A reação do ator Will Smith à piada ofensiva dirigida à sua esposa, Jada Pinkett Smith, não apenas ofuscou o próprio brilho da conquista do primeiro Oscar na carreira do ator, como também ofuscou o próprio filme. O merecimento do Oscar não é meu foco aqui, pois certamente a atuação do Smith está sim à altura de muitos prêmios. Mas o filme em si também merece um convite à leitura e à reflexão.
Richard Williams é o personagem principal do filme, inspirado na história de vida das tenistas Vênus e Serena Williams. Sim, o filme é sobre a infância das irmãs, mas elas não são as protagonistas na própria história. Também me causou estranhamento o silenciamento da mãe das tenistas, a enfermeira Oracene Price, que trabalhava duro para garantir o sustento e educação das 5 filhas e ainda atuava no treinamento das mais novas. Mas por que somente o pai é considerado herói na história de sucesso desta família negra? As irmãs mais velhas também não contribuíram?
Após assistir ao filme, recuperei uma frase de Bell Hooks que se aplica muito bem ao caso King Richard: “mesmo quando eruditos negros escrevem sobre a vida intelectual negra em geral só focalizam as vidas e obras de homens (HOOKS, 1995, p. 466).
Reconheço a importância de representar homens negros como bons pais, e o filme King Richard faz isso muito bem. O debate sobre masculinidade negra é outro mérito do filme, sem sombra de dúvida. Contudo, o silenciamento do protagonismo das mulheres negras no interior das famílias não pode ser ignorado. E no caso das irmãs Vênus e Serena, a família teve um papel crucial ao investir tudo o que tinha na formação delas, mas ainda assim, é preciso reconhecer que elas são as estrelas e protagonistas das próprias histórias.
Sobre a autora
Historiadora e Docente na Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Para saber mais
Hooks, bell. Intelectuais negras. Revista Estudos Feministas, 1995.
Imagem de destaque: Cartaz do filme King Richard: criando campeãs, HBO MAX, 2021.