Maciana Freitas e Souza
A Bolsa Amarela, de Lygia Bojunga, chegou às minhas mãos através do projeto Leia Mulheres. Apesar de um título comum e de ser voltado para o segmento infantojuvenil, ao longo da narrativa o leitor encontra fortes críticas ao regime vigente, tendo como protagonista a menina Raquel. A partir de suas memórias, Raquel narra a experiência de ter sido criada em uma família com personalidades muito diferentes e passa a sua infância buscando uma certa aceitação. Filha mais nova entre duas irmãs e um irmão, a menina conta que possui três grandes vontades: a vontade de crescer, a vontade de ser menino e a vontade de ser escritora.
Além da família de Raquel, o enredo apresenta a família do tio Júlio, composta pela tia Brunilda e pelo Alberto, filho do casal. A história tem como pano de fundo o dia em que chegou um embrulho da Tia Brunilda: uma bolsa amarela, grande e com alça. A partir desse momento, a bolsa amarela passa a ser o abrigo das histórias de Raquel e suas vontades. Ali suas vontades estavam protegidas dos olhares do outros.
A leitura fica ainda mais rica quando se percebe que Lygia Bojunga faz uma crítica à sociedade patriarcal ao criar o desejo de ser menino em Raquel, especialmente em uma das pautas históricas mais relevantes: a autonomia da mulher e a conquista do espaço público, rompendo com questões morais até então impostas por uma sociedade machista. Torna-se evidente, quando a personagem afirma: “Porque eu acho muito melhor ser homem do que mulher. […] olha: lá na escola, quando a gente tem que escolher um chefe pras brincadeiras, ele é sempre um garoto”.
Há outras questões que podem ser pensadas, por meio da narrativa é possível perceber que a autora faz uma crítica sobre a correria do cotidiano que acaba automatizando a comunicação com as crianças, mostrando que muitas vezes as famílias não reconhecem o protagonismo infantil, por isso a vontade de crescer da personagem. Esta tem consciência crítica, mas não pode ser livre para ter opiniões e questionar a visão de mundo que conhecia. Por diversas vezes a personagem é questionada: “Como é que você pode pensar tanta besteira, hem, Raquel?” A autora chama atenção para a transmissão paterna que muitas vezes não é um processo de atenção, cuidado e, principalmente, disponibilidade – não só de tempo, mas de afeto.
No caso da vontade ser escritora, é a força que Raquel pode, portanto, reinventar mundos e produzir novas configurações para além da sua realidade. Da mesma forma que na narrativa, no cotidiano inúmeras crianças estão em um contexto de relações não-simétricas, onde a sua opinião é evitada. No final, terminei o livro com a sensação de ter lido não apenas uma novela sobre a infância, me chamou a atenção a capacidade que a autora tem de falar sobre as configurações familiares que pode ser um espaço denso quando não há dialogo e escuta de fato, por isso a importância do “pertencimento”, de compartilhar uma identidade com os que estão à sua volta. Além de permitir uma imersão nos conflitos internos da personagem, a dimensão do íntimo é retomada a partir de uma perspectiva política, Bojunga nos deixa a mensagem que o encontro com a diferença é uma tarefa ética/política que não deve ser esquecida. A leitura é fluida e convidativa.
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