Universidade Rediviva na Sociedade do Conhecimento – Parte I – O que foi feito

Antonio Teixeira

O sistema educacional brasileiro tem a base fincada no racionalismo cartesiano (René Descartes, 1596-1600) e o conhecimento foi dividido em fatias diminutas. Entranhado na estrutura didática-pedagógica das escolas o método antigo reduziu a aprendizagem à busca de uma verdade primeva, nos limites da razão e da lógica do passado, sem o pressuposto de dúvida. O avanço das ciências na sociedade do conhecimento do século XXI requer a desconstrução do modelo cartesiano e uma urgente reorganização de todo sistema educacional. Flexibilização de currículos e novos métodos de ensino devem ser empregados para a construção do saber de interesse social. A universidade deve potenciar a capacidade de experimentar, desenvolver e compartilhar a melhor didática para o sistema educacional. As ideais postas neste artigo apontam as dificuldades e sugerem caminhos para a inovação didática e a construção de conhecimento novo.

O Brasil colônia, no contexto histórico de quatro séculos de ensino privado excluiu a possibilidade de matrícula de negros e pobres. O ensino superior existia em unidades isoladas, tais como Faculdade de Medicina da Bahia, e a Faculdade de Direito de Recife, respectivamente, criadas em 1808 e em 1827. Por lá passaram jovens brancos nascidos pobres (José Maria Paranhos, Raimundo Nina Rodrigues, Afrânio Peixoto, Clementino Fraga e Pedro Calmon) e, também, alguns negros (José do Patrocínio, Joaquim Nabuco, Luiz Gama, Juliano Moreira e Teodoro Sampaio) que se tornaram expoentes da cultura brasileira.

Cenário atual

Muito foi feito em 80 anos, pois a inteligência humana posta em benefício da sociedade tem conseguido superar algumas dificuldades oriundas do passado. Para minorar a escassez de docentes qualificados foram criados o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep), a Coordenação para Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)  e o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), para promover o desenvolvimento de pesquisas científicas de interesse social, nas universidades públicas e nos institutos, e, também nas melhores  universidades privadas de cunho religioso ou laico. Foi criado o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) com diversos programas para fomentar a pesquisa, novas tecnologias e inovação para o desenvolvimento do País. Um passo adiante na capacitação de recursos humanos para o ensino público e privado foi a criação de Programas de Pós-Graduação em níveis de mestrado, de doutorado, e de pós doutorado (Capes). Além disso, foi criado Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Básico e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb).

Ensino fundamental

Tem havido melhoria do ensino fundamental no primeiro e segundo graus, desde a criação do Fundeb e da ajuda do Governo Federal aos Municípios. Com isso as escolas renovaram o aspecto físico e as condições de funcionamento com corpo docente e administrativo profissional. Ao visitar municípios no interior do Brasil, verifica-se a boa paisagem onde os alunos com uniforme escolar são recolhidos em suas casas nos vilarejos, nas glebas e nas fazendas por ônibus escolar que os leva para a escola e os retorna ao meio dia. A merenda escolar é um estímulo à frequência as aulas. Todavia, ainda não foi universalizado o ensino integral com horário de 8 às 16 horas, com atividades teóricas e práticas.

O calcanhar de Aquiles do ensino fundamental é o baixo salário pago ao professor, e, em consequência, muitos docentes dizem estar desestimulados porque ensinam os filhos dos outros, mas não têm condição de educar seus próprios filhos. E ainda há necessidade de aperfeiçoamento contínuo do professor que ao longo da carreira jamais alcançou a oportunidade de atualização em novos métodos de autoaprendizagem. Ademais, com a criação dos conselhos de pais, o professor perdeu a autonomia de avaliação do discente e lhe foi retirada a possiblidade de reprovação do aluno sem rendimento escolar. Atos de vandalismo são frequentes e os professores se sentem inseguros e temerosos.

A excelência da didática no ensino fundamental é essencial para abertura da mente do aluno que adentra a universidade, portanto, crucial para a geração de conhecimento novo.

Para aprimorar a didática haverá necessidade de ciclos de aprimoramento periódico de professores em escolas experimentais onde são preparados para trabalhar com os colegas no ambiente que potencia o cérebro dos jovens a expor suas ideias com liberdade para cultivar a dúvida. O espírito livre no cérebro de jovens é a melhor semente para germinar e construir conhecimento.

Vestibular

O vestibular está na contramão da sociedade que produz conhecimento. A seleção de alunos pela capacidade de responder perguntas de prova. Este sistema avalia a capacidade do jovem decorar a matéria ensinada para responder perguntas sobre o conhecimento pregresso, por exemplo, as velhas fórmulas da física newtoniana que já foram superadas pelo conhecimento novo. Sob repressão, o aluno fica longo período sentado diante de professor com notável habilidade de repetir o mesmo conteúdo em muitas salas de aula ao longo de meses a fio.

Jamais esse vestíbulo de ensino será capaz de identificar o jovem com inteligência emocional, com autonomia de aprendizado e com capacidade de fazer perguntas que suscitam dúvidas. Um aluno que exige resposta consistente para uma pergunta sobre fenômeno da natureza não descrito na apostila, poderá ser desencorajado. Ao invés de dizer que a resposta para a pergunta precisa ser investigada por todos, não se avança conhecimento e perde oportunidade de estabelecer relacionamento empático que potenciliza o interesse dos colegas de estudo. Há necessidade de flexibilizar o protagonismo do conhecimento em uma atmosfera de amizade e solidariedade. Na ausência de empatia o ensino sofre de anomia didática.

Ensino superior

Há apenas 80 anos o Estado Novo, comandado por Getúlio Vargas, reuniu as escolas isoladas, criou a Universidade Federal do Rio de Janeiro e decretou o ensino laico. Em seguida, as escolas isoladas de ensino superior foram reunidas nas Universidades Federais em cada Estado do Brasil. Inicialmente, a coragem de assinar os atos de criação das universidades e, também, a ousadia de disponibilizar recursos para a estrutura física nos Campi era ideia no papel.

As dificuldades materiais têm sido resolvidas gradualmente. Porém, o provimento de recursos humanos requer planejamento permanentemente ajustado para obtenção da excelência da produção e da transmissão do conhecimento. Entretanto, a questão didático-pedagógica tem sido posta a reboque da necessidade de contratação do corpo docente, talvez, à montante da produção de conhecimento inovador com potencial para gerar novas tecnologias e qualidade de vida.

Corpo docente

Os primeiros docentes das universidades públicas foram oriundos do ensino eclesiástico provido em escolas privadas ou publicas isoladas. Evidentemente, os docentes ensinaram apenas o que aprenderam nas escolas secularizadas. Foram contratados alguns professores estrangeiros, quando disponíveis. A Capes e o CNPq tiveram papel importante na capacitação técnico-científica de docentes pesquisadores com a disponibilização de bolsas de estudo em universidades de países com pesquisa e contribuição ao conhecimento.

Didática

No sistema educacional brasileiro a didática tem base na autoridade do professor na sala de aula. Atualmente, o modelo vertical de ensino segue currículos para cada área de conhecimento. O regime disciplinar privilegia a autoridade e o respeito à ordem universal da fé professada. O método de ensino que privilegia aula expositiva, unidirecional, deixa o aluno como espectador passivo que pergunta apenas quando não entende a exposição. Via de regra, não há abertura para o aluno revelar dúvida e questionar para além da ordem vigente, pois pode ser considerada falta grave ou desrespeito; aluno com dúvidas e perguntas pode ser reprovado. O pupilo subjugado apenas presta atenção, procura entender e decora o assunto para responder perguntas de prova dentro do limite da aula do professor. Os alunos queixam-se de opressão e de estresse causado pelo desconforto de decorar assunto de prova. O mal estar evolui com ansiedade e depressão, fatores que dificultam a apreciação da beleza do conhecimento.


Imagem de destaque: Hedeson Alves/ ANPr

 

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