Por uma escola das perguntas

Liliana Siqueira Francischini1

Quando comecei a ler Rubem Alves, bem antes de me formar pedagoga, fui impactada por muitas de suas ideias. Uma delas ficou para sempre gravada em minha memória: “Para isso existem as escolas: não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas.” Lembro-me de pensar sobre isso por bastante tempo e em momentos variados da minha vida. A escola, de tanto se empenhar em ensinar e cobrar as respostas tidas como “certas”, se esqueceu de ensinar a perguntar. E por que saber perguntar seria tão ou mais importante do que responder?

Em primeiro lugar, porque as respostas costumam ser provisórias e inacabadas. Em um mundo em constante movimento, há poucas certezas universais e muitas dúvidas. “Tentamos nos cercar com o máximo de certezas, mas viver é navegar em um mar de incertezas, através de ilhotas e arquipélagos de certezas nos quais nos reabastecemos”, diz o sociólogo e filósofo francês Edgar Morin.

Em segundo lugar, porque é sabido que aprendemos mais e melhor quando nos envolvemos com o objeto de conhecimento. Receber algo pronto, acabado é muito diferente de participar de sua construção. Quando participamos, quando estamos construindo algo, inevitavelmente surgem dúvidas, inquietações, questionamentos, perguntas variadas. A travessia fica repleta de “comos” e “porquês”. São eles que alimentam nossa curiosidade e nosso ímpeto para buscar as respostas. Ao buscar respostas, em vez de somente recebê-las, nos envolvemos muito mais no processo. Assim, as chances de o aprendizado ser realmente assimilado e consolidado são bem maiores, confirmam também as mais recentes pesquisas em Neurociências.

Em um mundo cada vez mais acelerado, que cobra produtividade a todo custo, com excesso de informação, lançamento de novidades tecnológicas a cada instante, e onde impera o oráculo Google, parece muito transgressor, revolucionário, e até ingênuo, apostar em uma educação para as perguntas, e não para as respostas. Mas Sócrates, 400 anos antes de Cristo, já defendia um método investigativo argumentativo baseado em questões, muitas vezes simples, que instigavam seus alunos a pensar por si mesmos.

A pergunta surge de um assombro, de um estranhamento, de uma necessidade de buscar sentido. Desde os primórdios da humanidade e desde o nosso nascimento, buscamos compreender o mundo e entender a nós mesmos. Uma pedagogia da pergunta reconhece essa necessidade humana, valoriza a curiosidade e o ímpeto por aprender a partir de um interesse genuíno. “O educador precisa dar as mãos para a criança na aventura de inventar e conhecer o mundo”, sintetiza a educadora Stela Barbieri. 

Vamos dar as mãos para as crianças e abraçar suas perguntas, das verbais àquelas expressas somente pelos sentidos? Desconstruir velhas práticas e nos reposicionarmos como educadoras não é fácil, mas é totalmente possível. Que possamos nos lembrar de que “cabeça de criança não é gaveta onde se guardam informações. É canteiro onde nascem perguntas”, nas palavras de Rubem Alves. Não sabemos precisamente quais sementes podem germinar ali. Façamos a nossa parte da melhor maneira possível. Cultivemos as perguntas!

 

1 – Formada em Jornalismo e em Pedagogia, pós-graduada em Neurociências na Educação, professora de Educação Infantil. E-mail: liliana.siqueira@outlook.com.br.

 

Para saber mais
ALVES, Rubem. A alegria de ensinar. São Paulo: ARS Poética Editora, 1994.

ALVES, Rubem. Por uma educação romântica. Campinas: Papirus, 2002.

BARBIERI, Stela. Interações: onde está a arte na infância? São Paulo: Blucher, 2012.

MORIN, Edgar. As certezas são uma ilusão. Entrevista concedida ao jornal francês CNRS, publicada no portal Fronteiras do Pensamento. Acesse aqui


Imagem de destaque: Pxfuel

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