Narrativas de professores sobre a deficiência – exclusivo

Alexandro Braga Vieira

Renata Duarte Simões

No contexto atual, temos direcionado atenção para os cotidianos educacionais visando lançar uma escuta sensível sobre as narrativas produzidas por professores e pedagogos acerca dos modos de ser/estar de estudantes com deficiência que vivenciam processos de inclusão escolar. Essas narrativas têm indicado pistas para compreendermos como esses sujeitos vêm sendo significados e como essa significação tem produzido barreiras para o acesso ao currículo escolar.

Em muitas situações, essas narrativas fazem correlações entre a deficiência e a impossibilidade de a pessoa com algum tipo de limitação poder aprender, conjugando a diferença aos pressupostos da desigualdade e da exclusão social/escolar, dificultando o acesso ao conhecimento sistematizado. Nessa direção, a escola é significada como um ambiente de socialização para os estudantes com deficiência, ou seja, como um espaço reduzido à convivência entre pares, mas sem um compromisso social e ético com a apropriação do conhecimento.

O cenário que faz com que a diferença seja significada como desigualdade vem permitindo que os pressupostos da inclusão e da exclusão escolar se constituam de forma simultânea, pois ao passo que o estudante com deficiência é incluído na escola, nela passa a vivenciar momentos de exclusão, principalmente no que se refere ao que é mediado pelos professores em sala de aula. A exclusão deixa de se materializar no acesso à escola para se constituir no acesso ao conhecimento.

Essa situação tão presente nas unidades escolares e que ainda desafia as políticas de inclusão escolar de estudantes com deficiência precisa ser analisada de maneira crítica, tendo em vista ser consequência de uma conjuntura social mais ampla, que prioriza comportamentos, modos de existência e percursos de apropriação do conhecimento dentro de padrões pré-determinados, desvalorizando outras possibilidades de a pessoa ser/estar no mundo.

A escola como uma instância que contribui com a constituição dessa sociedade, sofrendo, consequentemente, influências dos modos como as relações sociais nela se estabelecem, acaba por também reproduzir várias situações promotoras de exclusão social/escolar. Tal como a sociedade moderna, que prima por um estereótipo de sujeito com características voltadas para o mundo do trabalho e para o desenvolvimento econômico, a escola se organiza pedagogicamente a partir de um ideário de estudante que se adéqua a propostas curriculares enrijecidas, avaliações unilaterais, linhas de raciocínio padronizadas e comportamentos que não alteram a rotina da sala de aula, pois a qualidade do ensino se constituirá a partir do sujeito que aprende de maneira não problemática e dentro da proposta de ensino do professor. Todos aqueles que não se adéquam a esse projeto de humano passam a ser vistos como não propensos à convivência escolar e incapazes de aprender.

Esse conjunto de imagens constituídas sobre a deficiência tem levado professores a produzirem narrativas sobre os modos de ser/estar de estudantes apoiados pela modalidade de Educação Especial que vivenciam processos de inclusão na escola de ensino regular. Essas narrativas vêm sempre carregadas de “nãos”: não falam; não simbolizam; não dão feedback ao professor; não acompanham a turma; não apresentam possibilidades de aprendizagem; não se locomovem, dentre outros muitos “nãos” que podíamos aqui elencar.

Nesse contexto, há de se pensar que as narrativas produzidas por professores sobre os processos de escolarização de estudantes com deficiência e seus modos de ser/estar na sociedade e na escola precisam ser problematizados, tanto pela formação inicial e continuada quanto pelas políticas de Educação Especial, tendo em vista que a negação do direito à apropriação do conhecimento sistematizado tem se colocado como uma realidade a ser vencida.

A presença do “não” na escolarização dos alunos tem trazido muitas consequências para o desenrolar da Educação Especial na escola de ensino comum. Com relação à escola, tem levado os professores a significarem-na como um espaço-tempo não capaz de mediar os processos de ensino-aprendizagem de alunos que possuem algum tipo de comprometimento, seja ele físico, psíquico, intelectual e/ou sensorial. Essa categoria (o não) também tem implicado no modo como os docentes se subjetivam professores mediante o desafio de escolarizar estudantes com essas condições. Desenvolvem um sentimento de não-saber-total, ou seja, a ideia de que todos os seus conhecimentos e experiências profissionais são insipientes ou frágeis mediante a presença física do aluno com deficiência.

Professores, com vasta trajetória formativa e profissional no campo da alfabetização, por exemplo, dizem “não” saber o que fazer com o estudante com deficiência na escola de ensino comum. Parece que tomados por esse sentimento de “não-saber-total” se sentem paralisados, esquecendo-se de suas práticas pedagógicas, dos modos como organizam o trabalho pedagógico para a mediação da leitura e da escrita, de como apoiam os alunos (seja no coletivo da sala de aula, em grupos ou individualmente).

Vale lembrar que o fato de o professor buscar superar o não-saber-total e reconhecer que dispõe de saberes-fazeres importantes para a mediação dos processos de ensino-aprendizagem de alunos com indicativos à Educação Especial não subtrai o direito de investimentos em sua formação (seja ela inicial e/ou continuada) e a constituição de apoios pedagógicos, sempre que os alunos assim demandarem.

Os momentos de formação continuada podem ajudar os professores a refletirem a respeito do que narram sobre os alunos, mas também indicam que os docentes precisam assumir a apropriação do conhecimento como uma ação que sustenta a função social da escola. A reflexão crítica dessas narrativas, nos momentos de formação inicial e continuada, tem apontado possibilidades para os professores reverem seus posicionamentos sobre a escolarização dos alunos, potencializando, assim, os saberes-fazeres docentes e as práticas pedagógicas.

O debate crítico sobre as narrativas dos professores e o investimento na formação continuada podem contribuir para a superação de práticas excludentes e para a ressignificação dos alunos com deficiência, favorecendo a aprendizagem e o envolvimento nos currículos escolares, em um caminho de valorização das subjetividades, das diferentes experiências, dos conhecimentos e modos de fazer.

Renata Duarte Simões – Professora do Centro de Educação – UFES – Departamento de Linguagens, Cultura e Educação

Alexandro Braga Vieira – Professor do Centro de Educação – UFES – Departamento de Educação, Política e Sociedade

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