“Sabe se sentir no meio de uma guerra? Foi isso.” – exclusivo

Daniel Cavalcanti de Albuquerque Lemos*

Assim uma aluna me narrou suas impressões sobre o dia 29 de novembro em Brasília. Estávamos lá, universitários, professores, técnicos das universidades federais, junto com aposentados, estudantes secundaristas, sem-teto, sem-terra, coletivos feministas e LGBT’s. Enfim, éramos muitos, vindos de todas as partes do Brasil para protestar contra a PEC 55, contra o governo ilegítimo e um Congresso repleto de corruptos. Com nossas faixas, palavras de ordem e reivindicações, nos concentramos na altura da catedral de Brasília e saímos em passeata até o gramado do Congresso.

Existia uma energia no ar, as pessoas olhavam e sorriam carregadas de determinação e esperança. Sabíamos que estávamos cumprindo um papel importante. O céu cinza de Brasília predizia o que nos esperava: cumpríamos nosso direito democrático de protestar, mas não vivemos tempos de direito, não na opinião dos que estão no governo. Assim, logo que chegamos ao gramado, recebemos o tratamento dado a quem não se cala diante dos absurdos: uma chuva de bombas de gás nos atingiu. Além dos efeitos do gás, as bombas provocam um impacto psicológico grande, um som ensurdecedor, e assim sentimos a sanha de uma policia militarizada, covarde e fascista que transformou uma manifestação legítima em um cenário de massacre.

Estava no gramado cercado de bombas e logo vi a correria das pessoas que fugiam das delas. Uma professora da UEPB relatou que algumas pessoas da manifestação entraram no espelho d’água e que imediatamente a PM jogou gás de pimenta sobre elas, uma das mulheres que estava na água recebeu um chute no rosto de um policial e desmaiou, e que nesse momento tudo virou um caos. Senti os efeitos do gás, a queimação nos olhos, a ardência ao respirar e sensação de sufocamento, tudo potencializado pelo terror de ver pessoas atingidas ao meu lado, caídas no gramado e ver, ao fundo, a cavalaria da policia militar avançando sobre nós. Enquanto tentávamos socorrer os feridos, a chuva de bombas seguia sobre nossas cabeças. No céu, helicópteros da polícia orientavam a tropa em terra. A PM não queria controlar a manifestação, não queria nos impedir de avançar, queria nos expulsar, nos perseguir, causando o maior dano possível. Era a primeira manifestação de massa contra o governo golpista, e Temer queria passar um recado claro. Para isso agrediu senhoras, jovens, trabalhadores.

Mas em meio ao caos resistimos. As equipes de saúde, organizadas com voluntários pelo ANDES-SN, pela FASUBRA e por outras entidades socorriam os feridos; estudantes pegavam as bombas de gás e as afundavam em baldes de água, as cobriam com cones de trânsito, evitando assim sua dispersão; outros estudantes conseguiram deter por poucos momentos os avanços da PM, criaram uma barricada e colocaram fogo em alguns carros e, graças a isso, tivemos tempo de nos afastar. Tentamos nos reorganizar novamente diante da catedral de Brasília, mas a policia seguiu avançando. Enquanto isso, dentro do Congresso, um coquetel e pessoas observando o confronto enquanto se preparavam para votar a PEC.

Estava preocupado com minha segurança e com a segurança das minhas alunas. A maioria delas nunca tinha participado de uma manifestação e estavam vendo seu direito democrático ser duramente reprimido de forma absurda, com policiais treinados atacando pessoas desarmadas. Ao escurecer o cenário ficou cada vez mais tenso. Na dispersão as pessoas se perdiam, a polícia seguia perseguindo e atacando os grupos agora cada vez menores. Minhas alunas se refugiaram em um shopping próximo à rodoviária de Brasília, enquanto, pelo celular, eu recebia relato de feridos e presos. Nesse caos circularam até boatos de um estudante morto, que felizmente não se confirmou, mas todos que viveram o dia 29 em Brasília perceberam que poderia ter acontecido.

No fim, a PEC foi aprovada na primeira votação, mas não com nosso silêncio. Apesar da ausência real da CUT – a maior central sindical do país, que praticamente só compareceu com alguns balões – as entidades presentes levaram o ato à frente, e mesmo nesse cenário terrível, vi a coragem e determinação dos presentes, vi a coragem e determinação das minhas alunas, futuras educadoras, e me orgulho de ter testemunhado tudo isso, ter participado disso e tenho a certeza de que essa luta está longe de terminar.

Venceremos!

 

* Professor de história da educação da Faculdade de educação e do PPGE da UFJF

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