Educação Museal na Pandemia: articulações frente aos desafios atuais

Martha Marandino*

Andréa Costa**

O papel social dos museus vem sendo tema de reflexões e envolve diferentes concepções e interesses de ordem política, econômica e cultural. Historicamente, a educação nestes espaços esteve mergulhada em aspectos polêmicos que se relacionam, em parte, pelo sentido que se dá à “educação” – muitas vezes pensada como apenas vinculada à escola – mas também pelas diferentes tensões e disputas envolvendo as funções de coleta, salvaguarda e pesquisa que os museus sempre tiveram.

Em fins do século XIX, uma maior abertura dos museus, acompanhada da preocupação educativa por parte dos governos e da sociedade, propiciou a criação dos primeiros setores educativos permanentes em museus europeus. No Brasil, a iniciativa pioneira foi concebida por Edgard Roquette-Pinto, quando diretor do Museu Nacional, que criou em 1927 o Serviço de Assistência ao Ensino de História Natural, atual Seção de Assistência ao Ensino (SAE).

Um dos elementos-chave dos museus hoje é a discussão do seu papel como instituição cada vez mais “inclusiva”, em consonância com uma consciência cada vez mais forte com relação aos direitos humanos. Se por um lado tais direitos continuam sendo sistematicamente violados, as iniciativas das instituições museais têm sido cada vez mais fortalecidas.

A Política Nacional de Educação Museal (PNEM) articulada ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) foi instituída em 2017, com o objetivo de organizar, desenvolver, fortalecer e fundamentar o campo da educação museal no país. Foi lançado também o Caderno da PNEM, com documentos e um glossário com verbetes que orientam o trabalho no campo.

Entendemos que avanços importantes vêm sendo feitos na Educação Museal, mas também muitos desafios se colocam. O ano de 2020 se constitui como um marco no enfrentamento de velhos problemas já que a quarentena, adotada em decorrência da atual Pandemia causada pela COVID-19, levou ao fechamento temporário de várias instituições culturais, o que acabou por evidenciar a difícil realidade enfrentada pelos profissionais da Educação Museal ao redor do mundo.

Desde o início da quarentena, a Rede de Educadores em Museus do Brasil (REM BR) e o Comitê para Educação e Ação Cultural do Conselho Internacional de Museus (CECA BR – ICOM BR) vêm promovendo diagnósticos e debates sobre este campo de atuação profissional visando ao seu fortalecimento. No mês de abril, por meio de consulta online junto a 213 trabalhadores deste campo, verificou-se que cerca de ¼ das 147 instituições citadas pelos respondentes, localizadas em 19 estados brasileiros, haviam efetuado demissões desses profissionais. A profissionalização dos educadores ganhou ainda mais destaque neste momento, levando ao debate sobre a possibilidade de criação de uma Associação Nacional de Profissionais da Educação Museal e de Espaços Culturais. No mês de agosto, a REM-BR e o CECA-BR fizeram uma pesquisa de interesse, que contou com a participação de 303 pessoas ligadas ao campo. Os resultados revelaram o amplo desejo pela criação da Associação, sendo o reconhecimento da profissão a principal expectativa em relação à sua atuação. Assim, educadores de museus e espaços culturais vêm se organizando e se mobilizando para o aprofundamento do debate de temas relevantes, compartilhamento de experiências e problematização e contestação da política de destruição aplicada às áreas de cultura e educação.

Os setores educativos e os educadores são peças fundamentais para que ocorram as diferentes formas de inclusão e de valorização dos direitos humanos pelos museus, mesmo que, muitas vezes, sejam compreendidos por gestores apenas como uma prestação de serviço e não parte integrante do museu. É assim necessário o reconhecimento desse setor e do trabalho desses profissionais e, nesse sentido, a PNEM ganha ainda maior relevância e fica patente a urgência de sua implementação.

Nesse momento uma profusão de ações educativas criativas, interativas e dialógicas online estão sendo produzidas pelos educadores museais em todo país, intensificando as experiências que já existiam. Objetos virtuais produzidos nestes últimos seis meses para uso em sala de aula ou mesmo para as famílias estão presentes nas redes. Parcerias entre museus e universidades a partir da oportunidade da realização de estágios de licenciatura em museus se fortaleceram nesse momento de Pandemia.

A atuação dos educadores museais esteve desde muito cedo ligada ao uso das mídias. No início do século XX, Roquette-Pinto e seus contemporâneos fizeram amplo uso do cinema e da projeção de slides em atividades educacionais. Hoje, educadores e educadoras museais, imersos no contexto da cibercultura, dão provas de sua relevância e atualização, lançando mão das tecnologias digitais em rede e da liberação do pólo de emissão por elas viabilizado, ampliando o diálogo e o protagonismo dos públicos.

* Faculdade de Educação da USP

** Museu Nacional da UFRJ e Escola de Museologia da UNIRIO


Imagem de destaque: PNEM

 

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