Resenha do filme “Entre os muros da escola”

Lucas Carneiro Costa

O filme “Entre os muros da escola” retrata a rotina comum de uma escola francesa, explorando as relações interpessoais e profissionais que ocorrem dentro da sala de aula: professores mais antigos orientando os mais novos (sobre as normas e os alunos, quem é ou não é comportado), castigos e punições, rotina, entre outras coisas do gênero.

Não é nada do que nós, educadores, já não estejamos acostumados a ver diariamente. Aliás, o que espanta é a total similaridade de estrutura, mesmo num país distante e com uma cultura diferente (apesar de ocidental). Cenas do filme que retratam jovens no intervalo/recreio escolar, conversas paralelas, alunos que sentam no fundo de classe e se distraem da aula, além do papel dos professores (como figuras de autoridade, sem qualquer tipo de relação amistosa com os alunos) e instituições como os conselhos disciplinares e de classe são comuns, mesmo aqui no Brasil.

Em suma, podemos dizer que o filme é dividido em duas partes: a primeira, que é uma contextualização, que nos apresenta a sala de aula e a volta às aulas, além de introduzir os personagens e suas personalidades dentro deste cenário; e a segunda parte, que mostra o desenvolvimento de todas as ações que foram descritas no filme e o desenrolar da história, focando na situação de um aluno específico, Souleymane, filho de imigrantes oriundos de Mali.

Sobre o professor protagonista, é observado que: ele é uma figura autoritária e central na sala de aula. É a sua voz que sobressai aos alunos. Não vemos qualquer tipo de liberdade para os alunos. Estes são obrigados a respeitá-lo e a obedecê-lo. Caso contrário, levam um tipo de advertência (é o que acontece, por exemplo, com uma aluna que se recusa a ler o texto). Por outro lado, o professor protagonista tem um papel mais crítico em relação aos seus colegas. É ele que levanta a hipótese (ou a possibilidade) para outros professores do aluno Souleymane poder retornar ao seu país de origem caso ele seja expulso. É ele que também questiona o papel do Conselho Disciplinar, já que todos os alunos que pararam ali foram expulsos. Ao prestar atenção no professor em questão, observamos que nenhuma situação ocorre de forma isolada. É por sua conta que Souleymane acaba indo ao conselho de classe (já que ele ofendeu duas alunas, que por sua vez haviam citado o nome de Souleymane, afirmando que os professores estavam o perseguindo, fazendo-o ficar chateado).

Sobre o aluno Souleymane, podemos observar que: a escola lida com as situações diárias de uma forma muito simplista, superficial e imediatista. Na escola, um problema ou uma situação é um fim em si mesmo, como se cada fenômeno não tivesse algo que o sustenta ou que o cria. Um exemplo claro é o caso deste aluno. Inicialmente, Souleymane é um garoto com dificuldades. Esquece o material, ofende os colegas, não cumpre os deveres e conversa durante a aula. Tem uma péssima reputação com os professores. Não sabemos o motivo que o faz se comportar assim na escola. No entanto, os professores e as autoridades escolares, segundo o filme, parecem não tentar entender o que de fato está por trás disso. Nenhum aluno é mau aluno por ser apenas ruim. Há diversos fatores que podem fazer com que um aluno bom se torne um aluno mau: dificuldades financeiras, sociais, intelectuais, condições psicológicas e físicas, falta de tempo, espaço, motivação, além da adaptação a um novo meio. Além disso, o caso do aluno Souleymane já era relativamente antigo. Ou seja, jamais foi feito um trabalho para tentar recuperá-lo ou para sequer tentar compreender a sua situação. Ao final do filme todos sabiam que se caso ele fosse expulso poderia retornar (contra a sua vontade e o prejudicando) ao seu país de origem. Não nos é informado qual foi o destino do personagem, mas somos levados a crer que não foi bom em qualquer um dos casos. Ele foi expulso da escola, então deve ter sofrido alguma consequência. Além disso, migrar de escola em razão de uma expulsão é completamente prejudicial – e o afasta da escola ainda mais. O título do filme tem total relação com esta situação. Afinal, a escola não termina em seu espaço físico delimitado – ela vai além e se estende para outros aspectos da vida do estudante.

Por fim, uma frase dita no final do filme é bem impactante e traz uma reflexão importante. Uma aluna diz ao professor que “não compreende o que fazemos”. Ela não se refere à escola de forma categórica, mas fica subentendido. Diz que não quer fazer um curso profissionalizante e pelo seu tom de voz podemos perceber que ela está sem esperança. O professor, contudo, não a entende.

De fato, o que fazemos na escola é tudo, menos educação. O processo é tão enrijecido que acaba se tornando apenas transmissão de conteúdo. Talvez, a escola tenha sido contaminada pela escolarização, num ponto em que é impossível diferenciar uma coisa da outra. Os alunos sempre enxergam a escola como uma etapa ruim da vida, mas que é necessária por conta do mercado de trabalho.

Será que um dia conseguiremos mudar a estrutura da escola e da sala de aula? É possível fazer com que as aulas fujam deste padrão? Como retirar a opressão, a pressão, o individualismo, a falta de empatia, o receio e todos os elementos ruins que permeiam e marcam a nossa experiência da escola? Todas foram questões que podemos levantar ao assistir ao filme e ler o texto.


Imagem de destaque: Imovision / Divulgação

 

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