A FELICIDADE é um trabalho interior que nasce de sentimentos, palavras e atitudes

– Um ato de amor pode surgir de uma simples pergunta… de uma singela contação de histórias.

Janayna Alves Brejo

Há cerca de vinte anos atrás, aquela professora lecionava na Educação Infantil, para crianças que tinham idades entre 5 e 6 anos. Ela sempre iniciava suas aulas contando histórias, pois acreditava que as narrativas além de colaborarem com a formação humana das crianças, as levavam a pensar e a agir de maneira responsável e comprometida com a construção de um mundo melhor.

Era uma tarde ensolarada e os(as) alunos(as) começaram a desenhar livremente, após a contação da história “A Bruxa Salomé de Audrey Wood”, cujo o enredo traz uma mãe carinhosa e de muita coragem que enfrenta uma bruxa poderosa na intenção de livrar seus filhos de um terrível feitiço.

Enquanto isso, uma aluna então levantou-se e caminhou até a mesa da professora e perguntou:

— Quanto você calça?

— A professora surpresa, respondeu: Por que você quer saber o número do meu sapato, querida?

A menina sorriu e, com um pouco de tristeza nos olhos disse: — É para pedir para a minha mãe comprar uma sandalinha nova para a senhora, pois percebi que você só tem essa… a senhora vem todos os dias com ela e já está bem velhinha não é?!

A professora, sorriu e olhando bem nos olhos da menina, respondeu com carinho: — Minha querida, não é necessário, te agradeço muito, mas eu tenho sim outras sandálias, porém, a correria do dia a dia não me deixou perceber que eu sempre venho com o mesmo calçado!

A menina suspirou aliviada e voltou para o seu lugar, retomando então o desenho que fazia da própria professora contando a história da bruxa. Talvez, aquele fosse para ela, o momento mais importante da aula, afinal, a pequena adorava desenhar as narrativas que eram compartilhadas com a turma todas as tardes.

A professora continuou a olhar para aquela criança por mais alguns instantes, e enquanto isso, pensava na atitude da menina, pois havia ficado deslumbrada com a observação da aluna, com a preocupação demonstrada a ponto de perceber que vinha sempre com a mesma sandália, que já estava velhinha e que a mãe poderia lhe comprar uma nova.

Assim, a professora se perguntava em pensamento: – Como pode uma criança tão pequena já possuir um olhar tão sensível e caridoso, a ponto de preocupar-se comigo? – Como pode uma criança de tão pouca idade, observar as necessidades do outro e prontificar-se a ajudar?

Naquele momento, a professora percebeu o quanto a felicidade se realiza por meio das pequenas coisas, dos pequenos gestos, das simples atitudes e, principalmente, a partir de uma palavra dita com o coração, na hora certa e no momento certo. Foi quando, de repente, ela lembrou-se de uma história que tinha ouvido, há muito, muito tempo… cujo nome era: “A Língua” e falava sobre o poder da palavra, sobre o poder da língua. Ela não se recordava do autor e nem da história por completo. No entanto, do ensinamento trazido pela narrativa, nunca havia esquecido.

O conto deixava claro que, a palavra representada pela “língua”, pode ser usada tanto para transmitir o que é bom, quanto para passar o que é ruim, uma vez que tudo depende da forma como fazemos uso dela: se com cuidado e afeto ela é capaz de tocar o coração das pessoas; se com grosseria e desrespeito corremos o risco de magoar e despertar sensações desconfortáveis naqueles que nos cercam.

Então a professora, quase que “contemplando” a menininha, teve certeza do quanto a pequenina soube utilizar a língua com maestria, pois com seu jeito carinhoso de falar, tocou profundamente seu coração naquele dia!

Talvez esta história seja para você um simples fato do cotidiano e dessa forma, após a leitura, poderá “entrar por uma porta e sair por outra”. Entretanto, se estimulamos a sensibilidade para perceber a sinceridade e a preocupação daquela criança, entenderemos também que a felicidade interior pode nascer de palavras que também se expressam em atitudes.

Se numa tarde de sol aquela menina decidiu perguntar sobre um par de sandálias, o conto “A Língua” nos ajuda a pensar em nosso papel junto às crianças… em como estamos usando a nossa palavra para conversar com elas, bem como na importância que precisamos dar às histórias que tanto podem auxiliar na formação humana de cada pessoa.

Afinal, se desejamos que os nossos filhos, as nossas netas, os nossos sobrinhos, as nossas alunas consigam construir suas histórias de vida refletindo antes de falar, precisamos expressar nosso carinho a partir das histórias que contamos, das palavras que utilizamos e das atitudes que tomamos.

Referências

MATOS, Gislayne Avelar. A língua. In: MATOS, Gislayne Avelar. Do bobo da corte ao marqueteiro. Divinópolis: Gulliver Editora, 2018. 216p.

WOOD, Audrey. A bruxa Salomé. 9ª ed. São Paulo: Ática, 1999. 32p.

Avelar. Do bobo da corte ao marqueteiro. Divinópolis: Gulliver Editora, 2018. 216p.


Imagem de destaque: Wolf Craft / mepixels

 

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