Pela via da emancipação: educação integral e cidade educadora – exclusivo

Marcelo Silva de Souza Ribeiro

 

Sem adentrar nos corredores da história, o sentido de “educação emancipadora” assume o entendimento de que o Brasil sairá da situação de precariedade social (desigualdades que tornam o país com enormes fossos sociais, regionais, étnicos, de gênero etc.) quando toda a sociedade tiver garantido seus direitos, sobretudo aqueles relacionados a educação de qualidade. Tal sentido, portanto, implica em uma perspectiva crítica e política da própria educação.

A partir dos trabalhos desenvolvidos no âmbito do grupo de pesquisa (Núcleo de Estudos e Práticas sobre Infância e Educação Infantil – NUPIE), da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF, tenho constatado a necessária luta por espaços públicos e por uma cidade onde as infâncias sejam contempladas, a premência de modelos que considerem a prática e a formação docente permanente; a criação de espaços institucionais para apoiar as famílias e o trabalho em rede para e na educação, envolvendo os mais diversos setores (saúde, segurança pública, assistência social etc.).

Considerando esses pontos, que representam sínteses das pesquisas e trabalhos do NUPIE é que apresento uma velha tese e cerne deste texto, ou seja, que a questão da educação deve ser entendida como algo maior que a escolarização – por mais que esta seja importante. Assim, a educação não deve ser vista como algo localizado apenas nos intramuros escolares. A educação, incluindo o processo de escolarização, deve ser assumido, em sua responsabilidade, por toda a sociedade.

É também nesse sentido que a escola, agora sim esta instituição em particular, precisa ser gestada, concebida e exercitada, na e a partir de suas articulações com outros equipamentos sociais. Um exemplo seria a articulação da escola com as unidades básicas de saúde, com as associações de bairros, etc. A escola não pode ser um componente isolado no campo social. Entretanto, isto não quer dizer que a escola perca a sua identidade ao se esparramar entre outras instituições e órgãos, mas tão somente o sentido de que a escola precisa estar articulada para enfrentar seus desafios.

Não adianta, nesses termos, por exemplo, que a escola se envolva com as questões da violência, das condutas ou mesmo do comportamento moral se não há também um engajamento e uma articulação com as mídias e os meios de comunicação. Estes têm um papel educador (muitas vezes deseducador) à medida que induzem e influenciam comportamentos, atitudes e constroem representações sobre o mundo. É claro que essa discussão sobre a regulação dos conteúdos pelos meios de comunicação é polêmica, mas precisa ser encarada como pacto social, no sentido de se entender que todos educam, de que toda a sociedade é responsável pelo processo educativo, sobretudo, neste caso, das crianças e dos jovens.

Sobre essa necessária articulação das escolas com os outros entes sociais e a visão de que os processos educativos não estão restritos às escolas é que o Programa Mais Educação aparece como uma possibilidade inspiradora. Apesar das legítimas críticas dirigidas ao programa, sobretudo no que diz respeito às dificuldades de operacionalização, o Mais Educação não deixa de ser um ensaio, uma visada para a educação integral, esta que tende a chegar secularmente atrasada no Brasil.

Ainda sobre o Mais educação, é importante pontuar que não significa o “mais do mesmo”. O Mais Educação, que remete aquela ideia freiniana de “ser mais”, implica em uma educação que, assumindo seus compromissos técnicos, instrumentais e informacionais, se propõe formações críticas, onde o sujeito seja visto e se veja em um contexto social, histórico e também se situe no coletivo, engajado com os desafios do seu tempo.

Por sua vez, a educação integral, base almejada do Mais Educação, traz uma concepção de desenvolvimento integral do sujeito. E isto não tem nada a ver com a duplicação do tempo escolar. A educação integral visa o desenvolvimento completo do sujeito e tem, em seus fundamentos, o sentido emancipador.

Uma outra coisa ainda a destacar é a importância de superar a dicotomia entre as habilidades técnicas e de conteúdos com a formação crítica. É importante que a criança se alfabetize e que apreenda os conhecimentos básicos, mas que também tenha uma capacidade de reconhecer criticamente seu mundo e que se forme a partir de valores republicanos, éticos, solidários e humanísticos.

Toda essa ideia de educação integral e educação emancipadora remete, por sua vez, ao desfaio da operacionalização. Assim, como uma concepção de educação, que é algo maior que a escolarização, pode ser operacionalizada?  Entendendo que os sistemas avaliativos induzem os resultados e os processos, como pensar e colocar em práticas avaliações condizentes com essa proposta? Eis um ponto aberto e que necessita de atenção. Afinal, o país necessita amadurecer a cultura avaliativa e isto significa efetivar sistemas complexos e integrados de avaliação, mas avaliações que não fiquem apenas nas esferas quantitativas ou de produtos.

Mesmo que o PNE, para uns, tenha suas limitações ou que já indiquem algumas dificuldades, não é demasiado dizer que uma expressão do exercício da cidadania, da participação. Talvez, essa característica já indique sua natureza emancipatória e envolvente. Isto significa dizer que o PNE carece de ser traduzido, nas bases daqueles que o fazem acontecer, a partir da ideia de que educação é dever do Estado, mas de um Estado que medeie a responsabilização de toda a sociedade e não apenas que recaia nos lombos da escola.

Daí que o conceito de cidade educadora e, por conseguinte, de educação cidadã parecem atrativas para a efetivação de políticas públicas como é o caso de um Plano Municipal de Educação.

Na verdade todas as cidades são educadoras. Umas, obviamente, são mais educadoras do que outras, umas são educadoras para a maioria e outras o são para minoria. O importante, e entendo como pergunta fulcral, é questionar o grau de educabilidade que se deseja para a cidade. Que cidade sonhamos? Que sociedade almejamos?

Então, se a educação é algo que não deve estar reduzido aos processos de escolarização (por mais que sejam importantes) e de que a escola não pode assumir toda a responsabilidade do projeto educativo de uma cidade, há que se pensar e praticar a educação como algo que todos devem estar imbuídos. É importante com isto remarcar que o Estado (no que diz respeito aos seus três entes) tem papel fundamental nesse processo de responsabilização. Assim, o Estado participativo passa a ter um papel fundamental no processo de conceber a educação como algo maior, no seu sentido emancipatório.  Particularmente, não vejo como uma cidade se torne educadora sem que reconheça, exercite e desenvolva, para além das suas funções tradicionais, uma função educadora, ou seja, que assuma a intencionalidade e responsabilidade cujo objetivo seja a formação, promoção e desenvolvimento de todos os seus habitantes, começando pelas crianças e pelos jovens.

Este texto foi elaborado, incialmente, para atender ao convite de uma mesa redonda do I Fórum Municipal de Educação de Petrolina – PE (2014 – 2024), cuja a temática foi “Educação Cidadã e de Qualidade para Todos”.

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