“Contra os cortes, eu não me calo, eu digo fora; fora; fora…”

Ruan Debian1

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 10 de dezembro de 1948, no seu art. XXVI declara que “Todos os seres humanos têm direito à educação (…). Contudo, como pensar no desenvolvimento dos seres humanos, na garantia de seus direitos fundamentais, se a educação é vista e tratada no Brasil, aliás muito maltratada, como despesa, um gasto qualquer?

As bolsas de pesquisa, seja para iniciação científica, seja para o mestrado ou doutorado, não possuem reajustes em seus valores desde de 2013. Dito de outro modo, são pouco mais de 8 anos que são pagos os mesmos 400 reais para bolsistas de iniciação científica. Lamentavelmente, dedicar a vida para pesquisa no Brasil, principalmente no tempo presente, está se tornando cada vez mais difícil. Rememorando o pensador Karl Marx, quando ainda estava iniciando seus estudos mais profundos sobre a economia-política da sociedade capitalista, escreveu assertivamente nos “Manuscritos Econômicos-Filosóficos”, em 18442, que o salário é mais constante que os preços dos meios de vida. (MARX, 2004). 

Nesse sentido, somente neste ano de 2021, por exemplo, o valor do botijão de gás aumentou em 30% segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP). Poderiam ser mencionados facilmente outros serviços essenciais no dia a dia do estudante que ficaram mais caros nos últimos anos, como alimentação, valor do transporte público, aluguel etc. Manusear a miséria é importante para perpetuação da sociedade capitalista. Como afirmou o Prof. Alysson Máscaro, em seu livro “Estado e Forma Política”: “O Estado não é a forma de extinção das lutas em favor de uma classe, mas sim da manutenção dinâmica e constante de contradição entre as classes.” (MÁSCARO, 2013, p.60).

Sendo assim, com o contingenciamento feito em 2019 pelo ex-ministro da educação Abraham Weintraub, em que universidades correram reais riscos de serem fechadas, desencadearam os maiores protestos de massas feitas nos últimos anos protagonizadas pelos estudantes. O “Tsunami da Educação”, como ficou conhecido, levou às ruas, não somente estudantes, mas incontáveis setores da sociedade civil, que lutavam contra a barbaridade deferida contra a educação. Com o bloqueio no pagamento das bolsas do PIBID e do Residência Pedagógica, que marcam mais um trágico capítulo na luta árdua que os movimentos estudantis estão travando contra este governo de extrema-direita, cuja liderança está centralizada na figura de Jair Bolsonaro, discentes de todo país mais uma vez se mobilizaram e conseguiram que nas próximas semanas as bolsas sejam pagas. Referente ao PIBID e ao RP, a situação ainda está longe de se resolver definitivamente.

Nicolau Maquiavel, em sua clássica obra O Príncipe, escreveu que não se deve proporcionar tudo aos súditos, pois se estes obtiverem muitas “regalias” em momentos de crises não aceitariam perdê-las e qualquer bem realizado pelo príncipe não seriam suficientes (MAQUIAVEL, 1973). Os ataques constantes contra a educação são exemplos de como o Estado segue à risca a orientação dada por Maquiavel para Lourenço de Médici na obra mencionada. Ou seja, não dê muito ao povo, tire tudo que puder e quando o povo se revoltar, apazigue-os seus ânimos restituindo o que já era seu por direito.

Na análise aqui em questão, ao invés dos estudantes estarem lutando para o aumento dos valores remunerados pelos órgãos de pesquisas e a expansão das bolsas para outros alunos e alunas conseguirem garantir seu direito de se manterem nas Universidades, são obrigados a lutarem para não perderem o pouco que conquistaram. Ora, não garantir a permanência de estudantes não deveria ser compreendida como grave violação dos direitos humanos?

Por fim, maltratar a educação e tratá-la como despesa desencadeando na condenação do futuro de inúmeros jovens brasileiros e brasileiras, ferindo seus direitos, vem se mostrando muito eficaz, como afirmou várias vezes Darcy Ribeiro que o descaso com a educação não é apenas um acaso, mas sim um projeto de país.

 

1 – Educador popular, graduando em pedagogia pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), militante do coletivo JUNTOS! e membro do CDDH de Betim.

2 – Obra publicada em 1932 na extinta União Soviética.

 

Para saber mais

MASCARO, Alysson. Estado e Forma Política. 1ªed. São Paulo: Boitempo, 2013.

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. 1ªed. São Paulo: Abril Cultural, 1973.

MARX, Karl. Manuscritos Econômicos Filosóficos. 1ªed. São Paulo: Boitempo, 2004.

 

Imagem de destaque: Publicdomainvectors e CNPq

 

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