Universidades negras como lugares de pertencimento

Alexandra Lima da Silva

 

E eu tive a sensação de que pertencia.
Eu tive a sensação de que poderia ser alguém.
(Tracy Chapman, 1988)

O interesse em pesquisar as faculdades e universidades historicamente negras (historically Black colleges and universities – HBCUs) surgiu após realizar estágio pós-doutoral com bolsa CAPES no ano de 2019. Na ocasião, pude visitar alguns lugares de memória e resistência negra na região Sul dos Estados Unidos, na chamada Trilha dos Direitos Civis. Essa experiência me possibilitou compreender as HBCUs também como lugar de memória em disputa, um patrimônio rico, repleto de significados, pois, conforme ensina Canclini (1994, p. 96): “Se é verdade que o patrimônio serve para unificar a nação, as desigualdades na sua formação e apropriação exigem que o estude, também, como espaço de luta material e simbólica entre as classes, as etnias e os grupos”.

Chamou minha atenção a existência de universidades majoritariamente compostas por pessoas negras (no corpo discente e docente), algo que eu nunca tinha presenciado no Brasil. Qual é o significado de pertencer a uma universidade historicamente negra? Qual é o lugar das HBCUs na História da Educação? O que se sabe sobre o assunto no Brasil?

Ao pesquisar os termos “HBCUs” e “universidades historicamente negras” no catálogo de teses e dissertações da CAPES, o resultado foi: “Nenhum registro encontrado para o termo buscado”. Ao procurar por “black college”, o resultado foi a localização de apenas um (1) trabalho. A dissertação de mestrado defendida por Hasani Eliotério dos Santos (2020) analisou o processo de criação da Faculdade Zumbi dos Palmares, inaugurada na emblemática data de 20 de novembro de 2003 na cidade de São Paulo. De acordo com Hasani Eliotério dos Santos (2020), trata-se de uma instituição de natureza privada e comunitária e que possui semelhanças e diferenças com as HBCUs.

Especificamente sobre a Faculdade Zumbi dos Palmares, localizei outros dois trabalhos acadêmicos relevantes. A autora Lourdes José da Silva  (2010) interrogou no título da tese por ela defendida: a Faculdade da Cidadania Zumbi dos Palmares pode ser compreendida como “um quilombo do século XXI”? Nas palavras da autora, “a Faculdade da Cidadania Zumbi dos Palmares é resultado da configuração de uma classe média negra paulistana em expansão” (SILVA, 2010, p. 11). A tese de doutorado defendida por José Vicente no ano de 2012 defendeu o argumento de que a Faculdade da Cidadania Zumbi dos Palmares foi uma proposta alternativa de inclusão do negro no ensino superior. Para este autor,

entende-se a proposta da Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares como uma modalidade de política pública e afirmativa no âmbito privado, compreensão possível somente se sua concepção puder ser contemplada dentro das melhores definições de política pública e ação afirmativa (VICENTE, 2012, p. 14).

Com exceção dos estudos sobre a Universidade Zumbi dos Palmares, criada no Brasil do século XXI, não localizei trabalhos acadêmicos no Brasil especificamente sobre as HBCUs criadas no século XIX nos Estados Unidos, e que examinem as recentes e extremamente importantes produções sobre a história da educação da população negra. 

Seriam as universidades historicamente negras um capítulo ignorado ou pouco contemplado nas pesquisas e manuais de História da Educação no Brasil?

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