Por mais barulhos!
Jacqueline Caixeta
Geralmente professores se preocupam muito com quem está, constantemente, perturbando as aulas, conversando muito, rindo e brincando fora da proposta, atrapalhando com barulhos, levantando do lugar o tempo todo. Enfim, os bagunceiros tiram o sono de qualquer professor.
Será que uma criança ou adolescente quietos o tempo todo, em silêncio, sem interagir com a turma, sossegados no seu canto é algo tranquilo? Que tranquilidade é essa? Para quem essa paz deva interessar?
Infelizmente, se formos fazer uma pesquisa, os pais de alunos quietos são chamados bem menos do que os pais dos agitados. Aquele aluno silencioso não incomoda a aula e, tá tudo bem.
Não, não está tudo bem!
Esse aluno pode não ter conseguido uma socialização com os demais por diversos motivos que vale a pena chamar atenção dos pais. Pode ser, desde uma simples adaptação que não aconteceu como deveria, e aí cabe à escola fazer um trabalho específico para proporcionar essa interação, a um problema emocional oculto ou mesmo uma deficiência grave que não foi diagnosticada.
O olhar do professor atento é fundamental no caso dos alunos quietos. Eles podem camuflar muitas questões com aquele silêncio extremo. Lógico que existem aqueles mais tímidos e isso não é um grande problema, mas nada em excesso é normal e vale a pena investigar. O silêncio pode estar gritando por algo imperceptível, e só um olhar atento, cuidadoso e carregado de competência técnica e afeto poderá desvendar o que acontece com aquele aluno silencioso.
Quando um professor não se preocupa tanto com o silêncio de seus alunos, ele pode ficar feliz por ter uma sala sossegada, quieta e calada, sem grandes problemas e conflitos, tão naturais e até necessários para a relação de ensino aprendizagem.
Isso me leva a refletir sobre o tipo de educação que estamos praticando. Mesmo apesar de falar tanto no protagonismo do aluno, na participação ativa e questionadora do educando, exercemos uma prática distante do nosso discurso quando não nos atentamos para os calados. Para um professor, o aluno quieto ainda representa uma sala de aula tranquila, mas será que é isso que realmente queremos?
Tá certo que disciplina e organização são fundamentais para qualquer trabalho acontecer com qualidade, mas daí a ficar satisfeitos com o silêncio é uma grande distância quando almejamos a educação que tanto defendemos em nossos discursos. Muitas vezes somos hipócritas em nossas ações e precisamos refletir sobre isso. Uma sala de aula de alunos que, em sua grande maioria, não se manifestam, muito diz de uma educação castradora. Uma educação que ainda usa o silêncio e omissão como tarefas a ensinar e reproduzir uma sociedade calada e omissa.
O silêncio de um determinado aluno é tão perigoso quanto as explosões de outros. Precisamos parar de nos satisfazer com essa prática que nos descansa no dia a dia quando temos alunos quietos e pensar, em primeiro lugar, nesses alunos que ainda não conseguem se soltar, o que será que eles gritam com aquele silêncio? Chamar os pais, pedir que acompanhem, investiguem, pode não ser apenas um perfil tímido. Depois, precisamos repensar se a educação que queremos, que tanto falamos em debates e bate papos pedagógicos, acontece com alunos calados, quietos, que não desafiam, não perguntam, não se manifestam.
Uma turma de “boizinhos de presépio”, sem dúvida alguma, está reproduzindo uma sociedade de cidadãos que não sabem, e nem querem saber, o que representam, se têm direitos, deveres, não se reconhecem como seres históricos e construtores de história.
O barulho pedagógico é extremamente importante para a produção criativa do conhecimento. É na discussão dialética, no levantamento de hipóteses, na dúvida e questionamentos que as descobertas são feitas. Geralmente é nas melhores discussões e conflitos que surgem as melhores ideias. Para se construir um conhecimento, é preciso errar e discutir as hipóteses do erro para que os caminhos dos acertos aconteçam. Por fim, uma sala de aula muito quieta diz de poucas reflexões, poucos questionamentos, pouca interação, e isso não é, nem de longe, educar para libertar e transformar. A educação não pode estar à serviço do silêncio, sala de aula é lugar de barulho, um barulho criativo, desafiador, que tira as pessoas do senso comum e as convida para atuarem com mais eficácia na vida.
Professor, fique atento aos seus alunos silenciosos, eles gritam por ajuda.
Fique também atento quando você se sentir feliz demais porque a sala é sempre um sossego. Cuidado, você pode estar fazendo tudo, menos sendo um educador que promove a criatividade e ousadia, tão necessárias para que seus alunos sejam libertos de uma educação que pouco, ou nada, educa. Você pode estar reproduzindo uma sociedade omissa e subserviente.
Com afeto,
Jacqueline Caixeta
Parabéns Jaqueline. Concordo com sua preocupação. Pois sempre pensei sobre isso: Professores omissos quanto a criança silenciosa é retratar a falta de olhar psicopedagógico nesse aluno. Um esclarecimento, para Professores engessados no ensinar, é de essencial importância do ensinar e o educar. E nunca deixar de ter empatia. Pois somos vítimas de uma educação falha do quesito comportamento.
Muito interessante essa reflexão, nós pais precisamos ficar mais atento as atitudes e prestar atenção em seus comportamentos..
Ótima reflexão Jacqueline!