Luz, Câmera, Ação

Gustavo Silva Neves

“Quando os irmãos Marilla e Matthew Cuthbert, de Green Gables, na Prince Edward Island, no Canadá, decidem adotar um órfão para ajudá-los nos trabalhos da fazenda, não estão preparados para o ‘erro’ que mudará suas vidas: Anne Shirley, uma menina ruiva de 11 anos, acaba sendo enviada, por engano, pelo orfanato”

O trecho que abre nossa conversa foi extraído da apresentação de uma das obras mais encantadoras já produzidas. Trata-se do livro Anne, de Green Gables.  Sua autora, Lucy Maud Montgomery, de certo não imaginaria que sua obra (publicada pela primeira vez ainda em 1909), seria reproduzida em diversas edições,vendendo mais de 50 milhões de cópias em todo o mundo e traduzida para mais de 20 idiomas. Não fosse o bastante, a publicação foi adaptada para a famosa série Anne com E (Anne with an E) na plataforma de streaming, NETFLIX. Resultando em três temporadas de estrondoso sucesso!

Os textos de Lucy, são mesmo encantadores. Do início ao fim, promovem uma conexão profunda com costumes, linguagens e até mesmo com um tempo de acontecimentos, uma narrativa atemporal. As coisas se davam mais lentamente, cuidadosamente explicadas. As características da Ilha do Príncipe Eduardo, ou mesmo da Fazenda Green Gables, nos transportam para um mundo singular e muito prazeroso. É impossível não se deliciar com as atividades do campo ou com as aventuras da intrépida heroína! Tudo isso foi incrivelmente adaptado para a dinâmica de uma série de TV.

O leitor há de concordar que é bastante comum acompanharmos relatos aborrecidos de diversos aficionados que reclamam do quanto a obra literal foi deturpada em sua reprodução televisiva ou do cinema. Porém, não foi assim com Anne! É claro, em sua adaptação para a série, alguns detalhes foram mudados, algumas ocorrências modificadas, personagens foram incluídos e outros tiveram características adicionadas. O resultado? Surpreendentemente positivo! A série é progressista, corajosa, aborda temas importantes e atuais como o feminismo, igualdade de acesso, racismo e a homossexualidadede maneira leve e delicada. Conciliadora, eu diria! Transformando a série num bálsamo de calmaria e serenidade, enquanto lá fora, o mundo parece acabar.

E assim, alcançamos um ponto sensível de nossa conversa. É fato que ainda existe muito preconceito em relação às adaptações televisivas e cinematográficas. Nem sempre essa resistência é injustificada (é importante que se diga!). Mas, por outro lado, é inegável que estas obras abrem caminho para um outro processo. As séries, filmes e produções televisivas, acabam por democratizar o acesso a algumas obras, (que não fosse pela repercussão midiática, estariam fadadas ao esquecimento). Um livro canadense, de 1909, poderia muito bem passar desapercebido. Mas a série lhe devolveu visibilidade!

Acabamos abrindo dois precedentes importantes. Não podemos nos esquecer: habitamos um país que recentemente aumentou a alíquota de impostos para livros. Numa realidade já tão desigual, essa medida torna cada vez mais difícil a decisão de adquirir um livro, por parte da população mais pobre. O Governo poderia taxar a indústria do tabaco, da bebida alcóolica, a indústria de armas, mas escolheu as editoras. Sim, isso diz muito do que estamos enfrentando na educação, e daí mesmo, vem uma justificativa pronta: ter estas obras adaptadas é garantir que, de algum modo, o grande público, alijado das livrarias, possa experimentar o prazer da literatura, (ainda que não leia o livro). E por último, o melhor dos resultados, vem do desdobramento dessa análise. A série ou filme alcança também uma parcela da população que ainda pode adquirir um livro. E eu lhes pergunto: quantas pessoas não assistiram a série, e curiosos pela obra original, decidiram pela compra e pela leitura?

Finalmente, podemos sim, tecer nossas críticas e comentários acerca de qualquer reprodução de obra literária. Em última análise, esse tipo de discussão abre caminho para a curiosidade, para a vontade de ler e daí construir a sua própria análise individual. Essas novas plataformas de streaming, a indústria do cinema e mesmo da TV, são importantes canais que proporcionam contato com um mundo que, sem elas, jamais teríamos conhecido. Elas consolidam travessias rumo às livrarias, e uma vez dentro de uma livraria, outras tantas pontes se criam. Ler é bom, mas quando não for possível, ver e ouvir, também é.

Referências:

MONTGOMERY, L. M. Anne Shirley. Brasil: Companhia Editora Nacional, 1939.

MONTGOMERY, Lucy M., Anne e a sua Aldeia.Portugal:  Civilização, 1972.


Imagem de destaque: Juraj Gabriel / Unsplash

 

 

 

 

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