Educação, é preciso desafiar a normalidade!

Ainda que a partir de 1º de janeiro possamos retomar o curso da história brasileira rumo a um projeto de reconstrução nacional, foram tantas as destruições, a começar em nossas próprias convicções sobre os lugares da escola, do conhecimento e da educação, que demorará um tempo alongado para sairmos deste atoleiro em que nos meteram.

Como não aquilatar os enormes desafios trazidos pelas novas configurações da educação pela acelerada expansão das plataformas privadas de ensino e de comércio ostensivo de facilidades educacionais? Como nos preparar, e preparar as nossas alunas, nossos alunos, para esse enfrentamento tão desigual, e que nos impõe imensos desafios científicos, tecnológicos, políticos e epistemológicos?

Novamente havemos de acreditar que se há saída, ou ela é coletiva ou não haverá.  Mais do que nunca, os corredores, auditórios e salas de aula deverão continuar pulsando ao ritmo das melhores utopias. Mas, ainda assim, temos que ter a clareza que tais espaços e tempo de ensino e aprendizagem, de tradições e inovações, de solidariedade e cumplicidade, não serão suficientes.

Impõe-se alargar nossas parcerias e cumplicidades com aqueles movimentos que, de fato, trouxeram lufadas novas e alvissareiras para a educação pública desse país. Movimentos do campo e da cidade, sem terra, sem teto, quilombolas, negros, indígenas, ambientalistas, LGBTQIA+ de professoras da educação básica, de estudantes, sindicais, coletivos de educação e cultura, de luta pela saúde pública, dentre tantos outros que nos ajudaram a sonhar e a fazer uma nova escola, da educação infantil à pós graduação, nas últimas décadas.

É preciso devolver às novas gerações, na escola e pela escola, ainda que não apenas, a experiência e o exercício cotidiano de outras formas de dizer, de expressar, de conhecer, de entender, de simbolizar, enfim, de representar o mundo que lhes foram usurpados pela razão pragmática e pelas suas formas de conhecimento de nós mesmos, do mundo e da escola.

É preciso que a escola  e a educação cultivem novamente o  compasso da dança, o ritmo da música, as iluminuras do cinema, as cenas do teatro, as cores das artes plásticas e que abra espaço para todas as artes,  para as potencialidades de simbolização dos corpos, em toda a  sua plenitude e em todas as nossas diversidades.  Enfim, é preciso que recuperemos nossas capacidades, juntos com as crianças e os  jovens, de simbolizar o horror, palavrear o medo e representar as perversidades nuas e cruas de que somente o humano é capaz.

Somente assim seremos capazes de elaborar os  fantasmas e os monstros que nos paralisam e devoram os nossos melhores e mais generosos sonhos. Somente assim estaremos, de fato, construindo uma educação e uma escola que sejam contemporâneas de nosso tempo e preparem, com as especificidades que lhe são próprias, as novas gerações para os gestos amorosos, solidários, altruístas, de acolhimento e empatia que, também, somente o humano é capaz.

Há muitos séculos os nossos mortos não descansam em paz, pois aqueles que os assassinaram continuam construindo sobre seus ossos e suas histórias, pontes para este presente sombrio em que vivemos. Mas, como em outros momentos, as luzes da aurora, como nos lembrava Drummond, hão de aparecer e tingir nossas manhãs com as cores da vida e da alegria.


Imagem de destaque: Galeria de imagens.

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