Quem tem medo de ler poesias?

Alexandre Azevedo

No Brasil, o livro menos vendido é o livro de poesias. Quando uma obra poética alcança a sua 2ª edição (em nosso país, a tiragem média é 2.500 exemplares), ela já pode ser considerada um “best-seller”! Infelizmente é assim. O que mantém os nossos grandes poetas em evidência é a lista dos vestibulares. Se não fosse ela, os seus livros estariam mofando nas prateleiras de nossas livrarias. Poucos também são os editores que investem em jovens poetas. Se já é difícil vender os consagrados, imaginem só os novatos! Quando uma editora publica uma obra de um jovem poeta, há que se considerar esse editor um herói (para muitos, não passa de um louco ou de um idealista, um verdadeiro Dom Quixote das letras!). Talvez por isso, o brasileiro não seja um leitor de poemas. Para muitos especialistas, a poesia é a “menina dos olhos da literatura”, sem ela, a poesia, o que seria da literatura? Já pensou a literatura de língua portuguesa sem um Camões, sem um Gregório de Matos, sem um Bocage, sem um Tomás Antônio Gonzaga, sem um Almeida Garrett, sem um Gonçalves Dias, sem um Castro Alves, sem um Antero de Quental, sem um Olavo Bilac, sem um Cruz e Sousa, sem um Fernando Pessoa, sem um Manuel Bandeira, sem um Carlos Drummond de Andrade, sem uma Cecília Meireles, sem um Manoel de Barros? Não consigo nem imaginar!Mas voltemos à questão da leitura: ler poesia requer algo a mais, pois não é fácil “entender” o que poeta quis dizer, já que a poesia é, de certa maneira, a expressão dos seus sentimentos e, lógico, o leitor não estava ao lado do poeta quando ele escreveu aquela poesia para saber o que realmente ele estava sentindo, não é mesmo? Mas isso não é motivo para não ler poesias. Quanto mais você as ler, mais requintada será a sua interpretação! E não se preocupe se a interpretação da poesia que você acabou de ler for diferente da interpretação de um outro leitor. Aí está a magia de um texto poético: a diversidade de interpretações! Um dos maiores poetas contemporâneos do Brasil, Manoel de Barros (1916-2014) disse, com muita propriedade: “a poesia não é para compreender, mas para incorporar”. Em nossas escolas, há uma espécie de supervalorização da prosa em detrimento da poesia. Nas aulas de redação, geralmente o texto a ser elaborado é em prosa. Mas um aluno não pode – citando aqui, as três categorias mais comuns de uma redação – dissertar ou descrever ou, ainda, narrar em verso? É claro que pode! Nada o impede disso. Entretanto, ao se deparar com o ENEM e com os vestibulares, estará na prova de redação um recadinho: “Faça a sua redação em prosa”. Portanto, não posso redigir meu texto em verso, é expressamente proibido. Talvez por isso, a poesia seja menos “consumida” por nós, será? E quando o aluno chega para fazer o seu vestibular, encontrará nas famigeradas listas de vestibulares uma quantidade maior de textos em prosa (romances e contos, principalmente) e um número reduzidíssimo de textos em verso (um livro, dois no máximo). Citando aqui Caetano Veloso (1942), autor da maravilhosa “Língua”, E sei que a poesia está para a prosa / Assim como o amor está para a amizade / E quem há de negar que esta lhe é superior? Será, então, que o brasileiro tem medo de ler poesias? Talvez. Talvez tenha medo de não interpretar de maneira coerente, como já foi dito anteriormente, o que poeta desejou passar. Esse medo só vai passar se deixar essa tolice de lado. Não é raro um poeta se espantar ao ver uma interpretação que jamais havia passado por sua cabeça e dizer para si: “não é que isso também faz sentido?”. Poesia, definitivamente, não é nenhum bicho-de-sete-cabeças. Que tal pensar que a poesia seja sim um bicho, mas um bicho-de-sete-interpretações ou mesmo de… infinitas?!


Imagem de destaque: Pxfuel

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