Pregação anticientífica e interesses obscuros

Editorial da edição 268 do Jornal Pensar a Educação em Pauta

Nos últimos tempos tem sido lugar comum, no Brasil e no mundo, as atitudes e os pronunciamentos anticientíficos.  Essa, no entanto, não é uma novidade. Por razões variadas, as ciências, todas elas, em menos ou maior grau, seja por suas virtudes, seja pelos seus defeitos,  sempre foram vistas com suspeição por variados grupos e instituições sociais, notadamente grupos religiosos e políticos que têm como características a defesa do obscurantismo como estratégia de dominação.

Todavia, nas últimas décadas, aquilo que era feito em escala menor, em um templo, uma comunidade ou em pequenos grupos, passou a ter alcance e repercussões de escala planetária. Reforçados pelas facilidades de disseminação de informações trazidas pela internet, grupos anticientíficos passaram a alcançar públicos nunca vistos e a investir fortemente contra as ciências,  o conhecimento científico e as instituições que os representam.

Esquecem, no entanto, os arautos do obscurantismo, que as tecnologias que permitem os seus confortos e suas comunicações são, elas também, fruto das pesquisas científicas que tanto condenam e dizem desprezar. Assim, atitudes e pronunciamentos contra a vacinação, em defesa de que a terra é plana e/ou em defesa das mais esdrúxulas posições anticientíficas são postas em circulação pela internet, justamente uma das formas de objetivação mais complexas e atuais da pesquisa científicas.

A pandemia decorrente do Covid-19 (Coronavirus) que põe em pânico boa parte da população mundial, trouxe a ciência e sua capacidade de enfrentar os grandes problemas da humanidade para o centro do debate. Neste momento, muitos dos que têm publicamente demonstrado ceticismo em relação ao conhecimento científico têm cobrado das ciências uma solução para a crise.

É evidente que parte da “volta” para as ciências observadas em alguns dos seus críticos obscurantistas decorre do fato de que, no limite, a pandemia representa um risco à sua própria vida e de seus mais próximos familiares. No entanto, essa “volta”  não pode nos fazer esquecer que que as posições obscurantistas sempre esconderam interesses políticos e econômicos de dominação e exploração. De um modo geral, líderes políticos e religiosos com posições anticientíficas não têm dúvida em utilizar a mais avançada pesquisa científica quando estas corroboram para a manutenção de suas vidas (buscam remédios e  tratamento hospitalares sofisticados, por exemplo), assim como para defender e fazer valer os seus interesses políticos e econômicos.

Certamente, neste obscuro jogo de interesses, os que mais sofrem são os sujeitos mais vulneráveis, como as crianças e idosos no caso das vacinas e do evitamento ao tratamento recomendado pelos profissionais da saúde, e as populações mais pobres que são iludidas em sua boa fé pelos arautos desse obscurantismo celetista e de dupla moral: para mim, o melhor das ciências; para os outros, a pregação anticientífica e a promessa de curas milagrosas!

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Pregação anticientífica e interesses obscuros

Nos últimos tempos tem sido lugar comum, no Brasil e no mundo, as atitudes e os pronunciamentos anticientíficos.  Essa, no entanto, não é uma novidade. Por razões variadas, as ciências, todas elas, em menor ou maior grau, seja por suas virtudes, seja pelos seus defeitos,  sempre foram vistas com suspeição por variados grupos e instituições sociais, notadamente grupos religiosos e políticos que têm como característica a defesa do obscurantismo como estratégia de dominação.

Todavia, nas últimas décadas, aquilo que era feito em escala menor, em um templo, uma comunidade ou em pequenos grupos, passou a ter alcance e repercussões de escala planetária. Reforçados pelas facilidades de disseminação de informações trazidas pela internet, grupos anticientíficos passaram a alcançar públicos nunca vistos e a investir fortemente contra as ciências,  o conhecimento científico e as instituições que os representam.

Esquecem, no entanto, os arautos do obscurantismo, que as tecnologias que permitem os seus confortos e suas comunicações são, elas também, fruto das pesquisas científicas que tanto condenam e dizem desprezar. Assim, atitudes e pronunciamentos contra a vacinação, em defesa de que a terra é plana e/ou em defesa das mais esdrúxulas posições anticientíficas são postas em circulação pela internet, justamente uma das formas de objetivação mais complexas e atuais da pesquisa científica.

A pandemia decorrente do Covid-19 (Coronavirus) que põe em pânico boa parte da população mundial, trouxe a ciência e sua capacidade de enfrentar os grandes problemas da humanidade para o centro do debate. Neste momento, muitos dos que têm publicamente demonstrado ceticismo em relação ao conhecimento científico têm cobrado das ciências uma solução para a crise.

É evidente que parte da “volta” para as ciências observadas em alguns dos seus críticos obscurantistas decorre do fato de que, no limite, a pandemia representa um risco à sua própria vida e de seus mais próximos familiares. No entanto, essa “volta”  não pode nos fazer esquecer que as posições obscurantistas sempre esconderam interesses políticos e econômicos de dominação e exploração. De um modo geral, líderes políticos e religiosos com posições anticientíficas não têm dúvida em utilizar a mais avançada pesquisa científica quando estas corroboram para a manutenção de suas vidas (buscam remédios e  tratamento hospitalares sofisticados, por exemplo), assim como para defender e fazer valer os seus interesses políticos e econômicos.

Certamente, neste obscuro jogo de interesses, os que mais sofrem são os sujeitos mais vulneráveis, como as crianças e idosos no caso das vacinas e do evitamento ao tratamento recomendado pelos profissionais da saúde, e as populações mais pobres que são iludidas em sua boa fé pelos arautos desse obscurantismo celetista e de dupla moral: para mim, o melhor das ciências; para os outros, a pregação anticientífica e a promessa de curas milagrosas!


Foto: Yolanda Assunção

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