Projeto Reconectando vidas: a integralidade do cuidado em saúde em cena

Rose Ferraz Carmo

Heliana Conceição de Moura

Larissa Cecília dos Santos

Rafael Sann Ribeiro

Zélia Profeta da Luz

A compreensão do cuidado em saúde como uma conformação humanizada do ato assistencial, uma atenção à saúde imediatamente interessada na vivência do indivíduo com o adoecimento e também interessada nas práticas de promoção, proteção e recuperação da saúde (Ayres, 2004), desloca a centralidade do encontro usuário x profissional de saúde, de uma dimensão técnica preocupada com o tratamento de uma doença ou acompanhamento clínico de uma situação de saúde, para uma dimensão relacional de escuta, compartilhamento de vivências e construção conjunta de diferentes estratégias para a melhoria da saúde. 

Uma forma de produzir essa compreensão sobre o cuidado em saúde é ressignificar, no cotidiano dos serviços de saúde, o acolhimento dos usuários. 

O acolhimento entendido como tecnologia leve por ser baseado na construção de processos relacionais – entre gestores e trabalhadores, trabalhadores e usuários – (Merhy e Feuerwerker, 2016), assim como o vínculo, apesar de amplamente difundida em normatizações do Ministério da Saúde, incluindo a Política de Humanização em Saúde, ainda não se efetivou nos serviços de saúde e enfrenta desafios importantes.

Em um contexto epidemiológico que aponta para a permanência do HIV/AIDS como problema de saúde pública, é imprescindível o acolhimento às pessoas vivendo com HIV/AIDS (PVHA) desde o primeiro acesso aos serviços de saúde para a testagem. O acolhimento contribuirá para o compartilhamento de informações sobre prevenção combinada para Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST’s e o HIV, para a aceitação do diagnóstico, para a assistência e adesão ao tratamento, para o resgate à auto estima, para a emancipação e protagonismo dos pacientes.

Considerando a centralidade e importância dos movimentos sociais e organizações não governamentais para a elaboração de políticas públicas voltadas para o enfrentamento do HIV/AIDS no Brasil e para conformação de redes de apoio à PVHA, com reverberação direta no acolhimento dessas pessoas, construímos o projeto de pesquisa Reconectando Vidas. 

O objetivo do projeto é integrar e fortalecer redes de acolhimento à PVHA em Belo Horizonte e Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Para contemplar esse objetivo vamos realizar uma Pesquisa Ação. Essa abordagem metodológica encontra justificativa na dimensão social e histórica do objeto de estudo e na perspectiva de aliar teoria e prática por meio de uma ação que visa à transformação de uma determinada realidade.

O lançamento do projeto será realizado no dia 10 de julho de 2021 durante o Primeiro Seminário Reconectando Vidas: pessoas com HIV/AIDS em movimento. O seminário será amplamente divulgado para movimentos sociais, grupos de apoio, gestores e profissionais de saúde, comunidade acadêmica e sociedade civil.

As PVHA participantes do seminário serão convidadas a integrar o projeto e, para acessar outras PVHA, será utilizada a técnica de “bola de neve”onde cada PVHA que integrar o projeto indicará outra PVHA para participar do estudo.

Buscando contribuir com o sentimento de pertencimento ao grupo que estará reunido para pensar coletivamente uma temática que faz parte de suas vidas, vamos utilizar o formato de oficinas (Westphal, et.  al., 1996). Durante as oficinas o grupo será convidado a compartilhar vivências, experiências e percepções sobre o viver com HIV/AIDS; identificar potencialidades e fragilidades dos diferentes movimentos sociais, grupos etc.  na percepção de seus integrantes e elaborar estratégias para integração e fortalecimento das redes de acolhimento às PVHA. 

Para além do espaço coletivo de produção de sentidos que as oficinas conformam, o projeto propõe um espaço individual em que as PVHA serão convidadas a relatar, em formato de carta, suas vivências e experiências desde o momento do diagnóstico. A carta poderá ser endereçada ao próprio remetente, a pessoas públicas como artistas, ativistas, gestores entre outros, a pessoas do convívio familiar e social e até ao vírus. A nossa intenção é que as cartas sejam posteriormente organizadas em um livro.

Esperamos que o projeto coloque em cena o HIV/AIDS e a produção do cuidado em saúde com destaque para tecnologias leves como o acolhimento, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das PVHA as quais, passados mais de 40 anos desde a confirmação do primeiro caso da doença no Brasil, ainda enfrentam, cotidianamente, uma dupla epidemia, o vírus e o estigma.

As autoras e o autor são membros do Grupo de Pesquisa Saúde, Educação e Cidadania da Fiocruz Minas. 

 

Para saber mais: 

Ayres, JRCM. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde. Saúde e Sociedade, v. 13, n. 3, p. 16-29, dez. 2004. 

Merhy, EE; Feuerwerker; LCM. Novo olhar sobre as tecnologias de saúde: uma necessidade contemporânea. In: Avaliação compartilhada do cuidado em saúde. Surpreendendo o instituído nas redes. Merhy et al. (Org.). 1 ed. Rio de Janeiro: Hexis, 2016, 448 p.

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Este texto integra uma parceria entre o Pensar a Educação, Pensar o Brasil 1822/2022 e o Instituto René Rachou (Fiocruz) para promover ações e reflexões em torno da Educação para a Saúde.

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