Claudia Hlebetz
A História do Brasil, demarcada em linha de tempo, desenhada em causas e consequências, está baseada em documentos e representada em monumentos, que expressam, em sua maioria, uma única forma – hegemônica – de percepção e compreensão da realidade vivida e da própria História do país.
É contada a partir do ponto de vista das classes dominantes que pretendem que sua visão de mundo seja a única visão possível. Uma história assim pensada restringe a compreensão de quem somos, secundariza ou apaga a cultura e a vivência de povos dos quais somos herdeiros.
O Brasil tem sua origem marcada pela invasão dos portugueses, pela imposição de um pacto colonial que se amplia na escravização de povos africanos num processo de violência e opressão. Nas terras “descobertas” viviam mais de 5 milhões de indígenas no território por eles denominado de Terra das Palmeiras ou Pindorama. O “descobrimento” implicou no genocídio desses povos originários pela força, pelas doenças dos brancos invasores, pelas guerras de resistência contra a invasão, pelo trabalho forçado.
Ainda hoje, no contexto da contínua violência que se dá através da invasão de suas terras, no desmatamento sem freio, no garimpo ilegal, as comunidades indígenas existem e resistem, física e culturalmente, somando, aproximadamente, 900 mil pessoas que integram mais de 200 etnias que vivem em todas as regiões do território brasileiro.
O empreendimento econômico, iniciado no século XVI, o projeto de dominação de novas terras por parte das nações europeias nas Américas, na África e na Ásia foi fundamental para o desenvolvimento sócio, político e econômico do continente europeu. Nas Américas, no geral, e no Brasil, especificamente, esse processo se realizou de forma intensa e produtiva através da mão de obra escrava: o acúmulo e a concentração de riqueza nas mãos da nobreza europeia e da burocracia estatal colonial só foi possível pela escravização de povos africanos. Também eles foram submetidos à força e a violência cotidianas ontem e hoje.
É preciso entender que no decorrer da História do Brasil não houve apenas genocídio, mas também etnocídio: o apagamento da cultura e da vivência dos povos que são, também, nossos ancestrais. Cultura e vivência expressa em nossa língua, em nossas histórias de vida, em nossos modos de ser e de viver. Refletir sobre a História é refletir sobre nossa identidade e nossa memória que é feita de documentos e monumentos, mas é feita também de histórias, acervos, lendas, contos populares – patrimônio narrativo que passa de geração a geração.
Estes são os fundamentos do projeto Histórias de Pindorama: histórias, memórias e infâncias. Contar a História do Brasil do ponto de vista das histórias vividas, valorizando o legado dos povos sementes dos quais somos herdeiros. O projeto tem por objetivo contar a História do Brasil para crianças e adolescentes de forma lúdica, utilizando-se da brincadeira e da contação de histórias. A pesquisa dará estrutura a uma coleção de Caixas da História, disponibilizadas virtualmente para imprimir, recortar e montar com cenário, personagens e acessórios.
Sobre a autora
Claudia Hlebetz é historiadora e educadora, coordenadora geral do projeto Histórias de Pindorama. É formada em História pela PUC/RJ, especialista em ação educativa e cultural em museus pela UNIRIO e em literatura infanto-juvenil pela UFF, mestra em ciência da informação pelo CNPq/IBICT-UFRJ/ECO e doutora em educação pela UFF.
Em 2005 criou a Emabrinq Serviços e Brinquedos Educativos Ltda., empresa que tem como fio condutor o projeto Histórias de crianças, que tem como fios condutores identidade e memória, os territórios das infâncias, brinquedos e brincadeiras, as histórias e o patrimônio narrativo brasileiro e latino-americano.
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