Mano Brown: o sujeito da EJA por excelência

Daiana Maria da Silva

Conheci Mano Brown ainda na infância, e durante muito tempo tive um incômodo/medo com sua figura. Graças ao meu irmão temporão, tive privilégio de superar essa sensação no início da vida adulta. 

Por essa linguagem estranhamente silenciosa que aparta pessoas pela estética, por estereótipos e preconceitos, o temia por ser o cara que eclodia dos carros rebaixados dos caras com blusas que carregavam imagens de sua banda junto de colares e crucifixos. Como estratégia de menina periférica CDF, parecia ser seguro me manter distante, porque diziam que aqueles meninos não tinham futuro. 

Até que um dia, já estudante de História, ouvi sua voz saindo do velho computador de casa com meu irmão adolescente cantando junto. O interpelei sobre o porquê estava ouvindo aquela música e o menino, que sempre foi meio brigado com a escola, me deu uma aula de História do Brasil a partir daquela letra. Comecei a discografia por “Mágico de Oz” e os ditos meninos sem futuro me foram apresentados por outra perspectiva. E isso transformou minha formação enquanto sujeito e docente. 

Já como professora, descobri a mágica de motivar meninos meio brigados com a escola usando as letras das músicas dos Racionais MC’s. Que magnetismo! E as aulas de História tem uma fonte singular do Brasil que se apresenta para eles todos os dias. 

Recentemente descobri uma outra faceta do Mano Brown. Em tempos pandêmicos resolveu ser entrevistador e, se apropriando de uma nova mídia com uma equipe de pessoas pretas, entrevista pessoas públicas de diferentes matizes ideológicas. E uma frase que o acompanha sempre no programa é: “eu só fiz até a 8ª série” e na sequência dá uma aula que me faz questionar minha formação em História. O cara fala com propriedade de antiguidade africana, urbanismo, futebol, religiosidade e muitos outros temas que apareçam na roda.

Aí me pergunto, como pode? O que a escola faz para que sujeitos tão incríveis briguem com ela ainda meninos? 

A experiência de trabalhar com EJA ajuda a entender um bocado dos motivos. Muitos de nós, profissionais da educação, somos ensinados pela linguagem silenciosa a apartar e ter medo/raiva dos meninos que questionam o status quo

E pensando no quanto Mano Brown me faz lembrar dos meninos filhos de quem não pode frequentar a escola e que hoje são, muitas vezes, excluídos dentro da escola gostaria de fazer dois pedidos: 

– Mano, fala num programa aí: “Salve rapa! Salve massa! Procura a EJA que a escola é sua por direito! 

E o outro pedido, não menos importante: 

– Mano, vem pra EJA também, precisamos muito aprender com você!

 

Sobre a autora

Professora das redes municipais de Betim e BH. Mestre em educação. Apaixonada pela EJA e por boas histórias.


Imagem de destaque

Figura  SEQ Figura \* ARABIC 1 Mural em homenagem ao Racionais MC’s, localizado no Capão Redondo, SP.

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