Carta de um aluno ao seu professor

Ivane Laurete Perotti

 

Professor, decidi escrever uma carta para você, já faz muito tempo. Eu não sabia como iniciar, daí esperei até agora. Então, vou começar dizendo que passo mais tempo com você aqui na escola do que passo com os meus pais. Eles também são professores e quando chegam em casa, têm as coisas da escola deles para fazer. Eu tenho as tarefas da minha escola e a gente quase não consegue conversar. Tenho pensado em você e em meus pais. Já desejei ser professor. Mas agora, isso ficou no passado, no tempo em que eu era criança. Eu não sei o que eu quero ser. Ainda não sei o que fazer da minha vida profissional e o ENEM está chegando, né? Não tenho problemas em casa. Vivemos com os meus avós e uma de minha tias. Kkkkkkkkkk ela é professora, quase se aposentando. A minha avó gosta muito de ler e foi ela que sempre me ajudou com os para-casa. (tem hífen? Desculpa aí, eu não sei). Acho que ela desejava ser professora, mas não conseguiu estudar. A minha infância foi bem normal, sabe? Então, não tem nada de errado em minha vida, entende? É tudo normal. Às vezes sou alegre, às vezes fico triste. Acho que sou normal, né? Mas daí eu fico pensando se é normal eu me sentir assim, com tantas coisas acontecendo ao meu redor. Queria fazer umas perguntas e não sei para quem perguntar. Daí veio você na minha cabeça. Não sei se você vai querer responder, né? Tudo bem! Eu entendo que você também não deve ter tempo, do mesmo jeito que os meus pais não têm. Kkkkkkkkkkk Então, eu tenho pensado muito, sabe? Muito mesmo! E, uma das coisas que eu queria saber é se você poderia ser o meu correspondente. Esse projeto das cartas que você criou é muito bom, pois eu descobri que gosto de escrever, mas não quero contar para os meus colegas as coisas que ficam batendo nas paredes de meu célebro (acho que errei a palavra, não lembro como se escreve… mas você entendeu, né?). Vou fazer 14 anos em julho, não esqueça! Kkkkkkkkkkk Sem festa, porque o dinheiro lá em casa tá curto. Mas eu quero presentes e, um deles, seria você me responder esta carta. Sabe as perguntas que quero fazer? Então, as suas respostas seriam o meu presente. Olha, não precisa ser muita coisa, mas se você responder, eu vou pensar que sou normal mesmo. Por que esta é a primeira parte: se eu sou normal, e não tenho problemas em casa, porque eu estou com uma coisa me apertando por dentro? Eu não sei explicar. Olho ao redor e sinto algo que me deixa irritado, inquieto e ao mesmo tempo silencioso. Nada a ver com tristeza, entende? É uma coisa, assim… está aqui, feito uma bola de futebol que bateu na boca do estômago. Parece que, às vezes, ela aumenta de tamanho e eu quase explodo. Nessas horas eu quero sair correndo e não quero ver ninguém. Acho que quero gritar, e nem sei o que dizer. Outras vezes, essa coisa fica paradinha. Dou muitas risadas do lado de fora, mas a coisa não sai daqui, parece que fica me olhando rir e diz assim: seu mentiroso! Você tá rindo e não sabe o motivo. Bobão! Mentiroso! Fingido! É meio louco isso, né? Mas é a verdade e eu não sei o que fazer com ela. Não tô doidão, viu? Não uso nadinha, tá? Eu tô e não tô de boa, entende? Eu acho que é uma coisa boba, mas e se não for? E se eu estiver doente? Será que sou um daqueles alunos que faz violência na escola? Como vou saber? Eu nunca fui de brigar, né professor. Mas e se essa violência veio comigo? E se ela estiver dando sinal dentro de minha cabeça? E se eu machucar alguém? Pode acontecer? Será que estou com raiva e não sei? Também tem horas que fico tão apertado aqui dentro que eu quero chorar. Daí, é pior, porque eu acabo sendo grosseiro com quem estiver perto. Isso é normal? Você já sentiu essas coisas? Se você não quiser responder vou entender. Essa é a carta que faz muito tempo eu quero escrever para você. Você pode se corresponder comigo e me dar algumas respostas? Ah! Não me manda fazer terapia, tá? A minha mãe ficaria louca e meu pai não iria saber de onde tirar o dinheiro. kkkkkkkkkkkkkkkkk até vejo a cara de minha mãe dizendo: Meu filho está doente? Está com depressão? Está usando drogas?? Não estou, né? Me diz se eu sou normal, professor? Abraço de seu aluno Fulano de Tal.

*A escrita acima, realizada por um aluno do ensino médio, em uma escola pública de Belo Horizonte, representa o perfil temático de correspondências que normalmente chegam às mãos dos professores.

Pergunta: qual o papel do professor?


Imagem de destaque: Siora Photography / Unsplash

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