O país das maravilhas

Cleide Maria Maciel de Melo

O Brasil cantado em versos pelos simbolistas, o Brasil desenhado na memória dos saudosistas, o Brasil sonhado pelos progressistas… não é esse o país das maravilhas a que me refiro. Trata-se do lugar metafórico, “mapeado” pelos sonhos de uma personagem: a Alice.

Foi nas andanças pelos “países maravilhosos” de uma livraria que encontrei a obra traduzida por Nicolau Sevcenko (Lewis Carroll. Alice no país das maravilhas. Tradução: Nicolau Sevcenko. Ilustrações: Luiz Zerbini. São Paulo: SESI-SP Editora, 2018). O espanto por encontrar o nome de Sevcenko na capa, aumentou minha curiosidade. Eu sabia que levaria o livro para casa, mas não esperei para começar, ali mesmo, a leitura…

Considerado um clássico da literatura nonsense traduzir o Alice não deve ter sido uma tarefa fácil. Resolver o desafio de manter as características do absurdo, numa escrita clara, dando sentido ao que é sem sentido, requer mais que conhecimento das línguas: exige muita sensibilidade, conexão com o mundo da infância, trânsito entre tempos e lugares tão distintos como a Inglaterra vitoriana e o Brasil dos nossos tempos. Já de início, a tradução dos poemas chamou minha atenção. Confesso que mesmo tendo lido muitas versões/traduções dessa obra, ainda não havia sentido tanto encanto na leitura de sua parte poética. O jogo de palavras no original Do cats eat bats? (Descendo à toca do coelho), geralmente traduzido por Gatos comem morcegos?, com Sevcenko “vira” Angorás comem andirás? E assim, o tradutor segue nos brindando com suas escolhas, inclusive com suas “traições”!

As ilustrações fazem um belo “casamento” com a história/tradução. Impossível imaginar o texto de Sevcenko acompanhado dos desenhos feitos por John Tenniel, para a versão original. Não sei se as crianças de hoje teriam medo das figuras produzidas em 1865. Mas, certamente, tais imagens não carregariam a leveza e o estímulo à imaginação proporcionadas pelas montagens fotográficas feitas por Luiz Zerbini, sobre a base de cartas de baralhos do mundo inteiro.

No Posfácio, o historiador se revela! Em poucas palavras, muito da história da produção desse livro nos é contada. Assim, ficamos sabendo que os escritores de literatura infantil inglesa do século dezenove se sentiam desconfortáveis com as exigências de uma escrita que traduzisse o conservadorismo cultural e a moral puritana. Que Lewis Carroll, ao assumir a perspectiva da molecada, colocou de ponta-cabeça a própria cultura vitoriana, expondo o mal-estar, a impostura e a esterilidade de uma sociedade fechada e repressiva. E ainda que, com sua obra, Carroll iria influenciar escritores tanto de livros para crianças quanto para adultos, plantando a semente da transformação estética que está na raiz da cultura contemporânea.


A pequena nota sobre os autores, registrada nas páginas finais do livro, nos conta que Nicolau sempre teve um encanto especial por Alice… desde quando o leu na infância. Esse leitor de Alice no país das maravilhas resume tudo num curto comentário: … é um livro surpreendente e divertido. Mas é sobretudo um jogo sutil de criaturas, linguagem e situações que implodem qualquer sistema fechado, fixo ou hierárquico de representações. Ele foi escrito como um antídoto contra o embotamento da imaginação, o travo da inteligência e a contenção da graça. Quando foi que decidiu por fazer sua tradução? (Sevcenko faleceu em 2014; esta 1ª edição data de 2018). Para mim, ainda um enigma…

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