Sobre o movimento conservador e a militarização das escolas

Marcelo Silva de Souza Ribeiro

Sob certos olhares que testemunham essa segunda década do século XXI, a mirada é afetada por espanto, temor e, às vezes, tristeza. Alguns retrocessos em relação aos direitos humanos, a sensação de uma escalada quanto a incapacidade de lidar com a diferença, a não superação das desigualdades sociais e os impactos ambientais, a despeito das condições favoráveis para empreitadas que visem suas superações, são realidades cada vez mais contundentes e que deixam muita gente com esses afetos desanimadores.

Desse cenário, um movimento tem chamado a atenção, que é o “movimento conservador”. Uma importante distinção é notar que o
“movimento conservador” não se iguala ao que é nomeado, convencionalmente, de “tradicional” (embora possa ter algum tipo de relação). O tradicional, seja no jeito, nos costumes ou estilo de vida, diz respeito ao ser diferente, a particularidade de um indivíduo ou grupos sociais viverem suas vidas e até mesmo um posicionamento crítico à “obsessão pelo novo”. O “movimento conservador” já corresponde ao anseio de um retorno ao passado, como se “lá” estivesse o “paraíso”. Seria uma espécie do mito romântico de uma vida social perfeita e que fora perdida ou desvirtuada. Nesse caso, o “movimento conservador” imprime uma démarche social de olhar para trás, de desejar algo que supostamente se perdeu. A sociedade, portanto, não aspiraria mais projetos de futuro, mesmo que galgado em reflexões críticas sobre a realidade presente.

No campo escolar há inúmeros desdobramentos desse fenômeno, como é o caso da “escola sem partido”, do combate à escola pública laica e da militarização da escola. Sobre esse último desdobramento, da militarização da escola, ou melhor, tomar o modelo militar como “O modelo” hegemônico para as escolas, tem tudo a ver com o que caracteriza o “movimento conservador”. Nesse particular, há uma idealização de que a boa escola que fora perdida era a escola onde havia o respeito, a disciplina, a moral, a boa conduta e a autoridade como pilares centrais. Assim, a escola militar é identificada e interpretada comosendo aquela que resguardaria esses elementos necessários para superação do que é visto como o “fracasso da escola”. A escola de outrora seria, então, imaginada como a “boa escola” e o desejo de voltar a esse tempo encontraria identificação no modelo militar de escolas.

Nada tão falacioso quanto essa “descoberta” de que a escola militar seria a redenção para os problemas da escola. Em primeiro lugar, e digo por experiência própria na condição de psicólogo e pesquisador, a escola militar tem, de modo geral, apresentado bons índices, resultados nos diversos exames, etc. muito mais pelos investimentos (materiais e humanos) e relações que se constroem via reforçadores positivos do que pelo simples rigor da ordem (ou autoritarismo) que se supõe existir. Não é o medo da farda que faz com que os alunos desenvolvam a disciplina, autonomia e envolvimento aos seus processos formativos, mas o orgulho pela farda e o amor pela escola, isso como fruto de todo um dedicado trabalho eivado pelo corpo escolar. Assim, portanto, querer importar o modelo militar de escola como sendo o salvador apenas tendo como suporte o imaginário de uma autoridade que se daria pelo rigor da ordem ou do comando é algo fadado ao fracasso.

Em segundo lugar,  há a equivocada interpretação de que a escola de outrora era melhor porque havia o rigor da ordem e a disciplina autoritária. A escola de outrora talvez nem fosse realmente essa a ser imaginada e muito menos de uma maneira tão homogênea (como se todas as escolas tivessem sido iguais). Ademais, cada tempo tem suas especificidades e não pode ser comparado de uma maneira hierárquica e evolutiva. A(s) escola(s) de ontem respondeu(ram) com seus acertos e erros à sua época, assim como a(s) escola(s) de hoje responde(m) bem e/ou mal às atuais demandas.

O importante disso tudo é aprendermos com os legados, refletirmos criticamente em relação ao que estamos vivendo, entendermos as pluralidades dos modelos escolares e projetarmos, sempre, futuros melhores. Afinal, a utopia viva é aquela que toma o futuro como um projeto possível que é feito no presente via as lições do passado.


Imagem de destaque: Governo do Tocantins

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