentou maior eficácia em seus testes (95%), enquanto a CoronaVac/Butantan se encontra na condição oposta (51%). Há uma grande variabilidade no preço das vacinas observadas. As de maior preço no mercado internacional são CoronaVac/Butantan (21 USD) e Pfizer/BioNTech (14 USD). Na outra ponta, estão Oxford/Fiocruz (5 USD), Covaxin/Precisa e Sputnik V/União (ambas a 6 USD). Apenas a Johnson&Johnson/Janssen permite a imunização com apenas uma dose. Em relação a logística de distribuição, as vacinas Pfizer/BioNTech e Sputnik V/União apresentam requerimentos que são menos compatíveis com a cadeia fria geralmente disponível nos municípios brasileiros. 

As dificuldades apresentadas pelo Brasil nesta etapa inicial de imunização não correm por falta de alternativas no mercado. Também não decorrem da falta de experiência com programas eficazes de vacinação. O governo federal tem falhado ao não realizar uma política de aquisição de vacinas de forma ampla, oportuna e pragmática. Alguns países que tiveram mau desempenho no controle da pandemia em 2020 estão se saindo bem ao realizar programas acelerados de imunização. Notavelmente, Israel, EUA, Reino Unido e Chile, marcham para efetivarem a cobertura de suas populações em breve. 

O Brasil que tem errado bastante na detecção dos casos, isolamento dos infectados, quarentenas, uso de máscara, distanciamento social e tratamento dos casos, precisa começar a acertar. Para isso, precisa ser agudo na decisão e efetivo na mobilização de suas competências. Do contrário, teremos um manejo do segundo ano de pandemia tão fracassado como o primeiro.

1Pesquisador da Fiocruz Minas

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Este texto integra uma parceria entre o Pensar a Educação, Pensar o Brasil 1822/2022 e o Instituto René Rachou (Fiocruz) para promover ações e reflexões em torno da Educação para a Saúde.

 

Para saber mais:

Zimmer, C., Corum, J. and Wee, SL. Coronavirus Vaccine Tracker. The New York Times. March 18, 2021.

Wouters, O. J., Shadlen, K. C., Salcher-Konrad, M., Pollard, A. J., Larson, H. J., Teerawattananon, Y., & Jit, M. (2021). Challenges in ensuring global access to COVID-19 vaccines: production, affordability, allocation, and deployment. The Lancet.

Voysey, M., Clemens, S. A. C., Madhi, S. A., Weckx, L. Y., Folegatti, P. M., Aley, P. K., … & Oxford COVID Vaccine Trial Group. (2021). Single-dose administration and the influence of the timing of the booster dose on immunogenicity and efficacy of ChAdOx1 nCoV-19 (AZD1222) vaccine: a pooled analysis of four randomised trials. The Lancet.


Imagem de Destaque: MasterTux/Unsplash

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