Folha Universal

Dalvit Greiner de Paula

Domingo de sol, voltando para casa, atenção ao sinal vermelho e recebo um jornal: a Folha Universal. Gostei: tem a Folha de São Paulo (às vezes comunista, às vezes capitalista, dependendo de quem lê) e tem a Folha Universal. Várias coisas me chamaram a atenção, além do entregador: pareceu-me, sim, um voluntário da igreja. Não era um menino de sinal. Domingo à tarde, aquele sol maravilhoso e o cara ali, bem trajado, bem alimentado, sem pedir nada em troca. Apenas o seu sorriso e aceite. O jornal ficou sobre a mesa por quinze dias e então resolvi lê-lo.

O jornal é da Igreja Universal do Reino de Deus. Isso não vem escrito na capa, mas fica óbvio até mesmo para os incautos. Tem dono: o bispo Edir Macedo, portanto qualquer notícia ou reportagem que vai contra os seus interesses não encontrará abrigo naquelas páginas. Como doutrinação o que vemos ali são muitas e apenas “verdades”. Como jornalismo, nenhuma. Aliás, no seu expediente não vimos nenhum número de registro exigido pelo Ministério do Trabalho a jornais e jornalistas. Então não podemos afirmar que ali se pratica jornalismo devendo a Folha Universal ser considerado um panfleto, um objeto de propaganda com uma finalidade específica. O problema é que o formato faz parecer jornal e, portanto, um compromisso com a verdade pública.

A Folha Universal circula desde 1992, hoje semanalmente e este número que tenho em mãos teve uma tiragem de 1.867.875 exemplares. É um público muito grande para um jornal de papel. No Brasil, qualquer jornal de papel invejaria uma tiragem destas e por mais que tenham perseguido nunca atingiram tal cifra. É preciso muito financiamento e muito corte de despesas para produzir tanto. São trinta e duas páginas. Outra impressão que me fica é o voluntarismo na confecção do jornal e não apenas na distribuição.

Mas, vamos ao que mais me chamou a atenção: o assunto dessa edição são as reportagens do The Intercept Brasil sobre o ex-juiz Sérgio Moro. O editorial tem como título, metade entre aspas – um dito de Bolsonaro em apoio a Moro –, a expressão “o que ele fez não tem preço”, mas há quem não concorde. Francamente a favor de Sérgio Moro, o que não vejo nenhum problema na medida em que cada panfleto escolhe o lado que quer louvar, o editorial comete uma série de erros e preconceitos que não são compatíveis com um veículo que tem a pretensão de conduzir e educar na justiça uma parcela da população. Vejamos.

O hackeamento é visto pelo jornal como um crime sem explicitar em qual situação deve ser visto como tal. Conversas privadas são conversas privadas e, portanto, não podem ser expostas publicamente. Em duas situações a minha conversa se torna pública: quando falo em público, obviamente; e, quando sou um servidor público. Nos dois casos o público tem o direito de participar. No primeiro caso, se ajo em público – mesmo que seja uma ação pretensamente privada, como na igreja – estou transferindo às pessoas à minha volta o direito de opinar, de intervir, principalmente se fere algum direito, seja de quem for. Caso contrário, conversas privadas devem ser realizadas no espaço privado e não na praça, real ou virtual. Como servidor público todas as minhas conversas referente à minha atividade são públicas e, portanto são de interesse público. Se fazem questão de esconder do público uma atividade pública é porque essa ação não é boa, nem moral nem legalmente. O site The Intercept Brasil não divulgou nenhuma conversa privada entre os servidores públicos, portanto a divulgação não é criminosa.

Para exaltar Sérgio Moro e exigir uma tomada de posição do leitor o editorialista fala do saldo da Operação Lava-jato. O tal saldo de 13 bilhões de reais expostos no site do MPF e afirma: “os verdadeiros assaltantes do país tentam emplacar uma narrativa de que os ‘criminosos’ são Moro e os procuradores. E pergunta: ‘em que lado dessa história você deve se colocar?’” Primeiro, quem são os verdadeiros assaltantes do país? Aqueles que uma força-tarefa e um juiz carregados de suspeição definiram como tal? A partir daí o editorialista assume seu ar doutrinário, um iluminado dono da razão e conduz o leitor ingênuo a um raciocínio esclarecedor.

O site The Intercept Brasil é “claramente de esquerda”. Não tem a “isenção esperada de um veículo de imprensa”. Glenn Greenwald fez “espionagens indevidas” lá nos Estados Unidos. Tem um “relacionamento homoafetivo” com um deputado do PSOL, um partido de esquerda. O leitor da Folha Universal agora esclarecido sabe que um espião homossexual de esquerda só pode ser um mentiroso por atacar Sérgio Moro que não é espião, nem homossexual, nem de esquerda e com muita credibilidade.

Assim termina o editorial: “Será que o problema está, de fato, na troca de conversas entre Moro e os procuradores ou na real intenção de quem vazou esses áudios? Não seria essa mais uma tentativa da esquerda para desestabilizar o governo que ora inicia e atrapalhar as investigações da Lava Jato, a maior investigação de lavagem de dinheiro e corrupção que o nosso país já teve? Ficam as perguntas…”

Respostas: a) obrigação de jornalista é verficar a fonte e expor a verdade. Esse é um papel importante de defesa da sociedade para que as autoridades não façam o que bem quiser e bem entender com o povo; b) esse governo já está a seis meses no poder e não demonstrou nenhuma intenção de acabar com a corrupção, mas de acabar com a esquerda e qualquer um de seus críticos; esse governo não tem nenhum projeto para o povo, apenas para as elites incluindo-se aí as religiosas.

E, acrescento uma proposta ao editorialista: que tal uma CPMF? Quantas igrejas estão isentas de corrupção?


Imagem de destaque: Imagem de destaque: Tim Mossholder / Unsplash

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