Subjetividade e Objetividade na Pedagogia

Marcos Borges dos Santos Júnior

A Pedagogia é um campo vasto para se pensar nas múltiplas formas de existências acerca do “ser” e como se prescrever no “mundo vivido”. Alguns teóricos, como Thomas S. Kuhn (2018), aparentavam visar a pedagogia a partir do tecnicismo, desconsiderando a criticidade da constituição pedagógica. Porém, outros teóricos, vide Paulo Freire (2021; 2019), entendiam o compromisso do campo pedagógico como a formação da práxis “humana” de acordo com sua realidade. Seja como for, a pedagogia se aprofundava nas diversas perspectivas de ensino/aprendizagem que compreendia o “humano” como elemento central.

Se a pedagogia propusera refletir objetivamente o “humano” para determinados fins, as outras possibilidades de “ser” (no que tange outras formas de existência) se deslocaria para o campo do “subjetivo”. Neste contexto, a objetividade se legitima como hegemonia, enquanto a subjetividade é marginalizada e transformada em anômala. “Aquilo” que a objetividade não sabe explicar ou enquadrar, ela tende a desconsiderar e reprimir.

Uma pergunta vem à tona: “O que isto significa para a pedagogia?”. As pulsões inerentes ao pensar, fazer e “ser” destituídas a primazia da objetividade, são condicionadas à marginalidade ou desvalorizadas. Para melhor entendimento utilizemos como exemplo o “ensino a distância”. O “ensino a distância”, termo com frequência utilizado para designar uma comunicação/educação tecnologizado do bios virtual inerente à condição “humana” (SANTOS JUNIOR, 2021), pressupõem uma rede de objetividades preexistentes acerca do uso para o sujeito: a tela (computador, celular, notebook, etc); o domínio técnico (o uso do instrumento); a internet; a manutenção; etc. Qualquer desvio de tais objetividades (outro término aceito até determinado ponto seria “condições”) por mais elementares que sejam implicaria numa subjetividade do “ser” em crise contra a hegemonia.

O “ensino a distância”, a partir dos aparatos da pedagogia, vai de acordo com os estudos de Muniz Sodré (2014) ao relatar sobre o bios virtual no campo comunicacional/educacional.

Tal colonização consistiria no domínio da vida social por dispositivos linguísticos ou simbolicamente esvaziados (poder burocrático, mercado, dinheiro). Daí, consistir o seu agir comunicativo num trabalho de reelaboração racional dos discursos, em busca de compreensão e entendimento mútuo, com vistas à renovação do saber cultural e à maior integração social. Este seria o trabalho de uma ética do discurso, também chamada de ética comunicativa, por ter como pressuposto o conceito de comunicação (SODRÉ, 2014, p. 269).

O “ser” constituído de comunicação/educação é recortado e transferido tal parte a tecnologia. De modo sucinto, é possível afirmar que o sujeito, no contexto do “mundo tecnologizado”, só é “humano” na sua totalidade se possuir tais aparatos tecnológicos. Possuir aparatos tecnológicos pode ser traduzido, na sua objetividade, em “ensino a distância”. Se a princípio é possível categorizar como um limite de “ser”, também é possível caracterizar como possibilidade e potência.

“Ser” não é síntese de objetividade, mas uma totalidade do espaço/tempo aderido ao “mundo vivido” (HEIDEGGER, 2015). O “ser” é indescritível, pois o discurso pela percepção do “eu” e do/pelo “outro” não abarca todas as complexidades inerentes propriamente ao “ser”. A hegemonia da objetividade que tenta cotidianamente nos enquadrar, pulsiona em outras táticas e estratégias de resistência. Voltemos às redes da objetividade como exemplo. O sujeito que não conhece a técnica pode subverter pedindo auxilio do “mundo vivido”; a falta da tela como porta para o bios virtual ou a internet se converte em políticas públicas de inclusão, vide a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que a partir da pandemia da COVID-19 desenvolveu um programa de entrega de chips com internet e tablet para os estudantes socioeconomicamente vulneráveis, assim auxiliando no “ensino a distância”.

Para não me estender mais, os limites do “ensino a distância” podem ser impulsionados pela objetividade da Pedagogia, mas, por outro lado, podem abrir brechas para possibilidades de subjetividades no qual demonstram uma potência revitalizadora. Nesta tentativa de demarcar os limites da objetividade e da subjetividade no campo pedagógico, devemos refletir sobre as formas de nos concebermos a nós mesmos.

Para saber mais
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 79. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021.

_______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 59. Ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2019.

HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução revisada e apresentação de Marcia Sá Cavalcante Schuback; posfácio de Emmanuel Carneiro Leão 10. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco, 2015.

SANTOS JUNIOR, Marcos Borges dos. Algumas considerações sobre uma escola afrocentrada: (re)pensando a noção de identidade. Ensaios Filosóficos, Volume XXIII, 2021. p. 165-185. Acesse aqui.

SODRÉ, Muniz. A ciência do comum: notas para o método comunicacional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 13. Ed. São Paulo, 2018.


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