Por uma mentalidade conservacionista: educação ambiental em Ângelo Machado

Nascido em Belo Horizonte, no ano de 1934, Ângelo Barbosa Monteiro Machado é um importante personagem mineiro. Formado originalmente em Medicina, nunca chegou a exercer a profissão, dedicando-se estritamente ao ensino e à pesquisa na área médica. Entretanto, falaremos aqui de um outro Ângelo, o ambientalista.

Desde muito novo, Ângelo gostava de bichos. Enquanto estudava neurobiologia, tinha como hobby o seu estudo sobre libélulas. Ao longo da vida, catalogou mais de uma centena de espécies. Sua preocupação com o mundo natural vem das vivências na fazenda de seu pai, como ele disse em uma entrevista à FAPESP, em 2007: “Ia à fazenda do meu pai, no Vale do Rio Doce, e gostava de coletar insetos, andar na mata e ouvir o canto do macuco ou do jaó. A cada ano tinha menos mata e menos bicho”. Desde então, passou a atuar em prol da defesa do meio ambiente quando entrou, em 1974, para o Centro para Conservação da Natureza de Minas Gerais, uma entidade ambientalista pioneira em Minas. Ângelo acredita que o desenvolvimento tecnológico trouxe uma série de problemas para o mundo biológico. Para que esse quadro fosse revertido, aponta a necessidade da criação de uma mentalidade conservacionista.

Influenciado pelo pensamento de Broad, Ângelo Machado acredita que essa mentalidade conservacionista seria alcançada somente através da educação. Era necessário criar uma educação conservacionista que, para surtir efeito, deveria ser voltada essencialmente para o público infantil. Ele identifica uma série de problemas na forma como ensinamos as crianças sobre as plantas e os animais. Assim permanecendo, quando elas chegarem à vida adulta, constituirão cidadãos completamente aversos e descompromissados com a proteção da natureza.

São quatro os erros descritos por Ângelo. O primeiro está no fato de que muitas crianças vivem nos ambientes urbanos. A sensação de que tudo se compra nos comércios cria nelas um sentimento de independência do mundo natural, além de passarem a perceber a natureza sob um olhar recursista e utilitarista. Além disso, a fauna das cidades é composta por animais como baratas, mosquitos, besouros, ratos, dentre outros, que, ao fim e ao cabo, criam uma sensação de repulsa a esses animais e, consequentemente, à natureza.

O segundo reside no ensino de ciências, sobretudo de biologia. Nas escolas, as crianças aprendem mais sobre as partes internas dos organismos e não sobre o animal inteiro como ser vivo pertencente a um ecossistema no qual o ser humano também está incluído. O ensino, por sua vez, é muito focado nos animais causadores e transmissores de doenças e nos que possuem veneno, provocando receio. Ele sustenta ainda o compromisso do professor de ciências com o ensino sobre a vida e diz que o ensino errôneo de biologia resultará em ódio ou indiferença para com o mundo biológico.

A imagem de natureza construída pela criança, então, passa por uma forte influência dos meios de comunicação e pelos espaços informais de ensino. Baseado no pensamento de Adorno, Ângelo acredita que há um “imperialismo cultural da paisagem natural”. As imagens da natureza transmitidas na televisão são majoritariamente estrangeiras e exóticas, basicamente norte-americanas, europeias e africanas. Cria-se uma imagem distorcida e irreal da natureza, muito diferente da que é encontrada no Brasil. As florestas Amazônica e Atlântica, obscuras, de mata fechada e densa, são comumente representadas como espaços amedrontadores.

Por último, a educação em espaços informais, como é nas famílias, incute na criança o sentimento de medo e perigo. O caso mais comum é o da reprodução de superstições sobre os malefícios que o contato com os animais traz. Muitos de nós acreditamos, ainda, que o pó da asa da borboleta cega.

Partindo de um pressuposto básico – de que quem gosta protege e quem não gosta destrói -, Ângelo crê que o mais importante é criar um sentimento de pertencimento, respeito e afetividade nas crianças para com o mundo natural e não uma psicologia do medo, para que formemos cidadãos sensíveis aos problemas ambientais, um dos grandes males da sociedade contemporânea, e assim caminhemos para a resolução desses problemas. A efetividade é outro debate. Todavia, é inegável que a educação ambiental certamente constitui um primeiro e importante passo para alcançarmos esse ideal.


REFERÊNCIAS

MACHADO, Angelo B. MConservação da natureza e Educação. In: I Congresso Brasileiro de Essências Nativas, Campos do Jordão – SP, v. 16, p. 109-118, 1982.

MACHADO, Angelo Barbosa MonteiroEducação da criança e a natureza. In: IV Congresso Latino Americano Psiquiatria Infantil. Anais do Congresso Brasileiro Neuro-Psiquiatria Infantil, Belo Horizonte – MG, v. IV, p. 155-158, 1977.

MACHADO, Angelo B. M. Mentalidade conservacionista. Separata da Revista Ciência e Cultura. v. 27(9), 1975.

 

 

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Por uma mentalidade conservacionista: educação ambiental em Ângelo Machado

Gabriel Shcunk

Nascido em Belo Horizonte, no ano de 1934, Ângelo Barbosa Monteiro Machado é um importante personagem mineiro. Formado originalmente em Medicina, nunca chegou a exercer a profissão, dedicando-se estritamente ao ensino e à pesquisa na área médica. Entretanto, falaremos aqui de um outro Ângelo, o ambientalista.

Desde muito novo, Ângelo gostava de bichos. Enquanto estudava neurobiologia, tinha como hobby o seu estudo sobre libélulas. Ao longo da vida, catalogou mais de uma centena de espécies. Sua preocupação com o mundo natural vem das vivências na fazenda de seu pai, como ele disse em uma entrevista à FAPESP, em 2007: “Ia à fazenda do meu pai, no Vale do Rio Doce, e gostava de coletar insetos, andar na mata e ouvir o canto do macuco ou do jaó. A cada ano tinha menos mata e menos bicho”. Desde então, passou a atuar em prol da defesa do meio ambiente quando entrou, em 1974, para o Centro para Conservação da Natureza de Minas Gerais, uma entidade ambientalista pioneira em Minas. Ângelo acredita que o desenvolvimento tecnológico trouxe uma série de problemas para o mundo biológico. Para que esse quadro fosse revertido, aponta a necessidade da criação de uma mentalidade conservacionista.

Influenciado pelo pensamento de Broad, Ângelo Machado acredita que essa mentalidade conservacionista seria alcançada somente através da educação. Era necessário criar uma educação conservacionista que, para surtir efeito, deveria ser voltada essencialmente para o público infantil. Ele identifica uma série de problemas na forma como ensinamos as crianças sobre as plantas e os animais. Assim permanecendo, quando elas chegarem à vida adulta, constituirão cidadãos completamente aversos e descompromissados com a proteção da natureza.

São quatro os erros descritos por Ângelo. O primeiro está no fato de que muitas crianças vivem nos ambientes urbanos. A sensação de que tudo se compra nos comércios cria nelas um sentimento de independência do mundo natural, além de passarem a perceber a natureza sob um olhar recursista e utilitarista. Além disso, a fauna das cidades é composta por animais como baratas, mosquitos, besouros, ratos, dentre outros, que, ao fim e ao cabo, criam uma sensação de repulsa a esses animais e, consequentemente, à natureza.

O segundo reside no ensino de ciências, sobretudo de biologia. Nas escolas, as crianças aprendem mais sobre as partes internas dos organismos e não sobre o animal inteiro como ser vivo pertencente a um ecossistema no qual o ser humano também está incluído. O ensino, por sua vez, é muito focado nos animais causadores e transmissores de doenças e nos que possuem veneno, provocando receio. Ele sustenta ainda o compromisso do professor de ciências com o ensino sobre a vida e diz que o ensino errôneo de biologia resultará em ódio ou indiferença para com o mundo biológico.

A imagem de natureza construída pela criança, então, passa por uma forte influência dos meios de comunicação e pelos espaços informais de ensino. Baseado no pensamento de Adorno, Ângelo acredita que há um “imperialismo cultural da paisagem natural”. As imagens da natureza transmitidas na televisão são majoritariamente estrangeiras e exóticas, basicamente norte-americanas, europeias e africanas. Cria-se uma imagem distorcida e irreal da natureza, muito diferente da que é encontrada no Brasil. As florestas Amazônica e Atlântica, obscuras, de mata fechada e densa, são comumente representadas como espaços amedrontadores.

Por último, a educação em espaços informais, como é nas famílias, incute na criança o sentimento de medo e perigo. O caso mais comum é o da reprodução de superstições sobre os malefícios que o contato com os animais traz. Muitos de nós acreditamos, ainda, que o pó da asa da borboleta cega.

Partindo de um pressuposto básico – de que quem gosta protege e quem não gosta destrói -, Ângelo crê que o mais importante é criar um sentimento de pertencimento, respeito e afetividade nas crianças para com o mundo natural e não uma psicologia do medo, para que formemos cidadãos sensíveis aos problemas ambientais, um dos grandes males da sociedade contemporânea, e assim caminhemos para a resolução desses problemas. A efetividade é outro debate. Todavia, é inegável que a educação ambiental certamente constitui um primeiro e importante passo para alcançarmos esse ideal.


REFERÊNCIAS

MACHADO, Angelo B. M. Conservação da natureza e Educação. In: I Congresso Brasileiro de Essências Nativas, Campos do Jordão – SP, v. 16, p. 109-118, 1982.

MACHADO, Angelo Barbosa Monteiro. Educação da criança e a natureza. In: IV Congresso Latino Americano Psiquiatria Infantil. Anais do Congresso Brasileiro Neuro-Psiquiatria Infantil, Belo Horizonte – MG, v. IV, p. 155-158, 1977.

MACHADO, Angelo B. M. Mentalidade conservacionista. Separata da Revista Ciência e Cultura. v. 27(9), 1975.

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